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E o restante do Brasil?

As eleições de 2012 acabaram se resumindo a uma questão: se Lula “ganhou” ou “perdeu”. Com uma vitória em São Paulo, ele seria o grande vencedor do pleito: uma “resposta do povo” às condenações do mensalão


	Fernando Haddad e Lula: derrotas em outras grandes cidades não são levadas em conta
 (Ricardo Stuckert/Instituto Lula)

Fernando Haddad e Lula: derrotas em outras grandes cidades não são levadas em conta (Ricardo Stuckert/Instituto Lula)

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Da Redação

Publicado em 22 de novembro de 2012 às 10h18.

São Paulo - O Brasil tem eleições de dois em dois anos e, segundo sempre se ouve, trata-se de coisa muito boa, porque, quanto mais vezes o povo votar, mais instruído ele ficará na tarefa de escolher seus governantes.

Isso vem sendo feito regularmente há mais de 30 anos, desde 1982, e os resultados práticos ainda não puderam ser percebidos com muita clareza — o que sugere que o processo de ensinar o brasileiro a votar multiplicando a quantidade de eleições pode ser muito bem-intencionado, mas demora um colosso de tempo para chegar aos objetivos desejados.

Espera-se, claro, que as coisas melhorem um dia, mas enquanto isso o jeito é ir levando a vida como ela é, da mesma forma como se aceitam os dias de chuva e os dias de sol.

É um ponto de vista, sem dúvida. Mas a espera poderia ser muito mais fácil, e provavelmente mais produtiva, se o mundo político brasileiro vivesse com um pouco mais de calma essa situação — ao invés de ficar em estado de excitação ex­tre­ma diante de qualquer eleição que apareça pela frente, como ocorre hoje, com o entusiasmado e maciço incentivo da mídia.

Tudo bem que nas eleições gerais realizadas a cada quatro anos o nível de adrenalina vá para o alto — afinal, ali se escolhem o presidente da República, todos os governadores de estados, a Câmara dos Deputados e as Assembleias Legislativas estaduais, além de uma penca de senadores. Mas fazer um barulho quase igual nas eleições municipais, que ficam no meio do caminho entre uma eleição nacional e a próxima, é com certeza muita vela para mau defunto.

É precisamente o que está acontecendo agora, nestas eleições de 2012 — uma sucessão de ataques de nervos, guerras nucleares nos discursos de palanque e a repetição, por parte da maioria dos envolvidos, de que o futuro do “país” está sendo decidido justamente agora. 

A presidente da República esquece que sua obrigação constitucional, republicana e moral é servir ao conjunto da população brasileira, e não aos interesses de seu partido — em vez de ater-se a seu dever de neutralidade, está interferindo diretamente, sem a menor cerimônia, nas miudezas das campanhas para eleger prefeitos de municípios, uma questão 100% estranha a suas funções.


Os candidatos, de todos os partidos, repetem posições vazias sobre os assuntos de interesse para suas cidades (“vou cuidar da educação” etc.) e, na maioria dos casos, se jogam de cabeça na baixa política nacional de alianças, negócios entre partidos, partilha de cargos e por aí afora.

Mais do que tudo, transformou-se em figura número 1 das eleições um personagem que não foi candidato a nada: o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que definiu as eleições decididas no último fim de semana como um fenômeno de importância suprema para o Brasil e para sua própria liderança política.

O resultado é que estas eleições de 2012, com 450 000 candidatos e a escolha de prefeitos e vereadores em cerca de 5 500 municípios, acabaram se resumindo a uma única questão para o mundo político brasileiro: se Lula “ganhou” ou “perdeu”. Pior ainda: segundo o próprio Lula e o PT, só interessou, na verdade, o resultado da eleição em um desses milhares de municípios: São Paulo. 

Ganhando o candidato construído por ele, como foi o caso de Dilma Rousseff em 2010, Lula seria o grande, ou mesmo o único, vencedor do pleito municipal em todo o país. Seria a prova definitiva de que é ele quem continua mandando. Seria a “resposta do povo” às condenações do mensalão.

Seria um atestado de “nada consta” no prontuário do PT e em sua própria ficha — e por aí segue esse ioiô de fantasias que tanto atraem a crônica política no Brasil. Mas e as derrotas de Lula e do PT em capitais de primeira importância, como Belo Horizonte, Recife e Porto Alegre, logo no primeiro turno? E a vitória decisiva do prefeito Eduardo Paes no Rio de Janeiro, que o PT põe em sua coluna de ganhos, mas só interessa ao próprio Paes? E o resto do Brasil — não existe mais?

É melhor, para todo mundo, baixar a ansiedade.
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