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Da Redação
Publicado em 13 de setembro de 2011 às 19h04.
Quem desembarca no Aeroporto Internacional Tom Jobim, no Rio de Janeiro, não é recebido apenas pelos braços abertos do Cristo Redentor sobre a Guanabara, mas também por um monumento ao desperdício do dinheiro público: a Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) da Alegria, instalada no caminho de saída do aeroporto.
Um ano depois de pronta, a unidade, em que foram despejados 136 milhões de reais, opera com apenas 30% da capacidade e sintetiza os problemas que atrasam -- agora em sete anos -- o desfecho do programa de despoluição da baía de Guanabara, um dos mais belos cartões-postais cariocas.
É também um exemplo acabado de como muitas obras de infra-estrutura fundamentais são planejadas e executadas no país. Ao longo de uma década, a ETE da Alegria foi inaugurada quatro vezes e, mesmo assim, está ociosa. Inacreditável é o motivo do subaproveitamento da estação -- ficou faltando fazer uma rede para coletar esgoto domiciliar na cidade.
Ou seja, a sujeira simplesmente não consegue chegar ao local de tratamento e termina despejada nas águas da baía. "O fracasso na despoluição é um desastre ambiental e social", diz o geólogo Elmo Amador, coordenador do Movimento Baía Viva. "Por enquanto, os resultados são pífios."
A obra é a mais importante de um conjunto de estações de tratamento de esgoto orçado em 1 bilhão de dólares, do qual 856 milhões já foram desembolsados pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento e pelo Japan Bank for International Cooperation. Prevista desde a década de 50, a despoluição da baía de Guanabara começou em 1994 e deveria terminar em 1999.
Mas sofreu com disputas políticas, inoperância administrativa e megalomania dos sucessivos governos. Inicialmente, o sistema deveria processar 25% dos dejetos lançados na baía. O bom momento econômico vivido no país após o lançamento do Plano Real, em 1994, estimulou o governo do estado a ampliar o programa, dobrando as metas para tratar 58% do esgoto.
A decisão desencadeou uma série de alterações, que acabaram comprometendo o calendário e o orçamento. Ruas de terra recém-asfaltadas tiveram de ser quebradas para que a Cedae, companhia de água e esgoto do Rio, instalasse novas tubulações. A obra também ficou prejudicada pela absoluta falta de planejamento.
Por incrível que pareça, reservatórios de água para usar na filtragem foram construídos sem ligação com a rede de distribuição de água e estão abandonados. Muitos acabaram ocupados por traficantes. Para completar, uma CPI da Assembléia Legislativa apontou acréscimos irregulares de mais de 300 milhões de reais nos contratos com empreiteiras, propôs o indiciamento de 12 funcionários públicos e provocou a abertura de 15 inquéritos pelo Ministério Público estadual. Por enquanto, ninguém foi punido.
Após a desvalorização do real, em 1999, o projeto ampliado ficou caro demais. Até hoje o governo fluminense deve 120 milhões de dólares em contrapartidas acertadas com os bancos de fomento -- dinheiro que, nas contas da Cedae, seria suficiente para concluir o programa. Para Luiz Paulo Conde, vice-governador e secretário estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano, o programa já devia ter sido dado por encerrado.
"O maior problema da Guanabara não é mais o esgoto, e sim o lixo", diz Conde. Números do próprio governo mostram outra realidade. Atualmente, a baía recebe 16 000 litros de esgoto por segundo, volume que em uma semana equivale a duas lagoas Rodrigo de Freitas. Apenas 25% são tratados. A mais nova promessa da Cedae é concluir as obras em 2009. Ainda que desta vez ela seja cumprida, a despoluição da Guanabara entra para a história como sendo um dos mais arrastados -- e mal planejados -- programas do gênero em todo o mundo
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