Revista Exame

O mundo já está ligado na 5G, mas o Brasil ainda está de fora

As redes de quinta geração vão ampliar a capacidade de transmissão das operadoras de celular e impulsionar os negócios

Torre de celular em São Paulo: o número baixo de antenas é uma barreira à adoção da 5G (Germano Lüders/Exame)

Torre de celular em São Paulo: o número baixo de antenas é uma barreira à adoção da 5G (Germano Lüders/Exame)

TL

Thiago Lavado

Publicado em 21 de junho de 2018 às 05h00.

Última atualização em 23 de julho de 2018 às 19h44.

Depois que a internet móvel de terceira geração, a 3G, chegou aos primeiros smartphones em 2008, a forma de usar o celular nunca mais foi a mesma. O e-mail passou a ser consultado em qualquer lugar. Os guias de ruas deram lugar aos aplicativos de mapas e de navegação GPS. Até mesmo as mensagens de texto SMS foram substituídas pelo WhatsApp, o aplicativo mais utilizado pelos brasileiros. A 4G, tecnologia de transmissão com velocidade dez vezes maior, cimentou de vez essa relação de dependência do usuário com a internet móvel. Hoje, o celular serve para tudo: fazer pagamentos, pedir comida, emitir um bilhete aéreo, chamar um motorista, aplicar num fundo de investimento. Apesar de notáveis, nem todas as mudanças provocadas pela 3G eram tão óbvias há dez anos. E é por isso que os especialistas apontam que algo parecido está prestes a ocorrer com a chegada da 5G. Em fase inicial de implementação, a quinta geração das redes móveis é tida como uma tecnologia que vai abrir portas para as novas indústrias — da internet das coisas aos carros autônomos.

Para ter ideia, um carro autônomo do tipo que está sendo testado pela montadora americana Tesla, uma das pioneiras nesse ramo, precisa ter um supercomputador a bordo para processar os dados da função autônoma. É preciso analisar as câmeras de vídeo, os sensores ultrassônicos de proximidade, os radares. Não é possível processar tudo isso num ambiente virtual porque a velocidade da conexão e a estabilidade do sinal não são compatíveis com a tomada de decisão no trânsito. A solução da Tesla: aumentar a capacidade de processamento no carro com um computador tão potente quanto 150 MacBooks Pro, o laptop topo de linha da fabricante Apple — e isso aumenta o preço de cada veículo em 8.000 dólares.

Com uma conexão mais eficiente, mais rápida e estável, esse é um tipo de problema que tende a ser solucionado com a 5G, abrindo caminho para a chegada de uma série de novas aplicações da tecnologia. “Com a 5G, será possível fatiar as redes móveis e dedicar uma parte da capacidade de transmissão a aplicações específicas, como frotas conectadas, melhorando muito o tempo de resposta”, diz Atila Branco, diretor de planejamento de redes da telefônica Vivo. A expectativa é que, daqui para a frente, as redes de celular sejam usadas não apenas por smartphones e computadores mas também por outros tipos de equipamento. A previsão é que haverá 8 bilhões de conexões de banda larga móvel no mundo em 2023 — hoje são 5 bilhões. O aumento do número de aparelhos conectados deve provocar um salto na quantidade de dados transmitidos pelas redes móveis. De acordo com um relatório da companhia de telecomunicações Ericsson, calcula-se que 107 bilhões de gigabytes vão trafegar por mês em 2023 — sete vezes o volume de dados atual.

As empresas vêm se movimentando para não ficar de fora desse mercado promissor. A fabricante de processadores Intel anunciou neste ano uma parceria com empresas como Dell, HP e Microsoft para adaptar os laptops à tecnologia 5G. E a operadora de telefonia AT&T promete instalar redes 5G em 12 cidades americanas até o fim de 2018. “As primeiras aplicações serão para roteadores e serviços de Wi-Fi e banda larga fixa, melhorando a conectividade da 4G, antes de chegar aos celulares. No médio prazo, isso deve ter impacto em toda a economia”, diz Vinícius Dalben, vice-presidente de estratégia da Ericsson. Para ele, em cinco anos 20% de todo o tráfego móvel vai se dar por redes 5G, e essa quantidade de dados será 50% maior do que todo o volume atual.

Em março, o Congresso americano aprovou uma lei que traça as diretrizes de uso de frequência e desenvolvimento de banda móvel nos Estados Unidos, algo visto como uma aceleração na corrida global rumo à liderança de mercado na 5G. Na mesma época, o presidente Donald Trump vetou a fusão entre a fabricante de processadores Broadcom, de Singapura, e a americana Qualcomm — um negócio de 121 bilhões de dólares. O motivo de Trump: segurança nacional. A Qualcomm é uma das empresas que desenvolvem microprocessadores 5G, uma área estratégica para os Estados Unidos aumentarem sua competitividade e diminuírem os custos na indústria de tecnologia.

Enquanto os países ricos se preparam para a chegada da 5G, o Brasil ainda se arrasta em questões básicas, como legislação e infraestrutura. Um fator crucial para o desenvolvimento da tecnologia é a oferta de torres de retransmissão do sinal  de celular — as chamadas estações radiobase. A 5G utiliza uma faixa de frequência de menor alcance, o que exige a instalação de mais torres para que o sinal seja capaz de cobrir uma mesma área. E aí as empresas esbarram na burocracia. Na cidade de São Paulo, o prazo para obter uma licença de instalação de uma torre é de cinco anos, segundo estimativas da Associação Brasileira de Infraestrutura para Telecomunicações (Abrintel). “Quando há uma concentração alta de usuários por antena, o serviço fica prejudicado. Com as novas aplicações e a 5G, a rede será sobrecarregada sem novas torres”, diz Leonardo Capdeville, diretor de tecnologia da TIM no Brasil.

As operadoras estão em conversas com o governo federal para leiloar uma faixa para a 5G no Brasil já no ano que vem, mas, sem a ampliação da infraestrutura, a tecnologia ainda levará anos para se disseminar. Em todo o Brasil, há 72.000 torres, menos da metade das 200.000 disponíveis nos Estados Unidos. Num índice que mede a capacidade de os paí-ses implementarem novas tecnologias de telecomunicações, elaborado pelo Fórum Econômico Mundial, o Brasil aparece em 72o lugar entre as 139 nações avaliadas, atrás da China (59o) e do Chile (38o). Mudar esse quadro é fundamental para o país não ficar para trás.

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