Setor produtivo aposta no STF contra tabela do frete após sanção de Temer
O setor citou custos bilionários com a imposição do tabelamento do frete rodoviário, instituído após a paralisação dos caminhoneiros em maio
Reuters
Publicado em 9 de agosto de 2018 às 16h26.
Última atualização em 9 de agosto de 2018 às 18h44.
São Paulo - Setores da indústria e agrícola se mantêm contrários à tabela de fretes rodoviários sancionada nesta quinta-feira pelo presidente Michel Temer e esperam que o Supremo Tribunal Federal ( STF ) decida pela inconstitucionalidade do instrumento no final deste mês.
A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) informou que entrou nesta quinta-feira com um novo pedido no STF para suspender o tabelamento. O setor citou custos bilionários com a imposição do tabelamento do frete rodoviário, instituído após a paralisação dos caminhoneiros em maio, ressaltando ainda que a lei elevará os custos dos alimentos, além de ameaçar reduzir a produção agrícola em áreas distantes dos grandes centros.
A CNA afirmou que formalizou no STF um aditamento à Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5959, protocolada pela entidade em junho para acabar com a eficácia da Medida Provisória (MP) 832, que criou a tabela de frete para o transporte rodoviário. O texto que converteu a MP em lei foi publicado nesta quinta-feira, no Diário Oficial da União.
"A CNA é contrária a qualquer tabelamento por entender que a medida fere a livre concorrência, além de trazer prejuízos à população. Desta forma, a confederação alega que a lei é inconstitucional", reiterou a organização em comunicado.
Segundo a CNA, "a lei trouxe questões acessórias que tornam a intervenção estatal até mais patente e inconstitucional".
A manifestação da entidade ocorre antes de uma audiência pública em 27 de agosto, convocada pelo ministro Luiz Fux, relator das ADIs no STF.
Fux deverá se posicionar sobre a tabela do frete após a audiência, mas a CNA defende a análise imediata da medida cautelar e a suspensão do tabelamento até a data do debate.
Segundo o presidente em exercício da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), José Roriz Coelho, a sanção da lei cria problemas para as empresas, uma vez que o tabelamento inviabiliza uma série de produtos, incluindo insumos da construção civil como cimento e fertilizantes.
"Isso cria problema de 'compliance'... Quem não cumprir a tabela está desrespeitando a lei", disse Coelho. Segundo ele, a indústria mantém posição favorável a uma tabela referencial para os fretes, mas não uma que seja obrigatória. "É inconstitucional fazer tabelamento de frete. Tem posição do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) contrária ao tabelamento."
Em estudo recente, a CNA estimou um aumento médio de 12,1 por cento no preço de alimentos como arroz, carnes, feijão, leite, ovos, tubérculos, frutas e legumes, que representam mais de 90 por cento da cesta básica.
Já levantamento da Fiesp afirma que a indústria vai ter uma alta de 3,3 bilhões de reais nos custos de transporte entre junho e o final deste ano por causa da tabela de frete.
Em manifestação paralela assinada por outras entidades do agronegócio, como Abiove, Anec e Aprosoja, o setor afirma que outros produtos como gasolina e diesel também ficarão mais caros.
A Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec) afirmou nesta semana que o setor, que opera com margens baixas própria do negócio de commodities, está sendo altamente prejudicado.
"O ponto central do nosso setor, no Brasil, é a logística. É onde as empresas conseguem ganhar algum dinheiro... Com a tabela de fretes, isso acaba com a rentabilidade das companhias", disse o diretor-geral da Anec.
Segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), os primeiros cálculos apontam que o tabelamento acarreta alta de custos da ordem de 73,9 bilhões de reais sobre o conjunto da economia, valor superior ao investimento anual do país em infraestrutura.
Para a Abiove, que representa tradings e processadoras de soja, o principal produto de exportação do Brasil, que lidera nas vendas globais da oleaginosa, os custos gerados pela tabela serão pagos por toda a sociedade brasileira, em especial as pessoas de mais baixa renda.
A competitividade internacional de produtos do Brasil, um dos maiores exportadores commodities agrícolas do mundo, também é colocado em xeque pela tabela de fretes, ressaltou a ABPA, entidade que representa exportadores de carne de frango, outra mercadoria que o país detém a liderança no cenário global.
"A questão logística, que já é um entrave para a capacidade produtiva nacional, passou a ser um fator de retenção de negócios. Com o menor fluxo produtivo, os custos da nova tabela poderão desencadear impactos na manutenção dos postos de trabalho e causar inflação", disse a ABPA.
Frotas próprias?
Enquanto o setor aguarda por uma solução da Justiça para a questão, a Cargill, um dos maiores exportadores do Brasil, e outras companhias estão avaliando a aquisição de frota própria de caminhões e a contratação de motoristas, para ficarem menos sujeitas aos efeitos da tabela.
Nesta quinta-feira, foi a vez da Suzano Papel e Celulose dizer que não descarta eventual incorporação de caminhões próprios para lidar com os consequentes aumentos no custo de transporte de insumos e produtos aos clientes, entre outras medidas. A petroquímica Braskem avalia entre as opções usar mais o transporte de cabotagem, mas pondera que o reajuste do país aos efeitos da tabela poderá criar novos gargalos logísticos.
Montadoras como Mercedes-Benz e Volvo identificaram nas últimas semanas aumento de sondagens de transportadores e embarcadores sobre aquisição de frotas de caminhões, enquanto empresas menores, como pequenos produtores rurais, já estão encomendando veículos.