Brasil

O renascimento nuclear

A retomada mundial de investimentos na área inclui tecnologias para reduzir os riscos de acidentes e problemas ambientais

Usina em construção na ilha de Olkiluoto, na Finlândia: capaz de resistir ao impacto de um Boeing 747 (--- [])

Usina em construção na ilha de Olkiluoto, na Finlândia: capaz de resistir ao impacto de um Boeing 747 (--- [])

DR

Da Redação

Publicado em 14 de outubro de 2010 às 13h30.

Nos últimos anos, as usinas nucleares deixaram de ser sinônimo de ameaça de hecatombe ambiental e passaram a ser vistas como alternativa viável para a geração de energia. Diante do agravamento do problema do aquecimento global, a energia atômica passou a ser encarada como um mal menor. Hoje, fazem parte dessa corrente de opinião inclusive alas mais pragmáticas do movimento ambientalista. Enquanto a geração de energia pela queima de petróleo produz em média 680 gramas de dióxido de carbono por quilowatt-hora e pela de carvão 720 gramas, a nuclear produz apenas 2 gramas. Atualmente, há 443 usinas do tipo em operação no mundo. Outras 37 estão sendo construídas em diversos países (veja quadro ao lado). Um dos símbolos do renascimento da indústria nuclear está se materializando na ilha de Olkiluoto, na Finlândia. Ali vem sendo erguida a primeira central atômica da Europa desde o pior acidente nuclear da história, em Chernobyl, na antiga União Soviética, em 1986. Com orçamento de 4,5 bilhões de dólares, a usina de Olkiluoto será a primeira no Velho Continente a contar com um reator de terceira geração, que promete ser mais seguro e econômico que as versões anteriores. Além de reduzir os riscos de vazamentos, a blindagem em torno do equipamento é tão resistente que será capaz de suportar o choque de um Boeing 747. A previsão é que a usina comece a funcionar em 2010.

Embora a obra finlandesa represente o que existe atualmente de mais avançado nessa área, sobretudo no que diz respeito ao sistema de segurança, alguns especialistas afirmam que a grande inovação tecnológica ocorrerá mesmo com a entrada em operação da usina japonesa de Monju. Localizada em Tsuruga, 400 quilômetros a oeste de Tóquio, já é considerada uma usina de quarta geração, a primeira do mundo com um reator que reaproveita a matéria-prima -- urânio e plutônio -- excedente de outras centrais para gerar energia. Ou seja, ela recicla grande parte do lixo radiativo produzido por usinas.

A geografia atômica
O mundo tem hoje 443 usinas e mais 37 em construção
Quem tem mais usinas
1EUA104
2França59
3Japão54
4Grã-Bretanha32
5Rússia30
6Canadá20
7Alemanha19
8Coréia16
9Índia14
10Ucrânia13
24Brasil2
Quem está construindo mais
1China7
2Índia6
Rússia6
3Coréia4
4Japão3
5República Checa2
Irã2
6Finlândia1
Taiwan1
Coréia do Norte1
Fonte: International Nuclear Safety Center

A reutilização dos detritos representa um grande salto na evolução das usinas, pois ajuda a reduzir um dos maiores pesadelos da indústria nuclear: o destino dos rejeitos radiativos. "Monju é o que há de mais moderno em termos de projeto de reator em todo o mundo", afirma Francisco Rondinelli, presidente da Associação Brasileira de Energia Nuclear (Aben). A desvantagem da usina japonesa é o alto custo -- cerca de 6 bilhões de dólares já foram gastos na construção de Monju. O protótipo do reator começou a ser construído em 1986. O programa foi interrompido em 1999, quando uma falha no sistema de resfriamento do reator provocou um incêndio. Há dois anos, os japoneses retomaram as obras, incorporando novos mecanismos de segurança. Se não houver outros percalços, a usina deve entrar em operação em 2008.

Para que um reator desse tipo seja economicamente viável, é preciso haver grande quantidade de resíduos radiativos para ser reprocessados. Não é o caso do Brasil, que conta apenas com a produção das usinas Angra 1 e Angra 2 -- e somente agora ensaia a retomada da construção de Angra 3. O sinal positivo para isso foi dado em agosto deste ano, quando o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) determinou que a Eletrobrás e a sua subsidiária Eletronuclear retomem a construção de Angra 3. As obras dessa usina foram paralisadas em 1986, ainda na fase de instalação das fundações. Antes que operários reiniciem os trabalhos, porém, o CNPE determinou a contratação de uma empresa independente para elaborar um estudo de viabilidade econômica do empreendimento. A escolhida para o serviço foi a consultoria suíça Colenco, que deve entregar seu relatório em dezembro. O superintendente de gerenciamento de empreendimentos da Eletronuclear, Luiz Manuel Messias, acredita que o estudo não trará surpresas. "Tão logo seja dado o aval, reiniciaremos a construção", diz ele.

A previsão é que Angra 3 fique pronta em 2014. Sua maior diferença em relação às duas usinas que a antecederam é que a futura central deverá incorporar inovações na operação dos equipamentos. Em Angra 1, muitas das máquinas funcionam com chaves e manivelas. Em Angra 2, a automação é maior. Para Angra 3, a tendência é o uso da tecnologia digital, com menor interferência humana. O novo sistema deve se traduzir em menor custo de manutenção e operação.

Apesar dos avanços em relação às suas antecessoras nacionais, Angra 3 está longe da modernidade de projetos como o da usina de Olkiluoto. Para Rondinelli, da Aben, seria um contra-senso mudar o projeto brasileiro a esta altura. "O custo-benefício não valeria a pena", afirma. "Quando o Brasil construir sua quarta usina, aí sim poderá ter uma da mesma geração de Olkiluoto." Pelas contas da Eletronuclear, 30% do necessário para a implantação de Angra 3 já foi providenciado. Até agora foram gastos 750 milhões de dólares na compra de 13 500 toneladas de equipamentos. Para o restante, o investimento necessário é de 7,3 bilhões de reais. A nova usina vai gerar 1 350 megawatts. Com isso, a capacidade das três usinas do complexo de Angra aumentará para 3 357 megawatts, o suficiente para suprir 80% da energia consumida pelo estado do Rio de Janeiro. Parece pouco pelo tamanho continental do Brasil, mas é uma contribuição importante para ajudar a evitar um colapso caso a demanda de energia continue crescendo no ritmo atual.

Acompanhe tudo sobre:[]

Mais de Brasil

Servidores federais ambientais estão em greve em 24 estados e no DF

Passageiro é resgatado do teto após turbulência em voo para Montevidéu

Corregedor de Justiça arquiva processos contra ex-juízes da Lava-Jato

Lira defende cadeiras para mulheres no Legislativo e diz que tema deve ser votado neste ano

Mais na Exame