Revista Exame

Os bônus dos bancos de investimento encolheram

Os banqueiros de investimento se acostumaram a ganhar fortunas no Brasil. Mas o bônus despencou. Para manter seus empregados, os bancos se viram como podem


	Banco HSBC: a receita dos bancos caiu quase 30% em três anos
 (Susana Gonzalez/Bloomberg)

Banco HSBC: a receita dos bancos caiu quase 30% em três anos (Susana Gonzalez/Bloomberg)

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Da Redação

Publicado em 27 de março de 2014 às 20h00.

São Paulo - Todo início de ano, uma cena se repete nos bancos de investimento: os funcionários recebem um envelope com o valor do bônus que vão ganhar pelo desempenho no ano anterior. Geralmente, eles têm uma ideia do que vai cair na conta.

Comparam seu trabalho com o dos colegas, fazem uma estimativa do lucro do banco, analisam o que foi distribuí­do no passado e ficam com um número na cabeça. Meio milhão de reais? Um? Dois? Oito milhões? Essa é a dúvida que atormenta a turma no início de cada ano.

Estamos em plena temporada de entrega de envelopes no Brasil — e, neste ano, foi decepção atrás de decepção. Como os salários fixos nos bancos de investimento costumam ser relativamente baixos, o que garante a remuneração dos profissionais é o bônus, e os valores que vão começar a ser pagos agora são, com poucas exceções, menores do que os de 2013 (que já haviam sido inferiores aos do ano anterior).

No banco Credit Suisse, um executivo pediu demissão depois de ver quanto receberia. No BTG Pactual, um analista chorou depois de abrir seu envelope. Na maioria dos bancos, houve discussões entre funcionários, e um deles foi demitido depois de “agredir verbalmente seu chefe”. 

Apesar da reação exagerada de alguns, nada indicava que os bônus seriam bons neste ano. Com menos ofertas de ações, as receitas dos bancos de investimento caíram novamente em 2013 — desde 2010, a queda foi de quase 30%. O bolo está menor e, para piorar as coisas, tem de ser repartido entre mais concorrentes, atraídos pela onda de aberturas de capital de 2006 e 2007.

Foram tempos em que, nas palavras de um banqueiro, “qualquer tijolo voava”, referência aos micos vendidos aos investidores. Hoje, os grandes disputam mandatos de fusões e aquisições com novos bancos, como BR Partners e Brasil Plural, e com empresas especializadas nesse setor, como a recém-chegada americana Greenhill. Até o Banco do Brasil entrou na briga.

Com mais concorrência, as comissões pagas pelos negócios caíram pela metade. Em média, a redução do bônus foi de 20% — segundo EXAME apurou, a queda ficou em torno de 10% no Credit Suisse, no JPMorgan e no Morgan Stanley, em 20% no BTG e em até 30% no Goldman Sachs e no HSBC.

No Itaú BBA, em razão do aumento da receita com operações de renda fixa e de fusões e aquisições, os bônus foram mantidos, de acordo com profissionais da instituição. No Deutsche Bank, os valores também devem ficar estáveis, porque o banco já pagava menos do que a concorrência (os bancos não comentaram).

“Nunca recebi tantas ligações de banqueiros querendo ir para outros setores”, diz Bernardo Cavour, sócio da consultoria de recrutamento Flow Executive Finders. Houve nos últimos tempos defecções importantes. Fabio Bicudo, um dos chefões do Goldman Sachs no Brasil, saiu para assumir a presidência da empresa de energia Eneva.


Na média, os banqueiros ainda ganham muito mais do que os demais mortais, mas a diferença caiu. Em 2007, um executivo de banco de investimento recebia dez vezes mais do que um diretor de empresa. Hoje, ganha quatro vezes mais, segundo estimativas de consultores.

No passado, quando o mercado de capitais passava por momentos complicados como o atual, a reação da cúpula de quase todos os bancos de investimento era cortar e cortar, até que suas equipes tivessem o tamanho exato para atender à demanda. Não é o que está acontecendo agora. As instituições vêm tentando demitir o mínimo possível.

Antes, mandava-se mais gente embora, mas quem ficava continuava recebendo bônus generosos. Hoje, mais funcionários ficam, só que a remuneração caiu. “Aprendemos que, quando as coisas melhoram, o mercado volta rapidamente, e quem não tem equipe perde negócios ou precisa pagar caro para contratar”, diz o diretor de um banco brasileiro.

As demissões nos principais bancos de investimento do país nos últimos 12 meses ficaram entre 10% e 15% — as exceções foram o Barclays, que encerrou a atividade de análise de ações, e o sul-africano Standard Bank, que fechou o banco de investimento no Brasil.

O jeito de administrar as equipes mudou, e o discurso, também. Em vez de uma chance de ganhar dinheiro em poucos meses, os diretores dos bancos de investimento oferecem agora aos recém-contratados “oportunidades de longo prazo”. “Quem trabalha por bônus é pirata”, disse Guilherme Paes, sócio e chefe do banco de investimento do BTG, a um grupo de jovens analistas.

Há, é verdade, um movimento global para dar à profissão um ar menos enlouquecidamente ganancioso. A nova política mundial do Bank of America Merrill Lynch é proibir seus funcionários mais jovens de trabalhar nos fins de semana — a menos que haja um pedido da chefia.

A mudança ocorreu quando um estagiário alemão do escritório de Londres morreu depois de trabalhar por 72 horas sem ir para casa (suspeita-se que ele sofria de epilepsia). Credit Suisse e Goldman avisaram que seus funcionários não devem trabalhar aos sábados.

Com menos dinheiro para oferecer, é natural que a cobrança diminua. Para tentar manter seus profissionais, os bancos estão concedendo benefícios que há poucos anos eram vistos como secundários. O BTG envia um grupo de executivos para um curso de duas semanas na Universidade Harvard.

Outros funcionários com os melhores desempenhos no ano são convidados para um jantar na casa de André Esteves, controlador da instituição. O banco Safra começou a oferecer, em 2013, um prêmio de 20 000 reais em dinheiro aos jovens recém-formados que passassem em seu programa de seleção.


O objetivo é evitar que eles façam todo o treinamento e, depois, decidam ir para um emprego que pague mais. Além disso, em vez de buscar profissionais mais experientes na concorrência para ocupar os cargos vagos, os bancos estão apostando em promoções internas — é mais barato e contribui para manter a equipe motivada.

Neste ano, no Credit Suisse, Fábio Mourão, que era responsável por fusões e aquisições, foi promovido a chefe do banco de investimento no lugar de Allan Libman, que foi transferido para Nova York.

Os bancos também estão enviando seus funcionários para onde há trabalho. Em 2013, analistas do Citi e do Itaú BBA foram fazer operações na Colômbia e no México, onde continua havendo ofertas de ações.

No HSBC, executivos especializados em bolsa e em fusões e aquisições passaram a atuar no mercado de renda fixa, pois a demanda das empresas por emitir títulos de dívida continua existindo (as comissões são menores do que as pagas na bolsa, mas é uma forma de manter o pessoal ocupado e pagar as contas de outras áreas).

Essa é a parte estruturada das mudanças. Há, no entanto, instituições que estão apelando. Alguns bancos estrangeiros começaram a oferecer ingressos para cinema e shows e, dependendo do cargo, serviços de concierge. Outro está comprando sorvete para a equipe toda sexta-feira à tarde, “para ajudar a enfrentar o calor”. E o mau humor.

Ao contrário do que ocorria há alguns anos, agora os bônus são pagos sem alarde. Ninguém reservou camarotes em casas noturnas para comemorar. Corretores no litoral de São Paulo e do Rio de Janeiro, acostumados a receber clientes interessados em comprar imóveis, estão parados.

“Quem me procura só quer alugar casas para temporada”, diz a corretora Renata Cesar, especializada em casas de veraneio e imóveis de luxo. É claro que tudo pode voltar ao que era — se a economia retomar o crescimento e a Bovespa se recuperar.

Mas, num ano em que as atenções de empresários e investidores ficarão divididas entre as eleições e a Copa do Mundo, é difícil encontrar otimistas. As coisas deverão piorar antes de melhorar. O jeito, assim, é aproveitar o sorvete — enquanto ele dura.

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