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Brasil bate recorde de conflitos no campo em 2023; indígenas são as maiores vítimas

Apesar da alta de casos gerais de violência, número de homicídios diminuiu em relação a 2022

Tribo indígena dos Tatuyos da Amazônia (Leandro Fonseca/Exame)
Agência o Globo

Agência de notícias

Publicado em 22 de abril de 2024 às 16h58.

O número de conflitos no campo bateu recorde no ano passado, de acordo com relatório da Comissão Pastoral da Terra (CPT), lançado nesta segunda, 22.

Em 2023, foram registrados 2.203 eventos de conflito, como invasões, mortes, agressões e destruição de pertences, quantidade 7% maior que 2022 e 57% superior a 2014. Por outro lado, houve redução de assassinatos, de 41 para 31 casos. As maiores vítimas são os indígenas, quase metade de todos os mortos.

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Os dados de 2023 superaram o recorde anterior, de 2020, quando houve registro de 2.130 ocorrências pela CPT. Essa é a 32º edição do relatório. Desde 2016, a estatística fica acima de 1.500 casos de violência por ano.

Mais de 950 mil pessoas, em 54 milhões de hectares de terra, estiveram envolvidas nos conflitos. A maior causa é a disputa fundiária: 72% dos casos. Outras causas de violência são disputa por água - que geram contaminações, poluições e privação de acesso - trabalho, em geral associado a casos análogos a escravidão, e, em menor número, a contagem de ações de resistência, como protestos contra ao Marco Temporal e por reforma agrária .

Considerando apenas as violências contra pessoas, houve 554 casos, atingindo 1.467 indivíduos e incluindo 31 assassinatos. Quase metade (14) dos mortos eram indígenas, além de nove sem-terras e três quilombolas. A região que concentrou mais mortes (oito) foi a Amacro, uma fronteira do desmatamento entre 32 municípios do Amazonas, Acre e Rondônia, impulsionada pelo agronegócio. Cinco desses assassinatos foram cometidos por grileiros.

Segundo a CPT, o avanço da hegemonia da concentração de terra e do modelo econômico de exploração mineral e agronegócio são "os principais responsáveis pelo grande crescimento dos conflitos no campo verificados nos últimos anos", além de uma conjuntura política específica, com a expansão do discurso conservador, violento e criminoso, capitaneado pelo bolsonarismo.

No entanto, a alta de violência já no início do governo Lula foi criticada por Isolete Wichinieski, da coordenação nacional da CPT, durante o lançamento do relatório, nesta segunda.

— Estamos em um governo dito parceiro dos povos do campo, mas os dados são recorde. E quando falamos de democracia, estamos falando de condições de vida para as comunidades e populações mais vulneráveis — afirmou a dirigente.

Violência nas florestas e nas barragens

Apesar da diminuição do desmatamento na Amazônia, segundo indicadores oficiais do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), a violência continua em alta na região, ilustrada, por exemplo, na crise humanitária que atinge a Terra Indígena Yanomami, em Roraima. A violência contra os indígenas passou a crescer exponencialmente a partir de 2016 e, a partir de 2019, os povos originários se tornaram as maiores vítimas.

Entre os quilombolas assassinados, o caso de maior relevância foi o de Mãe Bernadete, morta a mando de um líder do tráfico de drogas na região do Quilombo Pitanga dos Palmares, em Simões Filho, região metropolitana de Salvador. Além dos assassinatos, as estatísticas reforçam a gravidade da situação no campo nos números de: pessoas ameaçadas de morte (218) e tentativas de assassinato (66).

Danos em contexto de mineração, como as sequelas das tragédias dos rompimentos das barragens em Mariana e Brumadinho, são outras formas corriqueiras de conflitos no país, em especial em Minas Gerais e no Espírito Santo.

— Embora os números de assassinatos reduziram de 47 para 31, a gente fica assustado com a quantidade de pessoas que perdem a vida no combate da preservação da terra, do seu território — disse Dom José Ionilton, bispo da Prelazia de Itacotiara (AM), presidente da CPT e secretário da Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM-Brasil). — Nosso objetivo é fazer com que nossa sociedade, a partir dessas informações, se dê conta que de fato devemos assumir uma campanha contra a violência no campo. A violência continua muito alta na Amazônia, o número de ocorrências na região norte é o maior

Os maiores autores das violências, segundo o relatório, são fazendeiros, empresários, governo federal, grileiros e governos estaduais. A falta de titulação de terras indígenas ou quilombolas e de desapropriação de latifúndios para a reforma agrária são situações que fazem os governos serem categorizados como omissos e coniventes, de acordo com a CPT.

Das 1.724 ocorrências em disputa por terra, 1.588 aconteceram em "violências contra a ocupação e a posse e/ou contra a pessoa". Nesse caso, as invasões foram as ações mais vistas: 359 ocorrências, 10 a mais que 2022, afetando 74.858 famílias. Também cresceram os registros de expulsão (37 ocorrências e 2.163 famílias em 2023, contra as 23 ocorrências e 596 famílias, em 2022), de ameaças de despejo judicial (de 138 para 183) e o despejo judicial concretizado (de 17 para 50).

A "pistolagem" foi o segundo tipo de violência contra a ocupação e a posse que mais teve registros de ocorrência em 2023 (264), um crescimento de 45% em relação ao ano de 2022. Os indígenas e quilombolas foram os mais atingidos: 47 indígenas e 19 quilombolas.

Governo federal lança programa para reforma agrária

No último dia 15, o governo federal anunciou o "Terra da Gente", um programa para incentivar a reforma agrária e os processos assentamento de famílias. Com as ações, o governo classifica um estoque de terras disponíveis no país em 10 categorias, tornando claro onde é mais suscetível a reforma agrária, evitando conflitos violentos, conforme explicou o presidente Lula.

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