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Lula quer governo com menos PT, mais centro e guinada na economia

Ex-presidente pretende recrutar nomes de centro para governar, mesmo que tenha de sacrificar o PT na composição da equipe

O ex-presidente se reuniu ontem com a coordenação de sua campanha para traçar as estratégias do segundo turno (Alexandre Schneider/Getty Images)
EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 4 de outubro de 2022 às 08h48.

A constatação de que o bolsonarismo se fortaleceu nas eleições fará a campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se aproximar mais de partidos fora do campo de esquerda no segundo turno. A ideia é mostrar que, se vencer a disputa contra o presidente Jair Bolsonaro , Lula vai recrutar nomes de centro para governar, mesmo que tenha de sacrificar o PT na composição da equipe.

A senadora Simone Tebet (MDB), que ficou em terceiro lugar na eleição, vai apoiar o ex-presidente e é cotada para ocupar um ministério em eventual governo Lula. Outro nome citado é o do empresário Walfrido dos Mares Guia. Fundador do grupo Pitágoras, Mares Guia foi ministro do Turismo e das Relações Institucionais sob Lula, vice-governador de Minas (1995 a 1999) e deputado federal.

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O ex-presidente se reuniu ontem com a coordenação de sua campanha para traçar as estratégias do segundo turno. "Agora a escolha não é ideológica. Agora vamos conversar com todas as forças políticas que têm voto e representatividade para somar", disse Lula. "Precisamos conversar com aqueles que parecem que não gostam da gente e do nosso partido."

Uma ala mais à esquerda do PT avalia que o comitê de Lula errou ao ficar na "defensiva", sem fazer o tradicional corpo a corpo nas ruas, nem mesmo na periferia, e sem partir para o confronto direto com Bolsonaro. Para correntes mais "radicais" do partido, não adianta o ex-presidente adotar um estilo "paz e amor" no meio da guerra. Mas o candidato não vê o cenário assim. "Se for preciso conversar, o Lulinha paz e amor está pronto", insistiu ele.

Desde que o ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles declarou apoio a Lula, no mês passado, o mercado financeiro reagiu com otimismo, interpretando que ele poderia voltar ao comando da economia. O ex-presidente tem dito, porém, que quer na pasta um político com trânsito no Congresso.

Ex-ministro

Questionado pelo Estadão se havia conversado novamente com Lula, Meirelles disse que não. "Estou só observando", afirmou o ex-ministro do governo de Michel Temer. "Pai" do teto de gastos, rejeitado pelo PT, Meirelles também foi presidente do Banco Central nos dois mandatos de Lula.

Se eleito, Lula pretende dar uma "guinada" na economia, promovendo mudanças negociadas com governadores, principalmente em relação ao sistema tributário, chamado no comitê de "manicômio", ainda que haja divergências com a cúpula petista. Em troca do apoio a essa reforma, ele planeja oferecer compensações aos Estados, por meio de Parcerias Público-Privadas (PPPs) nas áreas de infraestrutura e logística.

Até agora, Lula não divulgou seu programa de governo, mas prometeu revogar o teto de gastos e mudar o arcabouço fiscal, sem dizer como, além de pôr "o pobre no orçamento e o rico no Imposto de Renda".

Nem ele nem Bolsonaro, porém, explicam de onde vão tirar dinheiro para manter o Auxílio Brasil de R$ 600, em 2023. No Planalto, o presidente afirma que Lula nunca detalhou o plano porque quer dar um "cavalo de pau" na economia.

"O que vai haver é uma mudança importante no sentido de recuperar a credibilidade que a gente perdeu e conquistar estabilidade", disse o economista Guilherme Mello, da campanha de Lula. "Queremos construir uma mesa de diálogo com os governadores e demais poderes. Não é no sentido de ruptura institucional. Quem gosta de ruptura é Bolsonaro", emendou.

O novo papel do PT em um possível governo não está definido, mas o acerto ali é para dar carta branca ao ex-presidente. Se nos dois mandatos de Lula, e mais ainda no período de Dilma Rousseff o PT fazia barulho, pressionava para ter mais espaço na Esplanada e cobrava o fim do superávit primário, a situação agora é outra.

Frente Ampla

A ideia é montar uma "frente ampla", que também incluiria nomes da sociedade civil, para administrar e ter maioria no Congresso. As eleições de domingo mostraram que aliados de Bolsonaro tiveram votação expressiva na Câmara e no Senado. Para ter governabilidade, Lula também precisará, se chegar ao Planalto, ampliar as alianças e obter a adesão de parlamentares do MDB, PSD, PSDB - ainda que o partido tenha virado nanico - e do União Brasil.

"O governo mais ao centro é uma consequência da união das forças políticas. Não há problema nisso. Ao contrário", disse o senador Jaques Wagner (PT-BA), um dos coordenadores da campanha petista.

Em 27 de setembro, após receber o apoio de ex-ministros de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Lula deu a senha da estratégia para atrair antigos adversários. Ao se dirigir a Geraldo Alckmin (PSB), ex-governador de São Paulo e vice em sua chapa, fez questão de avisar: "Meu caro, você já foi promovido a general."

Na disputa mais polarizada do País, a primeira após enfrentar processos que o mantiveram 580 dias na prisão, entre 2018 e 2019 Lula não teve mais a seu lado seus dois "generais". A patente na campanha do PT foi criada em 2002, quando ele venceu pela primeira vez a eleição para o Palácio do Planalto.

Abatido no rastro de escândalos do mensalão e do petrolão, o ex-todo poderoso ministro José Dirceu, da Casa Civil, atua hoje nos bastidores; Antônio Palocci, ex-titular da Fazenda sob Lula e da Casa Civil no primeiro mandato de Dilma, virou inimigo após fazer delação premiada. Palocci saiu do PT.

Foi nesse cenário de turbulência e enfraquecimento do PT que um ex-tucano, rival em outras campanhas, se transformou no símbolo da inflexão que o ex-presidente quer fazer. Na prática, Lula começou a percorrer o caminho rumo ao centro muito antes da aliança com Alckmin, quando José Alencar foi seu vice. "Desde 2002, Lula sempre quis que o PT fosse um dos partidos de seu governo, e não o único", afirmou o ex-deputado Paulo Delgado.

Agora, Alckmin virou um curinga: nos últimos meses, foi apontado como possível ministro da Economia e até da Defesa, mas jogou água na fervura de todas essas apostas. "Se o Alckmin for ministro, o presidente não pode ligar para ele em Lisboa e demiti-lo", disse o ex-senador Cristovam Buarque, com uma pitada de ironia. "O vice é indemissível." Em 2004, Cristovam era ministro da Educação e foi dispensado por Lula, pelo telefone, quando estava em Portugal.

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