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Censo: Brasil tem 4,7 milhões de pessoas a menos que o previsto – e população deve cair em 2035

O Brasil tem 203.062.512 habitantes, segundo o IBGE. Defasagem em relação ao que era estimado abre discussão

São Paulo: capital paulista é a maior cidade do país (Rodrigo Paiva/Getty Images)

São Paulo: capital paulista é a maior cidade do país (Rodrigo Paiva/Getty Images)

Publicado em 28 de junho de 2023 às 20h17.

Última atualização em 30 de junho de 2023 às 17h25.

O Brasil se redescobriu, em alguma medida, nesta quarta-feira, 28, após o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgar os primeiros dados do Censo 2022. A grande surpresa ficou para o tamanho da população, 203.062.512 de habitantes. À primeira vista, um crescimento de 12,3 milhões de pessoas desde o último censo demográfico, realizado em 2010. A realidade foi um pouco distinta: apesar do aumento, chamou a atenção o fato de o número ter ficado 4,7 milhões abaixo do estimado pelo IBGE em dezembro. Esse redescobrimento do país pode encurtar o tempo em que o país passará a viver sob um "ônus demográfico", quando a população idosa cresce em maior ritmo do que a população jovem. 

A surpresa entre economistas não foi sem motivo. No fim de 2022, o IBGE contabilizava 213 milhões de pessoas vivendo no país, mas fez uma revisão para 207,7 milhões, resultando na primeira diminuição de população estimada.

Na época, o instituto justificou que a divulgação ocorreu apenas por questões legais e o dado era parcial. A divulgação do Censo, nesta quarta-feira, mostrou uma diferença ainda maior: não temo 207,7 milhões, mas 203 milhões de pessoas. Foi o suficiente para fazer economistas e geógrafos se perguntarem: cadê as milhões de pessoas que deveriam estar aqui?

Um dos motivos, segundo o presidente interino do IBGE, Cimar Azeredo, foi a falta de uma contagem de meio de década. Por conta disso, o órgão utilizou uma taxa de crescimento anual média de 1,17%. A real foi de 0,52% – a menor já registrada na série histórica. O censo demográfico tinha uma contagem por amostra prevista em 2016, que não ocorreu por falta de recursos.

“É fundamental fazer uma contagem no meio da década para que não passemos pelo que passamos agora, um apagão de dados. Passamos, por conta da contagem, por um apagão de dados no meio da pandemia. Isso atrapalhou muito, não tínhamos informação sobre o número de vacinas para cada município", disse ele a jornalistas durante a tarde desta quarta-feira.

Ainda de acordo com o presidente interino do IBGE, uma comissão do instituto está fazendo a análise das informações do Censo 2022. Na expectativa de Azeredo, até o final de julho o órgão vai ter um diagnóstico detalhado sobre o que ocasionou essa defasagem. Também serão divulgados no próximo mês dados sobre populações quilombolas, originárias, e outros detalhamentos de perfis dos habitantes.

Sem a contagem de meio de censo, avalia Daniel Duque, gerente da Inteligência Técnica do CLP, a calibragem sobre as taxas de quem nasce e morre pode ficar menos precisa. "Ficamos 12 anos com estimativa de natalidade e mortalidade que não correspondiam com a realidade. A taxa de natalidade caiu muito, mais do que a expectativa", diz.

A opinião é corroborada por Bruno Imaizumi, economista da consultoria econômica LCA. "Esse modelo de projeção do IBGE pressupõe que haja contagem populacional no meio da década. Esse é um dos primeiros fatores do porquê esse número veio muito diferente", diz.

Dados mais detalhados

O demógrafo José Eustáquio Diniz Alves, professor aposentado da Escola Nacional de Ciências Estatísticas, avalia que análises mais aprofundadas só poderão ser feitas após a divulgação de todos os números do Censo, como gênero e idade. O IBGE deve trazer estas informações nos próximos meses.

"Os dados são divulgados aos poucos, pois dependem de todo um trabalho de sistematização que não é possível fazer de imediato. Os dados de sexo e idade são fundamentais para se avaliar melhor a dinâmica demográfica. O IBGE vai divulgar assim que for possível e a partir daí é possível fazer uma análise mais completa da população", diz.

Covid-19: mudança na dinâmica demográfica

A pandemia de covid-19 deixou 703.964 mortes, segundo dados do Ministério da Saúde. Estudos indicam que somando os casos subnotificados, pelo menos 1 milhão de pessoas foram vítimas do coronavírus no Brasil. Um estudo feito pela coordenadora de Estudos e Pesquisas de Igualdade de Gênero, Raça e Gerações no Ipea, Ana Amélia Camarano, mostra que o coronavírus mudou a dinâmica demográfica do país.

A doença levou o Brasil a acelerar o início do decréscimo de população, como mostra a análise feita pela pesquisadora.

A expectativa era de que este fenômeno ocorresse apenas em 2045, mas o estudo projeta para 2035, com uma duração de pelo menos 30 anos.

"As transformações demográficas em curso e as projetadas, além de afetarem o ritmo de crescimento populacional, afetarão também, significativamente, a distribuição etária", diz Camarano no estudo.

O demógrafo José Eustáquio Diniz Alves complementa que a covid-19 levou também muitas famílias a adiarem a decisão de ter filhos, diminuindo o crescimento da população.

"Estamos caminhando para um decréscimo, a dúvida é quando. O que já percebemos é que ele deve começar antes do esperado, ficando entre os anos de 2030 e 2035", afirma.

Envelhecer antes de enriquecer

Ainda que o IBGE não tenha divulgado os dados mais detalhados, sobre idade e gênero da população, é consenso entre especialistas de que a população está envelhecendo.

Os primeiros mandatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), de 2003 a 2010, foram marcados por crescimento econômico. Em boa medida, geógrafos e economistas apontavam que, para além de reformas internas e o mercado externo aquecido, o país tinha uma configuração estrutural a seu favor: mais pessoas em idade economicamente ativa que inativos.

Chamado de "bônus demográfico", esse fenômeno se encerrou, como indicam os dados gerais do IBGE. E onde há um "bônus", é preciso que haja um "ônus". Agora, o ônus demográfico parece já fazer parte das condições macroeconômicas do Brasil.

Para o demógrafo José Eustáquio Diniz Alves há oportunidades e desafios. "Se tem menos crianças, pode investir na qualidade das escolas e não na quantidade. Pode tirar as pessoas da informalidade, melhorar a qualidade de mão de obra. Há vários elementos que a economia sai ganhando, mas tem aquele grande dilema de que é preciso primeiro enriquecer para depois envelhecer. Se o Brasil não fizer isso, pode ficar preso na renda média", explica.

Para o economista Bruno Imaizumi, da LCA, o Brasil tem uma crise encomendada para este século: a demográfica. "Temos uma população mais velha, menos pessoas em idade economicamente ativa trabalhando. Com isso, provavelmente, um próximo governo tenha de fazer uma nova reforma da Previdência", diz. "O que acontece é que talvez antecipe o timing dessa crise que estava encomendada".

(Com Agência O Globo)

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