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Ao menos oito estados não pretendem aderir a uso geral da cloroquina

Novo protocolo sobre o uso de cloroquina no combate ao coronavírus permite o uso do medicamento na fase inicial da doença

Coronavírus: Bolsonaro se reuniu nesta quinta-feira (21) com governadores para debater auxílio aos estados (Marcos Corrêa/PR/Flickr)

Coronavírus: Bolsonaro se reuniu nesta quinta-feira (21) com governadores para debater auxílio aos estados (Marcos Corrêa/PR/Flickr)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 21 de maio de 2020 às 13h06.

Última atualização em 21 de maio de 2020 às 15h52.

Ao menos oito governos estaduais já sinalizaram que não vão aderir ao uso generalizado de cloroquina - entre eles, São Paulo Bahia e Rio Grande do Sul. Em outros sete, as administrações afirmam que a aplicação ou não da substância ainda está sob estudo. As demais unidades federativas não deram retorno até o final da noite desta quarta-feira.

Considerado epicentro do coronavírus no País, São Paulo deve manter a administração de cloroquina nos hospitais como era feita até então, segundo afirmou o governador João Doria (PSDB). "Nós não faremos distribuição nem aplicação generalizada da cloroquina, porque a ciência não recomenda", disse. "A ciência não orienta este procedimento e em São Paulo nós seguimos o que diz a ciência."

No Rio Grande do Sul, o governador Eduardo Leite (PSDB) declarou que "quem tem de tomar a decisão é o profissional de saúde". "Não há evidência suficiente para que a cloroquina tenha administração irrestrita, pelo contrário: são feitos muitos alertas sobre possíveis efeitos colaterais graves."

O governador da Bahia, Rui Costa (PT), também se opôs à nova recomendação do Ministério da Saúde e criticou a politização do remédio. "Não será adotado. Os médicos com seus pacientes e familiares definem o protocolo de atendimento", disse ao Estadão. "Na Bahia receita médica não é definida por ideologia ou pelos políticos."

Por sua vez, o governo Flávio Dino (PCdoB), do Maranhão, disse que "não há certeza científica em nível internacional ou nacional" sobre o assunto. Em Pernambuco, o governo Paulo Câmara (PSB) afirmou que "recebe com preocupação as novas orientações do Ministério da Saúde" e destaca não haver número suficiente de comprimidos, caso se queiram tratar todos os casos leves.

"Não há nenhuma modificação", afirmou por sua vez o secretário da Saúde da Paraíba, Geraldo Medeiros. Segundo afirma, o corpo técnico da área tem estudado "inúmeros trabalhos" e não há "evidências científicas comprovadas" dos benefícios da cloroquina. "É fundamental que (o uso) seja sob prescrição médica, porque o médico se responsabiliza por essa prescrição", disse. No Norte, o governo Helder Barbalho (MDB) também diz que não vai alterar a administração da cloroquina nas unidades do Pará.

No Mato Grosso do Sul, o secretário de Saúde, Geraldo Resende, disse que o medicamento adquirido pelo governo foi destinado para trabalho científico em duas unidades hospitalares. "O uso da cloroquina é reservado à decisão do médico em relação à aplicação."

Já os governos de Minas, Paraná, Santa Catarina, Mato Grosso, Acre, Piauí e Rio Grande do Norte afirmaram ao Estadão que o novo protocolo está sendo avaliado por comitês científicos locais ou pelas Secretarias de Saúde. O governo do Distrito Federal não se pronunciou.

SUS

O secretário do Maranhão, Carlos Lula, afirma que há receio sobre a orientação estimular pressão da população sobre gestores do Sistema Único de Saúde (SUS) e médicos. "Indiretamente já tem acontecido, mas é um erro. Debate equivocado. O presidente (Bolsonaro) acaba trazendo isso ao centro do debate", disse. "A gente sabe que não há medicação 100% eficaz. A maioria dos pacientes melhora sem tomar nada, pode tomar cloroquina ou tubaína, vai dar na mesma. É um debate equivocado", disse o secretário, em uma alusão à ironia feita por Bolsonaro, em live na terça.

Médicos pressionados

Para especialistas, recomendações de uso da droga devem exercer pressão sobre médicos para a prescrição. "Não só pela recomendação em si, do governo, mas, sobretudo, pela pressão do público leigo, pacientes e familiares", diz Jorge Salluh, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Para Salluh, deve haver também um outro tipo de pressão, no futuro. "Qualquer um que prescrever essa droga hoje, no futuro pode ser processado por má prática, no meu entender", afirmou. "Porque prescreveu droga sobre a qual não há benefícios comprovados e há potencial de risco ligado à dosagem."

Advogados ouvidos pelo Estadão avaliam que a iniciativa é simbólica e política, sem obrigar prescrição. Para Davi Tangerino, professor de Direito Penal da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP), a medida não é passível de processo criminal. "O que faz é uma autorização", explicou. Segundo o jurista, não se trata de uma norma que obrigue os médicos a usarem a droga nos casos leves da doença. A adoção do tratamento continua a critério dos especialistas. "A meu ver, não cabe responsabilizar criminalmente (o ministério)", disse.

Mas o professor explicou que Ministério Público ou Defensorias Públicas podem, isso sim, apelar para o aspecto cível da questão na medida em que essa norma pode levar as estruturas públicas, do SUS, por exemplo, a sofrerem danos por uso de um medicamento sem a eficácia comprovada contra a doença. "E esse é um outro aspecto", alertou o jurista.

O advogado Daniel Dourado, que também é médico, vê um "protocolo informal", ou seja, uma orientação de uso "fora da bula". Sem a indicação especificada no registro oficial, o uso seria ilegal. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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