Loja de eletrônicos: competição desigual com os coreanos (Alexandre Battibugli/EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 3 de janeiro de 2013 às 08h03.
São Paulo - O empresário Affonso Brandão Hennel, de 83 anos, voltou há algumas semanas a dar expediente na Semp Toshiba. Há 70 anos, ainda adolescente, ele ajudou o pai a criar a Semp, na época uma pequena fabricante de eletrônicos (a sigla significa Sociedade Eletromercantil Paulista).
Décadas depois, a empresa fez uma parceria com a japonesa Toshiba e se transformou numa das líderes do mercado brasileiro de TVs e aparelhos de som. Seus comerciais, aqueles que diziam que “os nossos japoneses são melhores que os outros”, marcaram os anos 80 e 90.
Mas o mercado brasileiro mudou — e os tempos de glória da Semp Toshiba teimam em não voltar. Depois de faturar 2,2 bilhões de reais em 2007, a empresa fechou 2011 com receita 36% menor, de 1,4 bilhão de reais. Também no ano passado teve o primeiro prejuízo de sua história, de 20 milhões de reais.
Os mais otimistas esperavam uma reversão da tendência. Mas não é o que vem acontecendo. De acordo com estimativas de cinco funcionários ouvidos por EXAME, o cenário deve ser pior: receita de 1,3 bilhão de reais e prejuízo de 30 milhões. Procurada, a empresa, que não quis conceder entrevista para esta reportagem, disse que os números são “imprecisos”, mas não deu uma previsão para o ano.
A sucessão de resultados decepcionantes causou uma reação inesperada por parte de Hennel. Ele interrompeu o descanso de 13 anos e, desde outubro, voltou a frequentar reuniões na empresa, hoje comandada por seu filho, Afonso Antonio Hennel.
A Semp Toshiba vive um desafio comum a outras fabricantes brasileiras de eletrônicos. Com custos de fabricação elevados e um investimento em inovação que não se compara ao das gigantes do setor, as empresas nacionais viraram alvos fáceis para as concorrentes coreanas, como LG e Samsung. Até mesmo a holandesa Philips, tradicional empresa do setor, desistiu de competir e saiu do mercado de televisores. Nesse contexto, marcas relevantes no cenário nacional sucumbiram.
Foi o caso da Gradiente, que em 2006 registrou seu maior faturamento, de 1,5 bilhão de reais, mas no ano seguinte interrompeu a produção por causa de uma dívida de 300 milhões de reais. A marca foi relançada em maio. A CCE, por sua vez, foi vendida para a chinesa Lenovo em setembro de 2012. “O desempenho fraco na Europa e nos Estados Unidos fez com que as asiáticas investissem no Brasil. Era natural que as brasileiras perdessem terreno”, diz Bruno Freitas, gerente de pesquisa da consultoria IDC Brasil.
Segundo executivos, ex-funcionários e varejistas ouvidos por EXAME, a empresa tem tido dificuldade de se adaptar às novas circunstâncias do mercado. Afonso Antonio Hennel é conhecido como um empresário centralizador. Todas as decisões, da política comercial à compra de computadores para escritórios, passam por sua mesa.
De 2008 para cá, ele extinguiu duas das três vice-presidências, o que centralizou ainda mais as decisões. Durante muito tempo, esse estilo deu certo. Mas, com o avanço das fabricantes coreanas e seus custos imbatíveis, o modelo de gestão tem custado caro. De acordo com ex-diretores da empresa, Hennel se recusa a cortar suas margens de lucro, dar verbas publicitárias para varejistas ou conceder prazos de pagamento mais camaradas.
O resultado é que a marca está sumindo das prateleiras. Já não se encontram produtos da Semp Toshiba na Casas Bahia (maior varejista do ramo) há quatro anos. Walmart, Carrefour e Lojas Americanas também pararam de vender a marca em alguns períodos dos últimos anos.
Segundo o relato de executivos de cada uma dessas redes, a situação é consequência direta da inflexibilidade da Semp. “Os produtos da empresa custam exatamente a mesma coisa de seus pares coreanos”, diz o diretor de compras de uma varejista. Assim, os comerciantes não podem usar a marca para fazer promoções e atrair público para as lojas. Marcas como a chinesa AOC, de TVs, e Positivo, de computadores, acabam se tornando mais baratas no mercado, “ensanduichando” a Semp Toshiba.
Os maus resultados dos últimos anos foram consequência da decisão de enfrentar os asiáticos de igual para igual. A STi, marca de computadores da Semp Toshiba, tinha muito espaço no mercado ao vender lotes de máquinas para grandes empresas. As vendas chegaram a 740 milhões de reais em 2007.
A partir daí, a marca passou a ser usada para ganhar espaço no varejo com o consumidor individual, onde o reinado é das asiáticas. Para isso, a Semp Toshiba dobrou o número de funcionários para 3 400 e investiu pesado em marketing. Mesmo assim, as vendas caíram para 400 milhões no ano passado. Com custos maiores, a margem foi embora.
Para recuperar terreno, os Hennel devem ampliar a parceria de 35 anos com a Toshiba. Uma opção estudada é fabricar notebooks com a marca Toshiba no Brasil. Talvez a melhor opção para competir com os coreanos seja aproveitar cada vez mais a tecnologia dos vizinhos japoneses. Aos 83 anos, Affonso Brandão Hennel estará lá para ver se a estratégia dará certo ou não.