Filas de caminhões: malha viária deficiente de um lado e um canal raso e estreito de outro tornam lento o trânsito de cargas em Santos (Claudio Rossi/EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 31 de maio de 2013 às 16h40.
São Paulo - São 4 e mia da tarde de uma quinta-feira. O congestionamento na rodovia Cônego Domenico Rangoni, mais conhecida como Piaçaguera-Guarujá, no litoral sul de São Paulo, lembra a fila de carros que se espreme nos finais de ano com destino às praias paulistas.
Mas, em vez de automóveis com turistas em busca de lazer, são caminhões que ocupam quase 5 quilômetros da estrada. Para chegar à entrada esquerda do porto de Santos, no Guarujá, eles ainda terão de enfrentar quase 1 quilômetro na rua do Adubo (oficialmente rua Idalino Pines), uma pequena via de duas mãos esburacada e confusa, que num dos trechos vira mão inglesa.
É difícil prever quanto tempo os caminhões ficarão no anda e para. Com sorte, após 3 horas será possível completar o curto percurso — a uma velocidade slow motion de 2 quilômetros por hora. O inconveniente atinge dois terços dos 50 milhões de toneladas exportados por Santos todos os anos.
As dificuldades para chegar ao porto de Santos vêm de muito tempo e são incompatíveis com a importância do terminal para a economia brasileira. Produtos agrícolas, siderúrgicos e minérios com origem em Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás utilizam o porto como saída para o exterior.
Somados às cargas que vêm do interior de São Paulo e ao que chega de outros países, o movimento equivale a pouco mais da metade do comércio internacional do país.
O governo paulista, responsável pelos acessos rodoviários, fala da necessidade de realizar pequenas e importantes obras para reduzir os gargalos desde o início dos anos 90. O investimento, porém, ficou concentrado na descida da Serra do Mar, como a construção de trechos do rodoanel e das novas pistas da rodovia dos Imigrantes.
A malha viária na Baixada Santista evoluiu pouco e, com isso, o engarrafamento nas proximidades do porto se agravou. No entroncamento da via Anchieta com a Piaçaguera, um semáforo atrapalha o trânsito de 100 000 veículos por dia.
O governo anunciou em agosto um aporte de 300 milhões de reais para a construção de um viaduto e para o alargamento de 8 quilômetros nos dois sentidos da rodovia Piaçaguera.
As obras, que foram adiadas inúmeras vezes, vão ajudar a alargar o funil que se forma na entrada e na saída do porto. “Não adianta nada melhorar o topo da serra sem se preocupar com uma integração razoável no acesso do porto”, diz Manoel Reis, coordenador do centro de logística da Fundação Getulio Vargas. “A falta de entendimento entre os governos estadual e federal sempre foi um entrave.”
Responsável pela coordenação da área portuária, o governo federal até recentemente não admitia mexer no entorno de Santos. Qualquer melhoria do muro para fora do porto era considerada responsabilidade do governo estadual. Hoje, há sinal de um início de entendimento.
“Todos os responsáveis pelo porto têm de se preocupar com o acesso para permitir que as cargas fluam com rapidez”, diz Renato Barco, presidente da Companhia das Docas, empresa federal que administra o porto.
O mergulhão, um túnel de 900 metros sob o canal do porto para interligar as duas margens do cais, a de Santos e a do Guarujá, é um típico exemplo do empurra-empurra entre as esferas de governo. Sua construção evitará uma viagem de 45 quilômetros para contornar a cidade de Cubatão.
O atalho pode reduzir custos e aumentar a competição entre os terminais portuários situados nas duas margens. Após anos de debate, o projeto, orçado em 1,3 bilhão de reais, entrou no pacote de obras do Programa de Aceleração do Crescimento, mas ainda está no papel.
Da mesma maneira, o ferroanel, um arco ferroviário para circundar a capital paulista, facilitando o escoamento de carga, passou anos em discussão entre os dois governos antes de virar prioridade do recém-lançado Plano Nacional de Logística e Transporte da União.
Sem incentivo para utilizar os trens, apenas 3% dos contêineres chegam a Santos por trilhos. No porto de Hamburgo, na Alemanha, um dos maiores da Europa, quase 30% dos contêineres chegam por ferrovias.
Mas não é somente no acesso terrestre que o porto de Santos deixa a desejar. Os navios enfrentam inconvenientes na entrada do canal, estreito e pouco profundo para os cargueiros atuais. Desde 1999 o governo federal arrasta as obras para aumentar a largura e permitir o trânsito de embarcações em mão dupla — hoje somente um navio por vez entra ou sai.
Para isso, basta que seja completada a remoção dos destroços do Ais Giorgis, um cargueiro grego com produtos químicos que pegou fogo em 1974. Afundado na entrada do canal, o navio estreitou a passagem de 220 para 150 metros — e assim está há 38 anos. Quando a remoção for concluída, a fila de navios à espera da vez para acessar os berços dos terminais deve acabar.
“Os congestionamentos geram um custo alto de espera”, diz Julian Thomas, diretor executivo da empresa de transporte alemã Hamburg Süd no Brasil. "As empresas precisam que a infraestrutura acompanhe a evolução das embarcações."
Os esforços em andamento para melhorar a chegada e a saída do porto têm objetivos claros: o início das atividades dos terminais da Embraport e da BTP, previsto para o primeiro semestre de 2013. Juntas, as duas empresas de logística investiram mais de 4 bilhões de reais na criação de novas áreas de embarque de contêineres e granéis.
Sem a ampliação dos acessos, será difícil atender a essa demanda. Há no horizonte também uma perspectiva de ampliação da área portuária. A Codesp tenta recuperar com a Marinha áreas das ilhas Barnabé e Bagres, situadas nos limites do canal, que estão nas mãos de particulares.
São 30 quilômetros quadrados onde seria possível dobrar a capacidade do porto para 240 milhões de toneladas ao ano. Essa expansão terá um custo de 5 bilhões de reais, mas não deve acontecer antes de 2020. Até lá, ao menos os bloqueios atuais precisam ser removidos.