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Fazenda de pecuária: Rastreabilidade pode colocar Brasil como referência em agropecuária sustentável (Germano Lüders/Exame)
Repórter de Agro
Publicado em 28 de abril de 2023 às 13h08.
Em evento realizado em São Paulo, nesta quinta-feira, 27, diferentes atores da produção pecuária se juntaram para discutir os rumos da atividade no Brasil. Produtores, indústria, sociedade, banco e governo questionaram o modelo tradicional de pecuária por diferentes prismas, como rastreabilidade, crédito e diminuição das emissões de gases de efeito estufa. Uma força-tarefa para a cadeia rever sua forma de produção em meio ao seguinte contexto: o posicionamento do Brasil como maior exportador de carne bovina em meio à pressão sobre o fim do desmatamento e o avanço da crise climática.
Na ocasião, foi reforçado o quanto a rastreabilidade, da origem animal até o prato do consumidor, precisa ser resolvida. E é urgente.
O segundo semestre de 2022 registrou o maior número de desmatamento dos últimos 10 anos na Amazônia, o que significa supressão de cerca de sete mil quilômetros quadrados. Por outro lado, 85% dos imóveis registrados no Cadastro Ambiental Rural (CAR) no bioma não apresentam desmatamento, nem legal nem ilegal. Os dados foram apresentados por João Paulo Capobianco, secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente.
“O que ocorre é que, dos outros 15%, 2/3 desse desmatamento está concentrado em 2% dos imóveis rurais na Amazônia. Não é um desmatamento generalizado. Portanto, é muito factível uma ação bem planejada, tanto no sentido de coibição, quando for ilegal, como ação de convencimento e oferta de alternativas e valorização do patrimônio para que esses proprietários reconheçam a potência da preservação de seus imóveis”, afirmou o secretário.
Para isso, um trabalho em conjunto com o Ministério da Agricultura, da Indústria e Comércio, entre outras pastas, está sendo articulado. Carlos Fávaro, ministro da Agricultura, afirma que estruturar a rastreabilidade é uma das prioridades do governo.
“Ela é fundamental para separar quem produz com sustentabilidade daqueles poucos que não têm esse interesse, mas prejudicam o setor. A imagem no exterior decorre exatamente de uma minoria que prejudica todo o segmento. É urgente separar o joio do trigo”, disse.
O desmatamento é responsável por 49% das emissões brutas de gases de efeito estufa no Brasil, o que tem comprometido a imagem do país no exterior.
Paulo Pianez, diretor de sustentabilidade da Marfrig, destaca que o questionamento sobre a origem do alimento é pauta no Parlamento Europeu. “Se o País não atender a essas demandas com dados e transparência, nenhuma narrativa vai colar”, afirmou. E se o grande importador brasileiro é a China, também há contas para se prestar. “A gente fala que o grande mercado é Ásia, China, mas também já estão discutindo essas questões. Isso causa pressão nos preços globais, então é uma questão econômica”, disse Pianez.
Quem também deu o tom de urgência perante os mercados que importam a carne nacional foi Jorge Viana, presidente Apex. Ele esteve com o presidente Lula em comitiva na Europa e afirmou que a “imagem do Brasil no exterior está destruída e precisamos retomá-la”.
Com a nova agenda do governo, segundo ele, há confiança em retomar a credibilidade dos importadores. “E se for concretizado o acordo entre União Europeia e Mercosul, isso muda a geopolítica do mundo”, disse Viana, cuja carreira também soma experiência como relator do Código Florestal em 2011.
Para Izabela Teixeira, ex-ministra do Meio Ambiente e co-chair do Painel Internacional de Recursos Naturais da ONU, o Brasil precisa sair do papel reativo e assumir a liderança na agenda de descarbonização da agropecuária, por ser “o país que mais produz vida no Planeta”.
“O agro brasileiro foi estratégico quando, há 50 anos, passou a produzir alimentos. Agora, precisamos ser novamente estratégicos em como produzir com alinhamento ambiental”, afirmou Teixeira.
Se souber unir responsabilidade ambiental com produtividade, Izabela dá uma perspectiva positiva de como o Brasil pode contribuir com a agropecuária na América do Sul e África. “Se assumirmos este papel, cria-se uma relação de poder muito interessante do ponto de vista geopolítico, porque é o Hemisfério Sul que detém a riqueza ambiental”, diise.
Com uma receita líquida de R$ 130 bilhões em 2022, a Marfrig foi mencionada por João Paulo Capobianco, do Meio Ambiente, como um possível exemplo de rastreabilidade da cadeia da carne. Isso porque o frigorífico afirma ter 100% dos seus fornecedores diretos e 70% dos indiretos rastreados. A base total de fornecedores é de 30 mil pecuaristas.
“Cerca de 25% dessa base eram produtores que a gente bloqueava por não estarem em conformidade. Mas não é inteligente nenhum mecanismo de exclusão. Para onde ia esse gado? Para outro frigorifico. Então, em vez de excluí-lo, a ideia é o que fazer para apoiá-lo a fazer regularização ambiental e fundiária”, disse Paulo Pianez, da Mafrig.
O resultado é que, de 2021 até março de 2023, foram regularizados cerca de três mil produtores, tornando-os parte de uma cadeia mais transparente.
Para isso, a empresa tem cruzado uma série de dados, como Cadastro Ambiental Rural, imagens geoespaciais e a Guia de Transporte Animal, para saber a origem da carne.
A proposta é que este modelo seja compartilhado com o governo federal para ganhar escala e dar lastro para qualquer questionamento que venha, seja dos consumidores brasileiros ou do mercado externo.
Na perspectiva do governo federal, replicar este modelo de estrutura de rastreabilidade é um trabalho árduo, mas não tão longe de ser feito. Para Capobianco, o Brasil precisa utilizar estes mesmos dados para oferecer segurança para os grandes importadores. “Com isso, daremos uma resposta segura e consistente mostrando que o Brasil hoje tem uma ação objetiva que é capaz de produzir com sustentabilidade, abastecer mercados interno e externo”, afirmou.