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Eleitor de Bolsonaro contra "volta do PT" rejeita governo mais rápido

Pesquisa mostra que maior parte dos eleitores que optaram por Bolsonaro e hoje o rejeita é formada por mulheres, não evangélicas, da região Norte e Nordeste

Mulher em manifestação pró-Bolsonaro de Poro Alegre (RS). Domingo, 26 de maio de 2019. REUTERS/Diego Vara (Diego Var/Reuters)
EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 2 de junho de 2019 às 13h46.

Última atualização em 2 de junho de 2019 às 13h48.

São Paulo — Desde que o presidente Jair Bolsonaro tomou posse, há cinco meses, pesquisas mediram aumento em sua taxa de desaprovação.

O mais recente levantamento do instituto Ideia Big Data mostra que o desembarque do bolsonarismo tem sido mais significativo em parte expressiva do eleitorado que votou no então candidato do PSL apenas no segundo turno da eleição presidencial de 2018.

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Essa parcela de eleitores, em tese, aderiu a Bolsonaro com o objetivo de evitar a volta do PT ao governo federal.

A desaprovação da atual administração tem como eixo central a persistência da crise econômica e do desemprego em níveis elevados.

Segundo a pesquisa da Ideia Big Data, a maior parte dos eleitores que optaram por Bolsonaro e hoje rejeita o governo é formada por mulheres com idade entre 25 e 40 anos, integrantes das classes B e C, não evangélicas e que vivem em cidades com mais de 200 mil habitantes nas regiões Norte e Nordeste.

Eles votaram no presidente apenas no segundo turno e representam cerca de 10 pontos percentuais dos 18 que Bolsonaro perdeu desde a posse, conforme a série mensal de pesquisas do Ideia Big Data.

Um dos argumentos apresentados para o recuo no apoio a Bolsonaro é o desconhecimento das propostas do então candidato durante a campanha eleitoral, segundo o economista e pesquisador Maurício Moura, fundador do instituto.

De acordo com Moura, a este argumento se somam outros fatores: os ruídos provocados por integrantes do governo nas redes sociais e a ausência de medidas para gerar empregos e combater a crise econômica.

Moradora da Lomba do Pinheiro, bairro periférico de Porto Alegre, a empreendedora Elaine Lima, de 36 anos, votou no 17 (o número do PSL) de Bolsonaro em busca de mais segurança. Mas se diz agora decepcionada.

"O que me atraiu, principalmente, foi o discurso do Bolsonaro de combate à violência. Ele parecia ser porreta naquilo que falava. Aqui na região a criminalidade tomou conta, é um bangue-bangue diário. Eu tenho medo de andar nas ruas e acreditei nele durante as eleições. Mas o Bolsonaro assumiu como presidente e a gente não vê nada. Eu já perdi as esperanças. Não vejo um bom futuro para nós", afirmou.

Para Moura, essa camada da população, que ele chama de "classe média-média", é "mais sensível às questões econômicas".

"Muito do apoio que Bolsonaro teve no segundo turno foi mais por rejeição ao PT do que por identificação com a plataforma dele. Bolsonaro não expôs de maneira plena suas plataformas durante a campanha e muitos estão conhecendo só agora as propostas do presidente para diversas áreas."

O pesquisador reiterou que muitos eleitores votaram em Bolsonaro sem conhecer bem as ideias do presidente. "Isso dá um apoio muito frágil."

Um exemplo disso é o decreto que facilita o acesso a armas de fogo. Nos últimos dias, Bolsonaro passou a reforçar a ideia de que, no Planalto, não vai abandonar as promessas de campanha.

Moura afirmou que a aprovação ao governo sofreu uma queda abrupta nos dois primeiros meses de mandato e, agora, se estabilizou. Mas a dificuldade em cumprir promessas de crescimento econômico a médio prazo e as investigações envolvendo o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) podem causar um descolamento ainda maior, atingindo o núcleo duro do bolsonarismo.

A Ideia Big Data vem consultando eleitores sobre o desempenho do governo desde o início do ano, sempre entre os dias 3 e 6 de cada mês. O acompanhamento mostra forte queda na aprovação do presidente. A soma dos eleitores que aprovam ou aprovam totalmente o governo era de 49% em janeiro. Hoje, é de 31%.

Já a soma dos que desaprovam ou desaprovam totalmente o governo subiu de 21% para 36% entre janeiro e maio. A Ideia Big Data ouviu 1.660 pessoas. A margem de erro é de 3,2 pontos, para mais ou para menos.

Antissistema

Para o publicitário Renato Meirelles, presidente do instituto Locomotiva, especializado na classe C, o eleitorado que votou em Bolsonaro no segundo turno não era apenas antipetista, mas antissistema.

"É um voto que foi para Bolsonaro a partir da facada", afirmou ele, numa referência ao atentado sofrido por Bolsonaro durante campanha de rua em Juiz de Fora (MG), em setembro passado.

Segundo ele, presidente e governo entram na zona de risco ao optar por um discurso no qual mantêm os ataques a adversários e fazem acenos à sua base fiel. "A população está cansada desse processo de divisão e o governo perde todas as oportunidades de sair dele. No governo, Bolsonaro mantém o discurso de candidato a deputado, em que o apoio de apenas uma parcela da sociedade já é suficiente."

A insatisfação de Elaine aumentou com a decisão tomada pelo governo, em março, de não renovar a permanência do efetivo da Força Nacional no Rio Grande do Sul. Ela deixou de acompanhar o noticiário político.

"A política me deixa muito triste e irritada. Não vejo mais televisão e, quando escuto no rádio as notícias de política, não consigo mais acompanhar. Olha o que o aconteceu com a Educação? É só besteirol."

"Ele dá prioridade a coisas não necessárias", diz turismóloga

"Eu estava colocando muita expectativa nele. Com tudo que vem acontecendo, estou um pouco decepcionada." A afirmação da turismóloga Luciana Leal condensa, em grande parte, a avaliação de eleitores que votaram no então presidenciável do PSL para evitar a eleição do petista Fernando Haddad e que se dizem agora frustrados depois de cinco meses de governo.

"Achava que ele fosse mudar. Até entendo que a gente não consegue arrumar a casa em pouco tempo pela bagunça que foi deixada. Mas acho que ele está dando prioridade a coisas que não são necessárias agora, o porte de arma, por exemplo. Fiquei esperando mais, e ele está me decepcionando", acrescentou Luciana, de 42 anos.

Como ela, o jornal O Estado de São Paulo consultou ao menos 40 pessoas que circulavam na tarde da última sexta-feira nas proximidades do Viaduto do Chá, região central da capital paulista. Uma área densamente povoada por eleitores de todas as classes sociais e regiões do país.

A todos eles, a reportagem fez as seguintes perguntas: votou em Bolsonaro? Por quê? O que acha destes cinco primeiros meses de governo?

A maioria disse ter votado em Bolsonaro como alternativa ao PT - partido que, embora não tenha sido o único, teve sua imagem mais diretamente relacionada aos recentes escândalos de corrupção. Entre esses eleitores, há quem continue dando apoio incondicional ao governo.

"Precisávamos de mudanças. Para cinco meses, ele já fez muito", disse Pedro Borges, consultor em tecnologia para saúde. "Acredito plenamente no governo e na equipe."

Entre os entrevistados, predominou, porém, um misto de decepção e resignação, seja por não conhecer por completo as propostas de Bolsonaro ou por discordar das prioridades escolhidas até agora seja pelos resultados, principalmente na economia.

Luciana critica as prioridades do governo, diante do que chama de necessidades mais imediatas da população. "Está tudo muito caro, as coisas estão aumentando e, em vez de melhorar, está piorando a situação. A gente sente a insegurança, o desemprego está muito grande. Trabalho no centro, vejo filas e filas de gente procurando emprego, muitos pais de família", disse.

Ela também critica a reforma da Previdência, principal proposta de Bolsonaro nos seus cinco primeiros meses. "Acho que tem de ter reforma, mas por que ser pior para os pobres? Os ricos, nada mexe, tem auxílio para tudo. Os deputados, a gente sabe que ganham bem, têm todos os auxílios, e a gente não."

Sem opção

Funcionário de uma empresa de prestação de serviços, Adão Alfredo Vieira, de 48 anos, votou em Bolsonaro nos dois turnos "por falta de opção". "É um erro como forma de protesto, né? Não querer votar no outro e acaba votando nesse. Foi uma decepção", disse. Hoje, Vieira diz estar sem perspectiva.

"A gente esperava mais, só que do jeito que a coisa vai estou quase sem perspectiva. Você vê que a coisa não evoluiu, principalmente para o lado do social, né?"

Severino Alexandre, que não quis revelar a idade, trabalha com resgate de pessoas em situação de rua em São Paulo. Por atuar junto à população mais vulnerável, diz ter autoridade para reclamar das prioridades do governo.

"Como ele estava prometendo ações novas, não só eu, mas a maioria que elegeu deu voto de confiança. Só que o discurso que ele fez na campanha e está fazendo, não batem", afirmou.

"Ele não fez nada. Fala muito, usa as redes sociais para atacar e se defender, mas fazer mesmo, trabalhar, ele não faz. Estou do lado dos mais necessitados, e esse lado é o que eles querem mais cortar."

Também eleitor de Bolsonaro nos dois turnos, Alexandre considera que o atual governo erra quando contingencia recursos da Educação.

"O PT cometeu erros, mas investiu naqueles que mais necessitam. Agora ele faz o contrário. Tira o dinheiro das universidades, das pesquisas, tudo aquilo que é preciso... Como um País vai ter futuro se não tem educação, se não investe? Minha indignação é que é um governo sem perspectiva."

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