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"Hoje, o maior latifundiário do país é o índio", diz secretário

Luiz Antonio Nabhan Garcia afirmou que o governo de Jair Bolsonaro precisa enfrentar uma espécie de "maldição de viés político e ideológico"

Nabhan é presidente licenciado da União Democrática Ruralista, amigo de Bolsonaro e responsável pela reforma agrária (Tânia Rego/Agência Brasil)

Nabhan é presidente licenciado da União Democrática Ruralista, amigo de Bolsonaro e responsável pela reforma agrária (Tânia Rego/Agência Brasil)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 23 de fevereiro de 2019 às 11h32.

Brasília - O secretário especial de Assuntos Fundiários, Luiz Antonio Nabhan Garcia, afirmou ontem que o governo de Jair Bolsonaro precisa enfrentar uma espécie de "maldição de viés político e ideológico", arraigada nas instituições, se não quiser fracassar. Nabhan citou como decisão ideológica a desapropriação de uma área de 500 mil hectares, em Mato Grosso, com base em estudo antropológico que indicava a presença de "seis a dez índios" no local.

"Tem muita gente que critica o grande latifundiário, mas hoje o maior latifundiário do País é o índio", disse ele. Presidente licenciado da União Democrática Ruralista (UDR), amigo de Bolsonaro e responsável pela reforma agrária, Nabhan foi alvo de críticas, recentemente, por ter recusado pedidos de parlamentares para nomeações no Incra, mas afirmou não acreditar em retaliação no Congresso por causa de cargos. "Não pode haver essa picuinha entre Executivo, Legislativo e Judiciário", argumentou.

O governo decidiu reabrir nomeações do segundo escalão, que haviam sido suspensas após problemas no Incra. Como assegurar agora que essas indicações sejam técnicas?

Quando aceitei o convite para estar aqui à frente da secretaria, deixei claro que nunca fui político. Minha função aqui é tentar reverter, de forma técnica, o que há de pior nessas situações fundiárias, que foram resultado de governos anteriores. Havia aqui forte influência política e ideológica, principalmente no Incra.

Mas partidos que podem vir a compor a base aliada ameaçam votar contra propostas consideradas prioritárias para o ajuste fiscal, como a reforma da Previdência, se não conseguirem cargos. O sr. acha mesmo possível conter esse "toma lá, dá cá"?

A gente tenta conciliar as indicações políticas, porque os parlamentares fazem parte de todo esse processo. Nós dependemos do Congresso para as mudanças. Então, é evidente que precisamos ter uma boa relação. Mas as nomeações não podem ter um viés ideológico.

A reforma da Previdência também traz mudanças para o trabalhador do campo. Isso não pode forçar o êxodo rural?

Não. A proposta é muito boa e o País precisa ter uma política previdenciária que traga equilíbrio. Não dá para brincar com o cofre público. Há uma espécie de maldição de viés político e ideológico, que existe no Brasil há séculos, de interferir em um processo de administração do País. Isso é muito ruim e prejudicial.

O sr. foi acusado de ter destratado deputados que estiveram aqui pedindo a revisão de exonerações de seus afilhados políticos no Incra. Como responde?

Eu aprendi a ter educação de berço e nunca destratei ninguém. É evidente que alguns parlamentares querem impor uma nomeação ou revogar alguma exoneração. Nós sabemos que existe um ranço muito retrógrado dentro do Incra, com nomeações feitas por governos que tinham até conivência com os próprios invasores de propriedades e relação muito harmônica com o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). Agora, vêm aqui dez, vinte parlamentares querendo indicar um nome para a superintendência do Incra. Nós só temos uma por Estado. Como atender? É impossível. Precisamos fazer uma avaliação técnica. Tenho humildade de dizer que não estou muito habituado com essa questão política.

O governo vai nomear militares da reserva para superintendências do Incra?

Se eu tiver aqui um general, um coronel ou qualquer oficial que preencha todos os requisitos e as necessidades para ocupar um cargo à frente dessa gestão, que é técnica, não tenho nenhuma objeção. Ao contrário, tenho até uma admiração muito grande pelos militares e pela capacidade que têm.

Deputados e senadores têm se queixado muito da articulação política do governo com o Congresso. Como melhorar isso?

Olha, um governo que tem 50 dias, que entrou agora e vê tantos vícios, com uma herança ruim que foi deixada, sempre tem coisas a aprimorar. Muito em breve haverá sintonia quase que perfeita entre o governo e o Congresso. Eu acompanhei o presidente Bolsonaro durante a campanha e sempre o vi com muita vontade de acertar. Agora, se o Legislativo e o Judiciário vão colaborar, é outro problema. Não pode haver essa picuinha entre Executivo, Legislativo e Judiciário.

A saída do ministro da Secretaria-Geral, Gustavo Bebianno, não terá impacto negativo nas negociações com o Congresso?

Acredito que não. Quando o casamento não dá mais certo, se promove uma separação. Não quero fazer crítica ao Bebianno, que, por sinal, é meu amigo. Mas só porque você casou e separou, passa a ser ruim? Claro que não. Se não deu certo, bola para frente.

Mas é que, nesse caso, houve uma queda de braço com o vereador Carlos Bolsonaro, filho do presidente. Os filhos dele estão interferindo muito no governo?

Não. Os filhos talvez não estejam habituados a essa situação. São coisas decorrentes de uma família muito ligada. Se houve falhas e equívocos, serão prontamente corrigidos. É aquela história: em briga de marido e mulher, não se mete a colher. Eu presenciei o Carlos Bolsonaro ajudando muito o pai na campanha. Então, isso é natural, as coisas vão se ajustando no decorrer do tempo. Agora, eu achei um desrespeito muito grande o vazamento daquela conversa íntima entre o Bebianno e o presidente.

O sr. defende uma revisão na demarcação de terras indígenas, como a Raposa Serra do Sol?

O que puder ser revertido na forma da lei, talvez a gente possa reverter. Não podemos permitir que um Estado fique quase 90% à mercê de políticas ideológicas. Há interferência ideológica no Executivo, no Legislativo e no Judiciário. Decisão judicial se respeita, mas, no meu entendimento, houve equívoco do Supremo Tribunal Federal na questão da Raposa Serra do Sol. Quer ver outro exemplo? Lá na Amazônia Legal, no noroeste de Mato Grosso, houve um laudo antropológico dizendo que existe a possibilidade de ter ali de seis a dez índios isolados. Aí vem o governo com toda aquela parafernália e decreta a desapropriação de 500 mil hectares. O que é isso? Tem muita gente que critica o grande latifundiário, mas hoje o maior latifundiário do País é o índio. Não podemos transformar o índio em megalatifundiário.

E por que o Incra agora vai romper o diálogo com o MST?

Durante décadas, nós assistimos ao Incra ser comandado por invasores de propriedade, pelo MST e um emaranhado de siglas. A legislação determina que qualquer entidade de defesa de classe precisa ter personalidade jurídica e um estatuto, além de ata registrada em cartório. Aí, sim, se torna legal. Uma sigla vai lá, destrói, ateia fogo, faz vandalismo, terrorismo e fica por isso mesmo? Isso não é movimento social. Invasão é crime. Não podemos manter diálogo com foras da lei nem nos submeter a pressões. O MST ameaça desestabilizar toda a ordem e depois é recebido? Nós não podemos brincar e levar nesse deboche o dinheiro do contribuinte.

O governo vai rever a política de reforma agrária?

Sem dúvida. Fará uma revisão ampla, total e irrestrita. Não podemos compactuar com a indústria da invasão. Se o governo Bolsonaro ceder e entrar nesse viés político e ideológico, ele também estará fadado ao fracasso. E nós temos a convicção de que o presidente fará um governo com soluções administrativas. Há assentamentos que são favelas rurais. Se há propriedade rural improdutiva, que não cumpre função social, será desapropriada. Agora, o governo não encontra essas terras. É certo que existem entidades que querem fazer a reforma agrária dentro da lei. Não dá para ter mais a farra de algumas ONGs que estão ali com interesses escusos.

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