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Onde o concreto convive com o verde

No Brasil e no mundo já existem obras de infra-estrutura que conseguem conciliar desenvolvimento com respeito ao meio ambiente

Rodovia dos Imigrantes: medidas para minimizar os danos à mata Atlântica (--- [])

Rodovia dos Imigrantes: medidas para minimizar os danos à mata Atlântica (--- [])

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Da Redação

Publicado em 14 de outubro de 2010 às 13h29.

Em qualquer lugar do mundo, a questão ambiental é um dos principais entraves para a realização de grandes obras de infra-estrutura. Há projetos que passam anos, às vezes décadas, à espera da boa vontade do órgão responsável pela licença ambiental -- no Brasil, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Outros sofrem com o lobby -- algumas vezes radical -- de grupos ambientalistas. Apesar desse cenário de dificuldades, há margem para progressos. No Brasil e no mundo, estão surgindo obras que mostram uma nova realidade: com os devidos cuidados, é possível conciliar, sim, os interesses econômicos com a necessidade de preservação ambiental.

No Brasil, o caso mais emblemático é a duplicação da rodovia dos Imigrantes, que liga São Paulo à Baixada Santista. Com 21 quilômetros de extensão, a segunda pista da Imigrantes é uma obra portentosa que consumiu quatro anos de trabalho e 830 milhões de reais. O projeto original, de 1986, ficou anos no limbo e teve de ser repensado para adequar-se às recomendações do Ibama. A principal mudança exigida foi a construção de quatro estações de tratamento para que a água das escavações fosse drenada antes de chegar aos riachos da região. A nova pista tem três túneis imensos, dois deles com mais de 3 000 metros cada um, os maiores do Brasil. Para construir os túneis -- uma boa alternativa para evitar o desmatamento --, a Ecovias, concessionária que administra o sistema Anchieta­Imigrantes, utilizou quatro máquinas de perfuração a laser, mais precisas e eficientes. Os pilares dos viadutos, com 100 metros de altura, têm vãos maiores entre si (90 metros), o que reduz a interferência na mata -- na primeira pista, a distância entre as colunas é de 45 metros. A nova Imigrantes foi inaugurada somente 15 anos depois da elaboração do projeto original, mas conseguiu colocar muitos ambientalistas e empreiteiros do mesmo lado. Em comparação com o primeiro trecho, construído na década de 70, a nova pista reduziu drasticamente o impacto ambiental. A área desmatada caiu de 1 600 hectares para apenas 40 hectares. Além disso, a Ecovias prometeu plantar dez árvores para cada uma que derrubasse. Falta pouco para atingir a marca. "Já plantamos mais de 380 000 mudas nativas da mata Atlântica. Faltam outras 40 000 para compensar as que derrubamos", afirma João Lúcio Donnart, diretor-superintendente da Ecovias.

Ilha artificial
Outro bom exemplo da tentativa de equilibrar os interesses econômicos e ambientais é a construção do gasoduto Coari­Manaus, no coração da floresta Amazônica, um dos santuários dos movimentos ambientalistas. Trata-se de um ambicioso plano da Petrobras para levar gás natural do município de Coari, próximo à usina de Urucu, até a capital do Amazonas. Para isso, a estatal terá de construir 670 quilômetros de gasodutos e investir mais de 2,4 bilhões de reais.

Estrada ecologicamente correta
Comparação do desmatamento causado na construção das duas pistas da rodovia dos Imigrantes
 
Primeira pista
Segunda pista
Duração da obra
1969-1976
1998-2002
Extensão
44 quilômetros
21 quilômetros
Túneis
11
3
Viadutos
18
9
Área desmatada
1 600 hectares
40 hectares

O principal desafio da obra é evitar a ocupação irregular no entorno do gasoduto. O projeto prevê a abertura apenas de acessos temporários, que serão fechados após o término da obra. Para não estimular a migração de pessoas para essa região, o uso da mão-de-obra local será intensificado. "Nossa meta era usar 60% do pessoal da própria região, mas esse índice chega hoje a 73%", afirma Mauro de Oliveira Loureiro, gerente da Petrobras na região. A compensação da área desmatada será feita com a utilização de uma reserva de 200 000 mudas de árvores nativas. Já a questão indígena será mais complicada de resolver. O gasoduto vai passar perto de algumas reservas, motivo de preocupação para indigenistas.

Apesar disso, o gasoduto é visto de forma positiva por especialistas em questões ambientais, como o sociólogo americano Christopher Wells, superintendente de riscos socioambientais do banco ABN Amro. "Obras como essa sempre vão causar impactos, mas as vantagens superam o lado ruim. Esse é o caminho", afirma Wells.

A grande referência mundial de obra ecologicamente correta é o Oresund Link, um imenso complexo de túnel, pontes e ilhas artificiais que liga a Dinamarca à Suécia. Ao todo, são 16 quilômetros de travessia, ora por cima d'água (via ponte), ora por baixo (via túnel). Desde o início, os estudos ambientais mostraram que o complexo causaria um impacto importante no meio ambiente. A maior preocupação era não interferir na troca de águas entre o estreito de Oresund e o mar Báltico. A correnteza é importante para o fluxo de sal e oxigênio, que mantém viva uma das principais atividades econômicas locais: a pesca do bacalhau.

Inúmeros cuidados foram tomados para que a construção não interferisse no ecossistema. Os 7,5 milhões de metros cúbicos do material dragado, por exemplo, foram utilizados para formar a ilha artificial de Pebberholm, que faz a ligação da ponte com o túnel subaquático. Outra medida elogiada pelos ambientalistas foi a interrupção dos trabalhos em épocas específicas para que o ruído não interferisse no ciclo de reprodução dos peixes. Além disso, luzes especiais iluminam a ponte para evitar a colisão de pássaros em dias de baixa visibilidade. A ilha artificial de Pebberholm já apresenta mais de 400 espécies de plantas e insetos -- alguns deles raros -- e serve de abrigo para a procriação de aves. Variáveis que podem afetar o meio ambiente, como a emissão de gases, também são monitoradas 24 horas por dia. Tudo isso gera um custo adicional, mas, se esse for o preço a pagar para tirar obras importantes do papel, o esforço vale a pena.

 

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