"Não se assustem se alguém pedir o AI-5", diz Paulo Guedes
"Já não aconteceu uma vez? Ou foi diferente?", disse o ministro da Economia sobre o marco de repressão da ditadura, já sugerido pelo filho do presidente
Reuters
Publicado em 26 de novembro de 2019 às 08h50.
Última atualização em 26 de novembro de 2019 às 13h54.
Washington — O ministro da Economia, Paulo Guedes , afirmou em Washington DC na segunda-feira (26) que é "inconcebível" a ideia de um novo AI-5 no Brasil, mas ao mesmo tempo disse que as pessoas não devem se assustar com a ideia de alguém pedi-lo diante da radicalização de possíveis protestos.
"Sejam responsáveis, pratiquem a democracia. Ou democracia é só quando o seu lado ganha? Quando o outro lado ganha, com dez meses você já chama todo mundo para quebrar a rua? Que responsabilidade é essa? Não se assustem se alguém então pedir o AI-5. Já não aconteceu uma vez? Ou foi diferente?", disse Guedes a jornalistas após uma coletiva de imprensa.
"Levando o povo para a rua para quebrar tudo. Isso é estúpido, é burro, não está à altura da nossa tradição democrática", completou.
Não está claro a que o ministro se refere quando fala em quebradeira na rua, já que o Brasil não tem tido protestos de massa violentos como em países da América Latina como o Chile.
No final de outubro, Eduardo Bolsonaro, sugeriu em entrevista que o governo comandado pelo seu pai, Jair Bolsonaro, poderia lançar mão do mais duro instrumento legal de repressão da ditadura militar brasileira, o AI-5, caso a esquerda radicalize em sua atuação no país.
A fala foi amplamente condenada por membros de todo o espectro político e uma representação contra o deputado será aberta hoje no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados.
Lula
Em liberdade após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de derrubar a prisão de condenados em segunda instância, depois de ficar preso 580 dias pela condenação no processo do tríplex do Guarujá (SP), o ex-presidente Lula tem feito discursos que, para críticos, alimentam a polarização política do Brasil.
Na abertura do 7º Congresso Nacional do PT, principal partido de esquerda do Brasil, Lula afirmou que o pior inimigo do Brasil é a desigualdade e defendeu que a polarização política não significa extremismo.
Questionado sobre convulsões políticas na América Latina e sobre declarações de Lula, Guedes repetiu que não lhe cabe discutir política, e nem fazer comentários sobre o petista. "Para que vamos prestigiar vozes de discórdia?", perguntou.
Ao ser novamente questionado sobre o AI-5, Guedes se irritou: "É inconcebível, a democracia brasileira jamais admitiria, mesmo que a esquerda pegue as armas e quebre a força o Palácio do Planalto, é inconcebível", disse em tom irônico, segundo reportagem da BBC Brasil.
"Assim que ele (Lula) chamou para confusão veio logo o outro lado e falou o seguinte, é 'sai para a rua', vamos botar um excludente de ilicitude, vamos botar o AI-5, vamos fazer isso, vamos fazer aquilo. Que coisa boa, né? Que clima bom", completou.
O ministro fez referência ao projeto enviado por Bolsonaro ao Congresso que amplia o conceito de excludente de ilicitude previsto no Código Penal, abrindo margem para liberar de punição por atos violentos agentes de segurança envolvidos em operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO).
Entenda
Em 1968, o então presidente Artur Costa e Silva assinou o Ato Institucional de número 5, um marco da suspensão de garantias democráticas que inaugurou o período mais repressivo da ditadura militar.
O ato permitia cassações de mandatos e suspensão de direitos políticos, além do fechamento do Congresso Nacional e dos legislativos estaduais e municipais, com nomeação de interventores pelo poder central. Também suspendeu as garantias constitucionais da liberdade de expressão e de reunião, estabelecendo censura prévia à imprensa.
Segundo estudiosos, a pior das marcas ditatoriais do Ato estava no artigo 10: “fica suspensa a garantia de habeas corpus nos casos de crimes políticos contra a segurança nacional”. Com isso, o núcleo repressivo dos militares estava liberado pelo Estado, abrindo espaço para a prática de tortura.