Governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas: o foco é no estado, e não em uma eventual candidatura presidencial em 2026, garante (Leandro Fonseca/Exame)
Publicado em 22 de agosto de 2024 às 06h00.
Última atualização em 22 de agosto de 2024 às 10h06.
Após a privatização da Sabesp, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) promete dobrar a aposta na modernização da gestão pública e realizar mais concessões e obras de infraestrutura no estado. O chefe do Executivo tem um pipeline de obras que vão para além de seu mandato. “Seguimos pautados por uma visão de estado”, afirma Tarcísio. O governador falou ainda de uma eventual candidatura à Presidência em 2026 — e reiterou que não pretende deixar a cadeira em que está. Leia a entrevista completa.
Em seu segundo ano de governo, o senhor conseguiu cumprir uma promessa de campanha, que foi a privatização da Sabesp. Olhando para a gestão pública no Brasil e a relação entre público e privado, qual é a relevância da privatização da Sabesp para o país?
Primeiro, acredito que a Sabesp consolida o Marco do Saneamento Básico, o que é fundamental. De certa forma, o marco agora se fortalece, e isso permitirá que estados e municípios atinjam a universalização. Todos vão perceber que é essencial cumprir a meta de 2033, e o instrumento que possibilita isso é a atração do capital privado, seja pela estruturação de projetos de concessão, parcerias público-privadas, seja pela privatização de companhias, como foi o caso da Sabesp.
Estamos otimistas, pois esse processo representa a maior descarga de investimento em saneamento básico da nossa história. Serão 68 bilhões de reais na primeira tranche de investimento até 2029, com o objetivo de universalizar o saneamento, alcançando áreas rurais, favelas e núcleos informais. Isso proporcionará um aumento da disponibilidade hídrica e tornará a rede mais resiliente e eficiente. A companhia passa a ter capital, mercado, condição e tamanho. Estamos permitindo que a Sabesp, agora em uma lógica privada, voe.
A Sabesp investiu nos últimos anos uma média de 4 bilhões de reais por ano e agora pretende investir cerca de 11 bilhões anuais. Parece ser um desafio significativo. Por que o senhor está tão confiante em conseguir entregar essa universalização até 2029?
Claro que é um desafio. Primeiro, o modelo foi estabelecido com um sócio de referência de alta qualidade e uma empresa sólida, que gera uma margem Ebit-da de 10 bilhões a 11 bilhões de reais por ano, com 60% disso virando caixa. Além disso, temos um parceiro com acesso ao mercado de capitais. Do ponto de vista de capital, fazer os 68 bilhões de reais até 2029 não é um problema, já que mais da metade desse dinheiro sairá da própria geração de caixa da Sabesp.
O desafio será a execução física das obras, mas a empresa foi estruturada ao longo do tempo para isso. Muitas mudanças foram feitas, como centralização por especialidades, mudanças nos processos de compra, e a empresa ingressou na autoprodução de energia. A gestão de fornecedores também mudou, com processos mais ágeis e contratações mais rápidas. Tudo isso nos dá uma grande esperança de atingir a universalização até 2029.
O valor final da oferta ficou em torno de 68 reais por ação, mas no dia em que o valor veio a público, a ação estava mais alta. Houve certa compreensão sobre se o governo teria deixado dinheiro na mesa nesse processo de privatização. O governo deixou dinheiro na mesa?
Não. O governo ganhou dinheiro, e bastante. Precisamos entender o processo como um todo. De 2021 até o dia do anúncio do investidor de referência, a ação valorizou 140%. Se olharmos os resultados, no início do meu mandato, em 2023, a empresa valia 34 bilhões de reais. Vendemos 32% por 14,8 bilhões de reais, e a parcela remanescente vale hoje 12 bilhões de reais. Isso significa que saímos de 17 bilhões para 26,8 bilhões de reais. Ganhamos 10 bilhões de reais em um ano e meio, e a empresa continuará a valorizar com os investimentos e ganhos de eficiência.
Governador, o senhor mencionou os recursos arrecadados com a privatização. Existe algum grande projeto que o governo está planejando para esse recurso?
Sim. Dos 14,8 bilhões de reais, 30% vão para o fundo de apoio à universalização, que foi criado para segurar a tarifa. Com o dinheiro remanescente, mais de 10 bilhões de reais, vamos investir em despesas de capital, como a expansão do metrô, trens intercidades, e o maior programa habitacional de todos os tempos em São Paulo, com mais de 200.000 moradias até 2026.
Como o senhor vê a aprovação do projeto de renegociação da dívida dos estados no Senado?
O grande objetivo foi alcançado na votação, que é a diminuição dessa taxa de juro. É o IPCA +4% que vai passar a ser IPCA +2%. Obviamente, tem contrapartidas. Uma parcela desse valor passa a ser, por exemplo, investida no ensino técnico e também em infraestrutura. Ora, isso é interessante porque uma parcela do juro eu vou poder transformar, converter em investimento. Isso é bom para o estado de São Paulo, que passa a ter um dinheiro carimbado para fazer despesa de capital. Isso é bom para o Brasil também, porque a despesa de capital realizada aqui, em grande medida, vai ser distribuída para o país inteiro. Isso proporcionará um fôlego financeiro de cerca de 5,8 bilhões de reais por ano para despesas de capital.
Sobre o ajuste fiscal, o senhor mencionou cortes de custeio, redução de despesas de pessoal e a renegociação da dívida. Pode falar um pouco mais sobre as concessões e privatizações que estão previstas?
Além das medidas de corte de custeio e renegociação da dívida, estamos avançando com concessões e privatizações. No segundo semestre, faremos concessões como a Sorocaba 1 e 2, as linhas 1, 2 e 3 do metrô, as linhas 11, 12 e 13 da CPTM, e a linha 10 da CPTM. Também temos a privatização do trem Sorocaba-São Paulo, PPP das escolas, a Rota Sorocabana, a Nova Raposo e a concessão das loterias de São Paulo. Além disso, estamos revisando benefícios tributários.
Temos um gasto tributário de aproximadamente 72 bilhões de reais por ano, e aqui temos muito espaço para obter ganhos. Fizemos um primeiro exercício agora em abril, quando um terço dos benefícios que venceram não foi renovado, gerando uma receita adicional de quase meio bilhão por ano. No total, temos 207 benefícios que vencerão em dezembro e estão sendo analisados. A expectativa é que possamos obter um ganho significativo, que permitirá aumentar a capacidade- de investimento do estado.
As últimas pesquisas de opinião mostram um aumento na sensação de insegurança, apesar de os dados indicarem uma queda nos roubos e furtos. Quais são as medidas que o governo está implementando para combater a criminalidade, especialmente o crime organizado?
Sem dúvida, nós temos um grande problema, que é a ação do crime organizado, e só se combate crime organizado se a gente conseguir unir forças. Então, a inteligência e a coordenação com outros entes são fundamentais. A gente vai fazer investimentos pesados na área de inteligência, até porque é preciso ter condição de processar uma série de dados que hoje são gerados por sensores que não só governos, prefeituras colocaram, mas também a iniciativa privada.
Se a gente conseguir organizar todas essas informações no ambiente de nuvem, tratar com inteligência artificial, eu vou dispor melhor o efetivo nas ruas. Então, eu vou conseguir definir determinados padrões de comportamento criminoso e combater a mobilidade criminal. Isso é uma coisa fundamental, e nós estamos investindo pesadamente nisso. Nós vamos fazer o maior investimento em tecnologia da nossa história, fora o aumento de efetivo.
Existe uma figura no imaginário popular que é de dois caras numa moto. Há algum planejamento para lidar exatamente com esse tipo de crime de assalto à mão armada e roubo de celular com pessoas que estão em motos?
Sim, estamos investindo em inteligência para identificar padrões de comportamento criminoso, o que nos permitirá agir de forma mais rápida e eficaz. A inteligência artificial será uma aliada importante nesse processo. Também estamos focados em mudanças na legislação penal e de processo penal, como o endurecimento de penas para crimes cometidos em nome de facções criminosas. Essas medidas aumentarão o custo do crime, tornando-o menos atrativo.
São Paulo teve queda na educação básica, segundo o IDB. Como o senhor avalia isso?
Sobre educação, o resultado do IDB era esperado, considerando a implementação abrupta do novo ensino médio. Houve uma desorganização na rede, com alguns alunos ficando sem disciplinas importantes. Estamos atuan-do na alfabetização na idade certa, capacitando professores e incentivando municípios que apresentam melhor desempenho. Também estamos focados na recuperação do aprendizado e na capacitação contínua dos professores, além de expandir as escolas de tempo integral.
O senhor é colocado como um dos nomes presidenciáveis para 2026, mas já respondeu várias vezes que não está pensando na próxima eleição. A minha pergunta é: se o ex-presidente Jair Bolsonaro escolher o senhor para ser o candidato da direita em 2026, o senhor vai aceitar?
Tenho muita consideração pelo presidente Bolsonaro, mas às vezes é necessário dizer não, mesmo para um amigo. Temos um projeto de longo prazo aqui em São Paulo, e muitos projetos que estamos estruturando hoje só ficarão prontos em 2028, 2029, ou até depois. Seguimos pautados por uma visão de Estado. Nosso foco é continuar entregando resultados para o estado de São Paulo.