Revista Exame

Menos ou mais Estado?

Precisamos de menos Estado que regule a economia e mais Estado que estimule os investimentos privados

Foto: Getty Images /

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Da Redação

Publicado em 7 de maio de 2020 às 05h10.

Última atualização em 12 de fevereiro de 2021 às 13h10.

Nos últimos anos, discutimos como reduzir as disfunções geradas pela exacerbada expansão do Estado em governos anteriores, com reflexos até hoje sentidos nas contas públicas e na produtividade da economia. Veio a crise da covid-19 e já se fala novamente em colapso dos mercados e retorno do protagonismo público para sustentar gastos e investimentos.

Embora as medidas em curso no Brasil coloquem foco em políticas para promover liquidez financeira para as empresas, há um debate relativamente esquecido: como garantir que exista oferta suficiente de produtos e serviços para lidar com a pandemia? Por exemplo, governos já reclamam de falta de leitos em UTIs, máscaras, respiradores e outros produtos essenciais, além do ainda inconclusivo debate sobre como acelerar as pesquisas de vacinas e tratamentos.

Uma visão mais liberal diria que essa expansão de oferta deveria envolver menos Estado. Empresas e entidades filantrópicas em todo o país já se mobilizam para aumentar a oferta de leitos e produtos essenciais. Na lógica de mercado, um aumento de demanda eleva os preços, que então funcionam como sinais poderosos para estimular mais oferta. Contudo, empresários no Brasil e no exterior reclamam de entraves regulatórios para ajustar e remodelar suas fábricas para produzir esses produtos (devem, por exemplo, atender a regramentos da vigilância sanitária local). Nos Estados Unidos havia até mesmo entraves para transportar produtos entre localidades.

Para estimular respostas rápidas à pandemia, não há dúvida de que regras desse tipo devem ser flexibilizadas — pelo menos momentaneamente e talvez até permanentemente no caso de regras muito disfuncionais. Porém, a severidade da crise e a necessidade de gerar respostas coordenadas colocam limites à ação privada descentralizada. No âmbito global, países fazem guerra de preços para adquirir produtos essenciais. No âmbito doméstico, mesmo com a presença de hospitais privados, governos carecem de mais capacidade de internação e tratamento. Como o vírus tem afetado de forma distinta diversas localidades, faltam leitos em alguns municípios e sobram em outros. Bill Gates recentemente declarou que, apesar de ter “grande fé no capitalismo”, os mercados “simplesmente não funcionam adequadamente em uma pandemia.”

Assim, pode parecer à primeira vista contraditório, mas a resposta ao título deste artigo é que precisaremos de mais e menos Estado. Precisamos de menos “Estado regulatório”, colocando restrições burocráticas que limitem a capacidade de resposta do setor privado, e de mais “Estado parceiro estratégico”, que não apenas estimule investimentos privados como também atue em áreas onde há menos retorno e interesse por parte das empresas.

Ações potenciais incluem esforços colaborativos para desenvolver tecnologias de prevenção e tratamento, além de injeções de capital para estimular a realocação da capacidade industrial do país em produtos essenciais e a expansão da infraestrutura estratégica — por exemplo, contratos público-privados para aumentar a oferta de leitos em hospitais e de estrutura de atendimento. Tudo isso guiado por uma estratégia nacional de combate à pandemia, com rápida identificação de casos de escassez de oferta e potenciais áreas de estímulo.

O “mais Estado”, contudo, precisa ter limites e regras bastante claras para que, passada a crise, progressivamente o setor privado consiga retomar suas atividades e investimentos. Nesse sentido, é contraproducente falar neste momento em estímulo estatal para depois da crise. O objetivo agora é minimizar os efeitos da pandemia e garantir a oferta de produtos e serviços críticos. Para evitar o risco de perpetuar apoio estatal permanente e ineficaz, estratégias de saída devem ser elaboradas com cuidado, com marcos e cláusulas de término com base em indicadores de evolução da pandemia e da oferta de infraestrutura para combatê-la.

Em um artigo recente com Aldo Musacchio, nós elaboramos mais esse argumento e apresentamos sugestões de atuação e limites ao Estado. E aproveito para convidar todos para acompanhar nosso blog na EXAME.com que vai cobrir temas ligados a este artigo: como as organizações privadas e públicas podem atuar de forma sinérgica e eficaz para gerar impacto e valor social. Será um prazer ter sua presença no blog!


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