Lula: apesar do apoio do ex-presidente, setores no partido temem a perda de liderança e de holofotes para um "novato", que é como consideram Haddad (Ricardo Stuckert/Divulgação)
Reuters
Publicado em 29 de outubro de 2018 às 21h35.
São Paulo - Em seu primeiro recado ao PT depois do final das eleições, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu nesta segunda-feira, 29, ao partido para ter calma, esperar a poeira baixar e não se precipitar na avaliação do cenário pós-eleição, além de reafirmar a posição de liderança no partido que o presidenciável da sigla, Fernando Haddad, conquistou depois do segundo turno.
Convocada pela presidente do partido, senadora Gleisi Hoffmann, a Executiva da sigla, acrescida de parlamentares e outros petistas graúdos, irá se reunir nesta terça-feira, 30, em São Paulo para fazer uma primeira avaliação de cenário. No entanto, embalada pelo recado de Lula, a tendência Construindo um Novo Brasil (CNB) - da qual o ex-presidente e Haddad fazem parte - ecoa a posição lulista.
"A maioria (da CNB) avaliou que a reunião de amanhã é precipitada. Vamos recomendar que não se tenha nenhuma avaliação. Precisamos ter calma", defendeu o presidente do PT do Rio, Washington Quaquá. "Todo mundo que ganha uma eleição tem legitimidade democrática. Precisamos fazer oposição a coisas concretas."
Um dos coordenadores da campanha de Haddad, o deputado Emídio de Souza esteve nesta segunda-feira com Lula em Curitiba e fez um relato aos membros da CNB em uma reunião nesta tarde. O recado do ex-presidente foi entendido. Sua avaliação foi de que o resultado eleitoral não foi bom, obviamente, pela derrota, mas permitiu ao PT liderar um processo que reuniu gente para além dos partidos, em uma frente que envolveu a sociedade, e ir além do que se esperava em uma eleição em que Lula foi impedido de concorrer pela Lei da Ficha Limpa.
Antes de definir um discurso de atuação, o partido tem que decidir como trabalhar para manter isso, contou uma fonte.
Haddad foi derrotado no segundo turno da eleição presidencial para Jair Bolsonaro (PSL), que teve 55,1 por cento dos votos válidos, contra 44,9 por cento do petista. Apesar da derrota, foram 47 milhões de votos recebidos por Haddad. O ex-presidente coloca Haddad, que foi seu substituto na chapa, no centro das discussões daqui para frente. Recomendou que o ex-prefeito de São Paulo seja consultado sobre seus planos e como planeja liderar essa frente de oposição ao governo Bolsonaro.
Alinhada com os desejos do ex-presidente, a CNB - e outros petistas aliados diretamente a Haddad - avalia que o ex-candidato conquistou um espaço que precisa ser usado para que o PT possa continuar liderando essa frente de oposição. "Haddad saiu como uma grande liderança, saiu com estatura para ser uma liderança nacional. Antes só tinha Lula", disse Quaquá. "Haddad passa a ser um grande interlocutor com a sociedade e se credenciou para liderar uma frente democrática. Essa é a posição do Lula também."
O tamanho e o papel que Haddad irá desempenhar nesse futuro PT está no centro das preocupações de Lula e do próprio partido. Seus defensores creem que o tempo de resistências ao ex-prefeito acabou e reconhecem que foi a capacidade dele de conversar com diferentes setores que levou o partido a conseguir ampliar seu leque de apoios - além, claro, da rejeição a Bolsonaro.
Ainda assim, reconhecem fontes petistas, há setores no partido que temem a perda de liderança e de holofotes para um "novato".
"A discussão é mais complexa que uma avaliação de cenário. Que papel Haddad terá? Isso terá que ser discutido mais profundamente. Que espaço tem? Para cumprir esse papel virá para a estrutura do partido?", disse uma das fontes. "Precisa pensar o que vai ser feito... as coisas precisam ter um compasso." Em seu discurso depois do anúncio da eleição de Bolsonaro, Haddad se colocou à disposição para liderar uma oposição mas, lembra a fonte, não foi conversado com ele ainda até que ponto pretende colocar seu envolvimento.
Nesta segunda, o ex-prefeito não foi à reunião da CNB. Pela manhã, saiu de casa apenas para ir até o Insper, onde dá aulas, e perguntado sobre o que faria daqui para frente, disse que voltaria a trabalhar porque tinha apenas tirado uma licença de 90 dias para a campanha.