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Escolas particulares para a classe C, com mensalidades a partir de 500 reais, são o negócio do momento no mercado de ensino

José Aliperti e Affonso Ferreira, sócios, na Escola Mais: a meta é ter 100 unidades e 55.000 alunos em dez anos (Germano Lüders/Exame)

José Aliperti e Affonso Ferreira, sócios, na Escola Mais: a meta é ter 100 unidades e 55.000 alunos em dez anos (Germano Lüders/Exame)

AJ

André Jankavski

Publicado em 25 de abril de 2019 às 05h38.

Última atualização em 12 de junho de 2020 às 15h41.

Uma escola encravada no bairro da Penha, na zona leste de São Paulo, faz parte de um ambicioso plano da empresa de investimentos Bahema. Lá fica sediada a primeira unidade da Escola Mais, que tem 600 alunos matriculados e foge do perfil de instituições em que o grupo está acostumado a investir. A Bahema foi criada há 60 anos e desde 2016 investe em escolas. Costuma mirar instituições voltadas para a classe A, como a Escola da Vila, em São Paulo, a Balão Vermelho, em Belo Horizonte, e a Escola Parque, no Rio de Janeiro, que cobram cerca de 2.500 reais por mês de cada aluno.

Já a Escola Mais cobra 690 reais de mensalidade pelo período integral. Os estudantes têm aula das 7h30 às 15h40, mas podem continuar na escola até as 19 horas sem custo adicional. A instituição atrai, assim, uma grande parcela da classe média que não tem acesso ao ensino particular. A Bahema tem outros sócios na Escola Mais, como a gestora de recursos Mint e a rede de escolas Ágathos Educacional, dona das bandeiras Anglo e Objetivo, as quais, juntas, têm 60% do negócio. A fatia restante está nas mãos dos fundadores, entre eles o diretor e idealizador da escola, José Aliperti. “Enxergamos esse projeto como um motor de expansão da empresa”, diz Guilherme Affonso Ferreira Filho, presidente da Bahema.

Escolas particulares voltadas para alunos de classe média viraram o novo filão do mercado educacional. Enquanto no ensino superior as redes privadas têm 75% dos alunos, no ensino básico e fundamental ocorre o contrário. As cerca de 40 000 escolas privadas têm 9 milhões de alunos no Brasil, aproximadamente 18% do total. A tendência é que ganhem cada vez mais terreno. Uma estimativa da consultoria EY Parthenon mostra que 1 milhão de estudantes devem migrar do ensino público para o privado nos próximos cinco anos.

O Estado brasileiro dá pouco valor às primeiras etapas de ensino. O investimento feito no básico por estados e municípios é de 310 reais mensais por aluno, ante os 1.700 reais por mês no ensino superior, e sobra descontentamento dos pais com a qualidade das aulas, a insegurança das escolas e as constantes paralisações. “Existe uma demanda dos pais de classe média dispostos a gastar para ter a certeza de que o filho está em um ambiente melhor e protegido”, diz o professor Naércio Aquino, especialista em educação da escola de negócios Insper.

Faculdades voltadas para a classe média viraram um filão lucrativo para grandes grupos de ensino, como Kroton, Estácio e Ser Educacional. Atraíram milhares de alunos com mensalidades baixas e financiamento camarada (muitas vezes pago pelo governo). Tinham a seu favor custos fixos baixos, com turmas grandes e um público sedento. Com escolas básicas, a equação é mais difícil. O Ministério da Educação é rigoroso quanto a currículo, tamanho das turmas e instalações físicas, e isso costuma jogar a mensalidade para cima. Além disso, é um setor muito pulverizado, que dificulta o crescimento via aquisições.

Mesmo grandes grupos de ensino que passaram a investir nesse segmento, como a Kroton, miraram instituições de elite, que permitem maiores margens. Mas a nova onda de investidores voltados para a classe C garante ter chegado a um modelo em que a conta fecha. As empresas admitem que as margens são pequenas, mas a escala tende a compensar. “Temos uma função social muito grande, mas conseguimos aliar com um negócio rentável”, diz Aliperti.

Em comum, as redes de escolas com foco na classe média têm planos grandiosos. A Escola Mais está captando 20 milhões de reais para abrir cinco unidades até 2021. Nos próximos dez anos, a meta é ter 100 unidades e 55.000 alunos matriculados. A Escola Luminova, do Grupo SEB, controlado pelo empresário Chaim Zaher e por sua filha, Thamila Zaher, planeja investir 50 milhões de reais.

Até agora a Luminova inaugurou quatro colégios, sendo três na capital paulista e um em Sorocaba, no interior do estado. O plano é chegar a 25 em cinco anos. “Estamos fazendo todos os investimentos com capital próprio. Mas podemos abrir para parceiros e, com isso, acelerar a expansão no futuro”, diz Thamila. As mensalidades começam em 500 reais, porém há uma estratégia para aumentar o valor: o contraturno. Por até 60% a mais, os pais podem deixar o filho em período integral, com aulas diárias de disciplinas como inglês e música.

O contraturno é uma saída também para uma queda natural no número de alunos. Com as mudanças demográficas, o número de crianças tende a diminuir nos próximos anos. Segundo uma projeção oficial, nas duas décadas seguintes, o número de crianças de 0 a 9 anos no Brasil deve encolher de 29,3 milhões para 25,8 milhões. No ensino fundamental, a quantidade de alunos matriculados da 1a à 9a série caiu 5% de 2014 a 2018, segundo dados do Ministério da Educação. Em São Paulo, a startup Alicerce nasceu focada apenas no contraturno. Criada pelo ex-presidente da Dental Cremer Paulo Batista, a Alicerce deve começar a operar no segundo semestre, com mensalidades de até 150 reais para abrigar no contraturno jovens de escolas públicas. Cada unidade deve atender 400 alunos.

Escola básica: aulas de inglês e música estão entre as ofertas no contraturno | Divulgação

A Saber, holding de educação básica da Kroton, planeja atingir a classe C por meio dos espaços ociosos em suas universidades. O foco está apenas no ensino médio (de 15 a 17 anos). A ideia é aproveitar a infraestrutura existente nas faculdades e colocar os jovens em contato com o ensino profissionalizante. O projeto já foi posto em prática pela rival Estácio no ano passado, também em fase de teste — as mensalidades são de cerca de 700 reais. Nos últimos cinco anos, o total de matrículas no ensino médio caiu 7% no país, puxado pela alta evasão escolar. O setor privado detém apenas 12,1% do total de matriculados nesse segmento. “Está muito fácil produzir resultados no ensino médio”, afirma Romário Davel, sócio da consultoria Atmã Educar.

Equilibrar custos e qualidade é o maior desafio das empresas que querem ter larga escala. Pagar menos aos professores, segundo as instituições ouvidas por EXAME, não é o caminho. Escolas como a Mais e a Luminova apostam na formação de professores dentro de casa. A Eleva Educação, empresa que tem o bilionário Jorge Paulo Lemann como um dos acionistas, afirma pagar 50% mais a seus professores do que a média das escolas privadas. A empresa tem 37 escolas voltadas para a classe média, com a bandeira Elite, em quatro estados. “Conseguimos isso com uma estrutura simples, sem laboratórios de última geração, mas com enfoque na qualidade do ensino”, diz Bruno Elias Pires, presidente da Eleva.

A empresa tem como meta manter a média atual de abertura de unidades, de dez por ano. Nos últimos rankings do Pisa, a mais importante avaliação internacional da educação básica, os colégios particulares brasileiros tiveram médias inferiores às dos países ricos em matemática e ciências. Na leitura, obtiveram a nota média dos países ricos. Nos dois casos, estão longe das nações de ponta e muito acima da média das escolas públicas brasileiras. É uma diferença que, para cada vez mais famílias, justifica os 500, 600 ou 700 reais extras gastos por mês. 

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