Jean-Pascal Tricoire: “Quanto mais digital for o mundo, maior será a economia de energia” (Divulgação/Divulgação)
Rodrigo Loureiro
Publicado em 5 de novembro de 2020 às 05h29.
A Schneider Electric não é uma empresa de energia, mas, sim, de tecnologia. É assim que Jean-Pascal Tricoire, presidente global da companhia desde 2006, define o gigante francês que atua com automação, controle e distribuição de energia elétrica em mais de 190 países. Avaliada em mais de 55 bilhões de euros (aproximadamente 357 bilhões de reais), a companhia tem batido recordes de valor de mercado, mesmo após uma queda de mais de 20% no valor de suas ações com o impacto da crise do novo coronavírus durante os primeiros meses da pandemia.
A chave para a recuperação é pautada na transformação digital — algo que a empresa vem promovendo internamente há pelo menos 15 anos e que a permitiu triplicar o faturamento nesse período. “No passado, a Schneider Electric era uma empresa tradicional de energia. Hoje os negócios giram em torno de software, conectividade e dados”, afirma o executivo. Em entrevista exclusiva à EXAME, Tricoire conta como enxerga o mundo no futuro e qual será a importância do uso de energias limpas para uma sociedade mais verde, especialmente numa fase pós-pandemia. “A única maneira de criar uma forma disruptiva de ganhar eficiência é por meio da digitalização”, afirma ele, numa conversa feita por videoconferência do escritório da Schneider em Hong Kong.
Como criar um mundo em que todos utilizem energias renováveis?
Quanto mais digital for o mundo, maior será a economia de energia em uma escala global. Isso passa pelo uso de tecnologias como as redes de telecomunicações 5G, inteligência artificial, big data, além de casas e cidades inteligentes. A transição para veículos elétricos também vai ajudar a duplicar o consumo da eletricidade nos próximos 20 anos. Tudo contribui para o aumento no uso da eletricidade, que é a única forma de descarbonizar a energia. A única maneira de criar uma forma disruptiva de ganhar eficiência é por meio da digitalização.
Como essa mudança afeta o mercado de energia, em especial no que diz respeito à indústria do petróleo?
Diria que o impacto seria mínimo porque o preço do petróleo não muda de acordo com a quantidade de carbono lançada na atmosfera. No nosso caso, não somos uma empresa de curto prazo. A Schneider está na indústria de tecnologia. Quando desenvolvemos um sistema ou serviço para a indústria automotiva ou para a do petróleo e gás, fazemos para torná-las mais eficientes, sustentáveis e produtivas. Hoje somente 6% da energia consumida pela indústria no planeta vem de fontes renováveis. Esse percentual deve chegar a 40% nos próximos 20 anos.
O senhor define a Schneider Electric como uma empresa do setor de tecnologia, e não de energia. Por quê?
Houve uma transformação completa na empresa nos últimos anos, o que a fez triplicar de tamanho. No passado, a Schneider Electric era uma empresa tradicional de energia. Hoje os negócios giram em torno de software, conectividade e dados. Trata-se de levar a digitalização para os nossos clientes de qualquer ramo e tornar a infraestrutura mais eficiente e sustentável.
Qual a importância dessas tecnologias para o setor industrial, um dos principais mercados da Schneider Electric?
Quando falamos da indústria, principalmente no que diz respeito ao que é chamado de indústria 4.0, é preciso ter certeza de que há cada vez mais equipamentos no chão de fábrica que estarão conectados. E que isso será feito graças à aceleração maciço do uso de inteligência artificial e aos avanços das redes 5G. Essas tecnologias estão tornando a conectividade muito mais barata e segura para nossos clientes, que ganham uma gama completa de novos sistemas de controle para gerenciar a operação industrial.
Qual é a importância do mercado brasileiro para a empresa?
O Brasil é o mercado mais importante para nós na América do Sul e continuará sendo ainda por muitos anos, já que o país é uma parte importante da estratégia global da Schneider Electric. O desafio que temos no Brasil é o mesmo que temos no resto do mundo. E não se trata de uma questão de tecnologia. No fim do dia, a transformação é feita por pessoas. É importante que, ao mesmo tempo que desenvolvemos novas tecnologias, também possamos educar as pessoas e investir na formação delas para que continuem a promover a inovação no futuro.
Como a pandemia do novo coronavírus afetou os negócios da Schneider Electric?
A covid-19 forçou a sociedade a rever a forma como o mundo trabalha. Isso foi um acelerador maciço do processo de digitalização. Um exemplo são hospitais que utilizam sistemas de energia da Schneider Electric. Mesmo durante um grande pico de sobrecarga de energia por causa da pandemia do novo coronavírus, esses estabelecimentos continuaram operando e recebendo pacientes. Estamos apenas no começo da transformação digital das empresas.
Qual é o grande aprendizado desta crise?
As pessoas estão passando a perceber que um mero vírus pode fazer com que o mundo inteiro simplesmente pare de uma hora para a outra. Era algo que não tínhamos noção antes que poderia acontecer. E isso gera um sentimento de consciência coletiva. Se um vírus pode fazer isso, as mudanças climáticas podem causar a destruição do planeta. O coronavírus fez com que as pessoas se importassem mais com um futuro mais verde.