Estabilidade do real convida brasileiros a gastar no Uruguai
Brasileiros desfrutam em 2011 do melhor verão desde 1947 para o turismo; apenas em janeiro, foram US$ 1,741 bi gastos com viagens ao exterior
Da Redação
Publicado em 2 de março de 2011 às 13h17.
Rivera - Atraídos por uma taxa de câmbio favorável, 5 mil brasileiros do Rio Grande do Sul percorrem até 500 quilômetros todos os fins de semana para gastar seus reais nas lojas de livre comércio de Rivera, um paraíso do consumismo situado na fronteira uruguaia.
"Viemos para Rivera porque tudo é muito mais barato", afirma à AFP Roberto Pereira, enquanto paga com seu cartão de crédito um secador de cabelo e alto-falantes para o carro.
Os brasileiros desfrutaram neste ano do melhor verão desde 1947 para o turismo pela forte valorização do real, que encerrou 2010 com uma alta de 4,6% após ganhar 3,9% em 2009. Apenas em janeiro gastaram 1,741 bilhão de dólares em viagens ao exterior.
Em Rivera, uma cidade de 70 mil habitantes, isto se traduziu em uma chegada em massa de brasileiros, atraídos por uma enorme gama de produtos livres de impostos, num momento em que o real é cotado a 1,66 dólar e a 11 pesos uruguaios. Prevê-se que as 60 lojas "Free Shop" presentes na cidade alcancem neste ano os 240 milhões de dólares em lucros, segundo a Intendência.
"Compram os produtos onde a diferença de preços é maior", afirma Gandhi Abdullah, presidente das Lojas Free Shop de Rivera, acrescentando que o faturamento das lojas aumentou 40% de 2009 a 2010.
Perfumes, maquiagem, óculos de sol, sapatos, malas, raquetes de tênis, vinhos e campanhe, doce de leite, batatas fritas, microondas, antenas parabólicas... Mas a estrela, sem dúvida, é o ar condicionado.
"Na loja temos uns 80 aparelhos de ar condicionado. Mas temos mais no estoque. Hoje podemos vender mais de cem. Valem uns 600 dólares, em função da marca, mas no Brasil custam o dobro", explica Alicia Batista, uma das responsáveis pela loja Mega, enquanto manda colocar sete destes aparelhos junto à porta de entrada.
Famílias inteiras passeiam pelas ruas de Rivera como se estivessem em um parque temático. Com a lista nas mãos, os brasileiros percorrem loja por loja à caça de produtos. São uma clientela particular, que sabe o que quer e não precisa dos conselhos dos vendedores para se decidir.
"Ostentam muito a marca, vestem o que compram. As mulheres gastam mais que os homens. Elas sabem antes de nós os últimos lançamentos, e às vezes acontece de não termos o produto que procuram", explica Natalia González, uma das 110 funcionárias da loja Siñeriz.
O fenômeno deste ano não é novo, embora tenha confirmado uma tendência que começou há cinco anos, explica à AFP o intendente de Rivera, Marne Osorio.
"Em janeiro fomos muito, muito bem. Há lojas que chegaram a faturar até 750 mil dólares em um dia. O sistema de Free Shops está gerando um faturamento impressionante", diz Osorio.
Enquanto isso, do outro lado da rua, a tranquilidade reina nas lojas de Sant'Ana do Livramento, a cidade irmã de Rivera no Brasil, com cerca de 82.000 habitantes. Mas a prefeitura aguarda com ansiedade a chegada de brasileiros, já que a cidade do Brasil absorve tudo o que Rivera não consegue gerir.
"Nós temos mais hotéis e mais restaurantes do que Rivera. Se em Rivera não há lugar, as pessoas vêm para Sant'Ana. Comemoramos que existam tantos brasileiros comprando nos Free Shops porque também é bom para nós", conta à AFP o prefeito Weinar Machado.
No entanto, atenta ao fenômeno dos Free Shops, Sant'Ana já pediu autorização ao governo do Brasil para criar uma zona livre de impostos, onde os brasileiros também possam comprar.
Ante as compras em massa de produtos no Uruguai, o contrabando é um problema. O Brasil se encarrega de supervisionar que seja cumprida a lei que limita a 300 dólares o gasto por pessoa nas lojas sem impostos. A cinco quilômetros de Sant'Ana, um posto de controle alfandegário verifica o porta-malas de todos os veículos.
"Hoje podem passar até 10 mil veículos, por isso temos uma operação especial, com funcionários de outros postos fronteiriços entre Uruguai e Brasil", afirma à AFP Carlos Luciano Sant'Anna.
Parados em fila, os carros aguardam o registro de um funcionário que controla o número de passageiros e revisa as notas fiscais de cada compra.
"Vale a pena pagar a diferença (quando o valor supera os 300 dólares), porque continua sendo mais barato do que no Brasil", contam dois casais de Porto Alegre, que visitaram Rivera pela segunda vez no ano.
"As pessoas devem declarar no escritório de Impostos Federal se têm bens que superam os 300 dólares por pessoas. Do contrário, aqui ficamos com as coisas", garante um dos responsáveis pela operação.
Um caminhão aguarda na sombra a chegada dos produtos apreendidos. Os primeiros do dia serão dois aparelhos de ar condicionado, apesar dos apelos de seus proprietários.