Revista Exame

Nem os donos se animam a salvar a construtora Rossi

A Rossi valia, há cinco anos, 5 bilhões de reais. Hoje, vale menos de 230 milhões, tem prejuízos recordes e precisa de dinheiro. Mas não conte com os Rossi

Prédio da Rossi em são paulo: descontos médios de 15%  (Alexandre Battibugli / EXAME)

Prédio da Rossi em são paulo: descontos médios de 15% (Alexandre Battibugli / EXAME)

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Da Redação

Publicado em 18 de abril de 2015 às 05h56.

São Paulo - O sobrenome Rossi é um dos mais tradicionais na construção civil brasileira. A empresa da família, fundada há 35 anos pelos irmãos João e Edmundo Rossi, tornou-se uma das maiores do país na década de 90, depois do sucesso do Plano 100 — em que vendia e financiava apartamentos populares.

A Rossi foi uma das primeiras do setor a captar recurso nas bolsas: abriu o capital em 1997. Como muitas de suas concorrentes, beneficiou-se da euforia em torno do mercado imobiliário na última década. Seu volume de lançamentos anual saltou de 350 milhões de reais, em 2005, para 6 bilhões, em 2011.

No auge do entusiasmo do mercado financeiro com as construtoras, a Rossi chegou a valer 5 bilhões de reais. Cinco anos depois, a construtora vale menos de 230 milhões e precisa de dinheiro — mas os Rossi nem pensam em coçar o bolso para ajudar a empresa que fundaram há mais de três décadas.

Por que tanto desapego? Hoje, o único acionista da família Rossi que continua na construtora é o fundador João, de 79 anos, que tem 12% das ações e controla a empresa. Ele tem seis filhos, e Edmundo, três; e por causa do excesso de herdeiros a família resolveu profissionalizar a gestão anos atrás.

Nos últimos cinco anos, pouco a pouco, os filhos de João e Edmundo abriram negócios próprios e deixaram a companhia — a participação da família, na época, era de 37% e caiu para menos de um terço disso. Os trigêmeos de João tocam negócios próprios.

Guilherme hoje é dono da GR Properties, incorporadora de galpões industriais e logísticos. Seu irmão Rafael é dono da incorporadora residencial Huma, fundada em 2011. Eduardo é sócio dos dois irmãos. O fundador Edmundo vendeu sua participação em 2013 e deixou a empresa com o filho Sérgio e os sobrinhos Eduardo e Rafael.

Hoje, Edmundo administra com os filhos Paulo César e Sérgio a gestora de shopping centers 5R. A empresa que tinha herdeiros demais acabou sem nenhum — e a Rossi nunca precisou tanto dos Rossi.

Enquanto a família partia para outros desafios, a Rossi começou a perder dinheiro. Só no ano passado o prejuízo foi de 620 milhões de reais — o maior entre todas as construtoras de capital aberto. Suas ações caíram mais de 70% nos últimos 12 meses. A margem operacional também foi a pior do setor, de 38% negativos. Pior: analistas preveem que a Rossi continuará perdendo dinheiro por mais algum tempo.

O banco Bradesco projeta prejuízo de 450 milhões de reais neste ano. “A empresa só deve voltar ao lucro em 2017”, afirma o analista Luiz Mauricio Garcia em um relatório divulgado no fim de março. A companhia precisa de caixa para pagar suas dívidas. João Rossi se incumbiu, então, da tarefa de captar dinheiro para a empresa — mas já avisou que não vai tirar de seu bolso.

Há algumas semanas, ele começou a discutir com investidores a possibilidade de um aumento de capital. Foram consultados fundos de private equity, como os americanos Cerberus e Blackstone e o brasileiro Gávea. Há apenas dois anos, a Rossi fez outro aumento de capital, de 600 milhões de reais.

Na época, o dono participou do aumento de capital, e entraram como acionistas fundos de ações da gestora Vinci Partners e o fundo soberano de Singapura GIC. Agora a esperança dos controladores é que a desvalorização cambial estimule investidores estrangeiros a fazer apostas no longo prazo em empresas brasileiras.

Mas as perspectivas para a Rossi e o setor dificultam as negociações. Os recentes prejuízos da companhia podem representar a ponta de uma nova crise no mercado imobiliário.

Ela é consequência daquela primeira, e bem conhecida por quem acompanha as construtoras: o número excessivo de obras tocadas ao mesmo tempo, muitas em locais pouco conhecidos pelas empresas, resultou em descontrole nos custos a partir de 2010. De 2012 para cá, o balanço de empresas como PDG, Brookfield, Gafisa, Tecnisa e Rossi foi para o vermelho — e as ações passaram a cair.

Mas, desde o ano passado, a crise começou a ganhar uma nova cara com o desaquecimento econômico. O problema não é mais na linha dos custos, mas na das receitas. As vendas de imóveis caíram 35% em São Paulo no ano passado, segundo o Secovi, sindicato das empresas do setor.

Com dificuldades para vender e conseguir crédito, as grandes construtoras começaram a fazer liquidações. Os consumidores que já tinham comprado imóveis na planta pensando em revendê-los quando prontos cancelaram a compra, devolvendo os apartamentos para as construtoras.

Muitos compradores viram que não valia a pena ficar presos a uma dívida de 20 anos com preço mais alto se a construtora estava liquidando apartamentos iguaizinhos aos seus. Ao longo de 2014, a Rossi teve mais de 1 bilhão de reais em desistências.

Segundo levantamento do analista Marcelo Motta, do banco JP Morgan, no ano passado as maiores empresas de capital aberto tiveram 4,5 bilhões de reais de contratos cancelados. A estimativa é que neste ano o volume seja semelhante.

“A Rossi é só uma das primeiras a reconhecer o problema”, diz o dono de uma incorporadora concorrente. É um círculo vicioso (não para quem quer comprar seu imóvel, claro): quanto mais liquidações, mais desistências, que levam a mais feirões de imóveis.

Inadimplência

O diretor de relações com investidores da Rossi, Rodrigo Medeiros, diz que o aumento dos cancelamentos faz parte da estratégia da própria empresa para evitar inadimplência mais à frente. A Rossi, segundo ele, está procurando os clientes com problemas potenciais para acelerar o processo de devolução. “A revenda está rápida e geramos 420 milhões de reais de caixa no ano”, diz.

A parte ruim das liquidações é a redução da margem de lucro: a Rossi chegou a ter margem bruta de 20% nos bons tempos, mas em 2014 ganhou apenas 12,5%. A temporada de liquidações deve conti­nuar, já que, de acordo com o Secovi, são mais de 40 000 imóveis em oferta só na região metropolitana de São Paulo.

Se receber de fato um novo aporte, a Rossi deve usar o dinheiro para pagar dívidas de 550 milhões de reais que vencem até o ano que vem e voltar a investir. A companhia também tem vendido terrenos para gerar caixa. O problema é que, nesse processo, a Rossi está encolhendo e, se não voltar a investir, vai diminuir mais.

Não é, certamente, a única que está passando por um momento difícil. A PDG, que já valeu 12 bilhões de reais, vale hoje 620 milhões. Em março, a Vinci, que controla a PDG, anunciou que pretende investir mais 300 milhões na empresa. A Rossi espera encontrar alguém com ímpeto semelhante.

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