Bolsonaro ganha espaço em meio à violência na região Norte
O Norte é uma região de fronteira, violenta e de baixa densidade populacional e promessas do candidato atraem eleitores rurais que se sentem abandonados
João Pedro Caleiro
Publicado em 28 de agosto de 2018 às 13h12.
Última atualização em 28 de agosto de 2018 às 13h14.
Nos cantos do País onde a lei menos se faz presente, o capitão da reserva Jair Bolsonaro tem encontrado um público receptivo a suas propostas linha-dura.
O Norte do Brasil é uma região de fronteira, violenta e de baixa densidade populacional, onde a legislação de propriedade de terras é nebulosa e fazendeiros e sem-terra frequentemente se enfrentam.
A região só fica atrás do Nordeste em termos do percentual de dependentes do Bolsa Família, programa expandido durante os governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, que venceram as quatro últimas eleições presidenciais no Norte.
A violência no campo vem aumentando. O número de assassinatos no Brasil no ano passado chegou a um recorde de 63.880 – mais do que em qualquer outro país do mundo, segundo o Instituto Igarapé, do Rio de Janeiro.
Pará e Acre estão no topo do ranking de taxas de homicídio. Condenado por corrupção, Lula dificilmente será autorizado a concorrer em outubro. Sem ele no páreo, Bolsonaro lidera no Norte e em três das outras quatro regiões do País.
A promessa dele de proteger a vida e a propriedade privada faz sentido para eleitores de áreas rurais que se sentem abandonados e para quem se desespera com o aumento da criminalidade urbana.
“A propriedade privada é sagrada, não interessa se no campo ou na cidade!’’, ele declarou a uma multidão no Pará. “O estado não tem como prover segurança a vocês. Se não tem, o estado não pode impedir que vocês se defendam.’’
Conflitos por terra
Na Amazônia, onde a grilagem é endêmica, o processo de definição da propriedade rural é ainda mais difícil. Um novo sistema obriga a apresentação de documentação para todas as terras. A área registrada no Norte é maior do que o que seria geograficamente possível.
No ano passado, policiais entraram em uma fazenda em Pau D’Arco, no Pará, com mandatos para retirar invasores. Em vez de prendê-los, a polícia executou 10 pessoas e os ossos quebrados dos cadáveres indicaram tortura, de acordo com promotores.
Foi o maior massacre rural no País desde Eldorado dos Carajás, em 1996, quando a polícia do Pará matou 19 integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra, a maioria a queima-roupa.
Em visita a Eldorado dos Carajás, Bolsonaro chamou líderes dos sem-terra de gente “canalha e vagabunda’’ que deveria estar na cadeia.
“Precisamos separar o joio do trigo, separar quem quer produzir e quem quer invadir terra para depois vender’’, disse a pecuarista Maria Augusta da Silva Neta. “O Brasil chegou a um ponto em que precisa de uma mudança radical, para o bem. Só vamos ter isso com alguém com pulso forte.’’
Duas das cidades mais violentas do País ficam às margens da hidrelétrica de Belo Monte, o maior e mais polêmico projeto de infraestrutura do governo Dilma.
A construção exigiu atuação da Força Nacional e deslocou dezenas de milhares de habitantes, diminuindo o apoio ao PT e gerando condições para mais conflitos, de acordo com a defensora pública Andreia Barreto. A situação piorou porque o governo Michel Temer enfraqueceu as instituições agrárias, ela avalia.
Agravamento dos conflitos
Em maio, um fazendeiro foi morto em um caso envolvendo desmatamento ilegal em sua propriedade em Anapu, cidade próxima à hidrelétrica. Vestido com uma camiseta pró-Bolsonaro ainda encharcada com o sangue do irmão, Silvério Fernandes, 54 anos, gravou um vídeo em que chorava e pedia ajuda ao candidato.
“A única esperança é você, a nossa esperança é você. Por favor, meu irmão, nos ajude,", ele disse. "Nós éramos Bolsonaro e agora vamos ser mais ainda.’’ O vídeo viralizou rapidamente.
Bolsonaro já é forte nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste – mais ricas e com tendências conservadoras, disse o candidato a vice, General Hamilton Mourão, em seu gabinete no Rio de Janeiro.
Uma das prioridades da campanha, então, é atrair votos de indecisos no Norte e Nordeste, onde as pessoas precisam de mais ajuda do governo, ele explicou. Bolsonaro pretende visitar a região Norte novamente nesta semana.
Mauricio Moura, presidente da firma de inteligência política IDEIA Big Data, que entrevistou 50.000 pessoas desde março, confirmou que Bolsonaro está atraindo eleitores que antes iriam para o PSDB e também tirando alguns eleitores tradicionais do PT.
Pesquisas mostram os maiores índices de apoio ao candidato em Roraima, estado que faz fronteira com a Venezuela. Damião Lima, dono de uma quitanda em Pacaraima, não tem dúvida sobre quem terá seu voto.
"Quase não sei assinar meu nome, mas com toda a certeza irei votar no Bolsonaro, pelo que ele defende contra os bandidos e contra a corrupção,” disse Lima, 52 anos. “O Brasil precisa de alguém para botar moral no país.”