Revista Exame

Mais do que empoderar, investir em empresas de mulheres é lucrativo

Investir em mulheres e negócios feitos por mulheres é mais do que uma questão social — as evidências mostram respaldo econômico e de fortalecimento das companhias. Em suma, é bom para os negócios

Reunião corporativa: maior presença feminina nos negócios poderia gerar 12 trilhões de dólares anuais ao PIB global (Harbucks/Getty Images)

Reunião corporativa: maior presença feminina nos negócios poderia gerar 12 trilhões de dólares anuais ao PIB global (Harbucks/Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 30 de junho de 2022 às 06h00.

Última atualização em 30 de junho de 2022 às 15h14.

Na última década, o “investimento com lente de gênero” (no original em inglês, gender-lens investing — GLI) vem atraindo interesse entre investidores de impacto que buscam promover igualdade de gênero e empoderamento feminino, e com razão. Mas tais estratégias não se resumem a avançar um bem social por si só. Está provado que investir em organizações com diversidade de gênero, empresas de propriedade de mulheres e empresas que atendem às preferências e necessidades das mulheres tem rendido retornos financeiros consideráveis.

Esse resultado duplo representa uma oportunidade rica para todo tipo de investidor — não só aqueles com foco no impacto social. Porém, mitos e enganos continuam a limitar o potencial de crescimento do GLI. Entre os cinco mitos mais comuns, o primeiro é que inclusão e empoderamento feminino são exclusivamente causas sociais, e não uma questão econômica. Na verdade, a evidência da última década mostra claramente que investir em mulheres como clientes e ativos da força de trabalho é bom para as empresas e para a economia.

Por exemplo, em 2015 a McKinsey & Company estimou que, se as mulheres “tivessem um papel idêntico ao dos homens nos mercados de trabalho”, 12 trilhões de dólares poderiam ser adicionados ao PIB global anual até 2025. De modo semelhante, em 2018 o BNY Mellon e a Fundação das Nações Unidas projetaram que fechar a lacuna global de gênero no acesso das mulheres a produtos e serviços financeiros poderia liberar 330 bilhões de dólares em receitas anuais. E, em 2020, o Women’s World Banking descobriu que, entre as empresas de seu portfólio, aquelas com mais mulheres tomadoras de empréstimos experimentaram crescimento 6% maior nos ganhos e ativos e retornos 3% maiores no patrimônio líquido, em média, em relação àquelas com menos mutuários do sexo feminino.

O segundo mito é que uma estratégia GLI não retornará taxas de mercado para os investidores privados. De novo, um crescente corpo de evidências aponta para uma correlação direta entre mais diversidade de gênero e desempenho financeiro superior. Ainda que a empreendedora média receba 935.000 dólares em capital de investimento, ante 2,1 milhões de dólares do empreendedor médio, as empresas fundadas por mulheres entregam o dobro da receita por dólar investido na comparação com as empresas fundadas por homens. Além disso, empresas com forte representação feminina em suas diretorias têm 28% mais probabilidade de superar seus pares, e diversidade de gênero nas equipes executivas aumenta em 25% a chance de ­desempenho superior.

O terceiro mito é que não há projetos adequados o bastante para tornar o GLI uma estratégia de investimento atraente. Isso reflete falta de visibilidade, em vez de falta de oferta. Felizmente, estão surgindo iniciativas da indústria para destacar as oportunidades de investimento focadas no gênero em todo o mundo. Em 2018, por exemplo, as instituições financeiras de desenvolvimento do G7 lançaram o 2X Challenge, um desafio de mobilizar 3 bilhões de dólares para ajudar a capacitar mulheres nos países em ­desenvolvimento.

Mubi, na Nigéria: o Banco Europeu investiu 2 bilhões de dólares em negócios feitos por mulheres na África (Luis Tato/AFP/Getty Images)

Além disso, segundo o projeto Sage 4.0, o número de fundos alocando capital com lente de gênero aumentou de 58 em 2017 para 206 em 2021. Estimativas conservadoras indicam que 6 bilhões de dólares em capital total foram arrecadados para fundos com lente de gênero em meados de 2021. E, no primeiro semestre de 2021, empresas fundadas por mulheres nos Estados Unidos conseguiram mais venture capital do que em qualquer momento da última década. Está claro que não há escassez de projetos adequados — embora eles possam exigir esforços dedicados para ser encontrados.

O quarto mito é que focar o gênero não é operacionalmente importante para o sucesso de uma empresa. Essa alegação é desmentida pelo fato de que as clientes do sexo feminino abrangem um enorme mercado potencial — que poderia responder por cerca de 15 trilhões de dólares dos gastos mundiais do consumidor até 2028. Um relatório de 2018 do Credit Suisse estima que as mulheres respondam por cerca de 40% da riqueza global, representando uma oportunidade amplamente inexplorada de gerar retornos financeiros e sociais.

Um forte compromisso interno com as funcionárias e líderes também pode criar valor para as clientes mulheres. Segundo o think tank Coqual, é provável que equipes entendam até 158% mais seu público-alvo quando seus integrantes representam esses grupos. O mesmo estudo também descobriu que as empresas com uma força de trabalho e uma liderança diversificadas têm 45% mais chances de expandir sua participação de mercado e 70% mais probabilidade de ter capturado um novo mercado no ano passado.

Finalmente, é um mito que GLI é algo restrito demais para ser escalável. Por definição, o GLI se presta a uma variedade de estratégias de financiamento, porque as considerações de gênero podem ser integradas a todos os aspectos de um processo de investimento e colocadas em camadas nas estratégias existentes. Por isso é que cada vez mais investidores com foco em impacto estão ajudando a construir o argumento empresarial para o GLI.

O sucesso da iniciativa SheInvest, do Banco Europeu de Investimento (BEI), ilustra ainda mais o potencial transformador do GLI. Como membro do 2X Challenge (e como o primeiro banco multilateral de desenvolvimento a adotar o critério 2X de investimento de gênero), o BEI mobilizou 1 bilhão de euros (1,1 bilhão de dólares) em GLI no primeiro ano do programa, proporcionando às mulheres africanas melhor acesso às finanças, bem como a serviços e produtos personalizados.

Apesar do crescente apelo e popularidade do GLI, e apesar da crescente evidência em apoio a seus benefícios sociais e econômicos, o campo permanece pequeno em relação a outras estratégias de impacto. Mas há grandes oportunidades a serem construídas em cima do potencial financeiro e social da GLI. A criação do 2X Collaborative, grupo global da indústria que reúne um amplo espectro de investidores para promover o GLI, mostra que o movimento está ganhando corpo. Ao desmascarar mitos e equívocos, podemos incentivar ainda mais investidores de impacto social — além dos investidores convencionais — a integrar considerações de gênero em suas alocações de financiamento.

(Arte/Exame)

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