Revista Exame

Da expectativa à realidade

Mark Machin, presidente do fundo CPPIB, vê muitas oportunidades em infraestrutura no Brasil, mas diz que é preciso avançar com projetos de privatizações

Mark Machin: “O investimento em infraestrutura não termina nunca” (Omar Paixão/Exame)

Mark Machin: “O investimento em infraestrutura não termina nunca” (Omar Paixão/Exame)

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Fabiane Stefano

Publicado em 4 de julho de 2019 às 05h46.

Última atualização em 8 de julho de 2019 às 15h03.

inglês Mark Machin, presidente do fundo CPPIB, gere 280 bilhões de dólares do Plano de Pensão Canadense (CPP), um dos maiores do mundo. Atualmente, ele mantém um olho num presente bem conhecido e outro num futuro que ainda nem conhecemos. Ao mesmo tempo que avalia oportunidades e riscos em infraestrutura, Machin discute o impacto que tecnologias como carros autônomos e drones podem ter nos negócios. Com cerca de 18 bilhões de reais investidos no Brasil, o fundo pode até triplicar a aposta por aqui. “Não consigo pensar em outro país que tenha tantas oportunidades”, diz Machin.

Hoje, a atuação do CPPIB no Brasil é concentrada em ativos imobiliários, como prédios corporativos e shoppings, em parceria com sócios locais, como a construtora Cyrela. No ano passado, o fundo entrou no ramo de energia ao arrematar, junto com a Votorantim Energia, a estatal Companhia Energética de São Paulo, por 1,7 bilhão de reais. Em visita a São Paulo, Machin falou à reportagem de EXAME.

O Brasil tem uma enorme demanda por infraestrutura. Como o fundo CPPIB vê o mercado brasileiro?

Nas primeiras vezes que vim ao Brasil, há cerca de cinco anos, as pessoas me diziam que o país não poderia crescer mais do que 2% ao ano porque a infraestrutura não daria conta do aumento de demanda e a inflação dispararia. Mas isso está mudando. A quantidade de ativos para infraestrutura que vêm sendo oferecidos ao setor privado, tanto nacional como internacionalmente, é muito maior hoje. Há oportunidades em estradas, portos, hidrovias, aeroportos e, especialmente, em energia renovável. O Brasil tem enormes vantagens com a geração de energia hidrelétrica, solar e eólica, em comparação com países desenvolvidos, que dependem de energia nuclear, carvão ou petróleo. Não consigo pensar em outro país que tenha tantas oportunidades.

O que mudou nestes cinco anos?

As perspectivas de reformas estruturais, o foco na produtividade e os projetos de concessões e de privatizações estão realmente atraindo capital privado. Há uma expectativa de dobrar o investimento em infraestrutura de 2% para 4% do PIB. E não dá para fazer isso sem capital privado. A perspectiva, porém, tem de se tornar realidade. Quando isso acontecer, o nível de investimento aumentará muito. Até 2025, o CPPIB poderá alocar até 60 bilhões de reais no Brasil, mais que o triplo do volume já investido. Definitivamente, as perspectivas do país melhoraram em relação a dois ou três anos atrás.

A recuperação lenta afeta os planos de investimento no Brasil?

Não nos importa o próximo trimestre ou o próximo ano, pois o que interessa é o retorno no longo prazo, que assegure aposentadorias nas décadas seguintes. É fato que não há projetos de infraestrutura suficientes para o capital disponível no mundo. É verdade também que a maioria dos investidores internacionais dá como certa a aprovação de reformas estruturais no Brasil, sobretudo a da Previdência. Se ela não ocorrer, isso será visto como um retrocesso. E, talvez, tenhamos de rever nossos planos para o Brasil.

A instabilidade política nos países emergentes não é um risco para quem depende de rentabilidade de longo prazo?

Em qualquer democracia, há alternância nos ciclos políticos. Portanto, o fundamental para a infraestrutura é ter regimes regulatórios e tributários confiáveis, e que independam do ciclo eleitoral. Caso contrário, o risco se torna muito alto. Isso vale para mercados emergentes e também para desenvolvidos. As pessoas subestimam os riscos nos países ricos. A maior perda que já tivemos em infraestrutura, globalmente, foi na Noruega. Investimos em um gasoduto lá em 2013 e, meses depois, o governo diminuiu as tarifas em 90%, embora tenha dito de antemão que não faria isso.

Os governos têm o direito de mudar de ideia, mas contestamos a decisão na Suprema Corte do país. No final, perdemos porque foi alegado que o governo poderia fazer aquilo. Obviamente, vamos nos lembrar disso quando quisermos comprar qualquer outra coisa na Noruega. Ou seja, há risco em todo mercado. E os países que precisam de capital, algo que, talvez, seja menos importante para a Noruega hoje, têm de preservar sua reputação.

Em quanto tempo o Brasil poderia ter uma infraestrutura moderna?

Nos próximos cinco a dez anos veremos um significativo aumento na taxa de crescimento potencial em razão dos investimentos que estão sendo esperados no Brasil. Isso trará mais produtividade e mais geração de riqueza. No entanto, esse é um trabalho que não termina nunca. Os Estados Unidos e a Europa precisam fazer pesados investimentos em infraestrutura. As pontes quebram e as estradas necessitam de reparos. Além disso, há novas tecnologias e é preciso construir as redes de fibra óptica para o mundo digital.

De que forma as inovações disruptivas, como os carros autônomos, vão impactar a infraestrutura no mundo?

Os veículos autônomos virão — provavelmente muito antes do que se espera — e devem melhorar o fluxo de tráfego nas áreas urbanas, podendo tornar as coisas mais eficientes. Mas esse é um desafio para todo e qualquer país. O Brasil, assim como vários outros emergentes, tem a chance de dar um salto adotando as novas tecnologias e, assim, avançar mais rapidamente. Como investidores de longo prazo, também precisamos estar conscientes das forças disruptivas, não apenas daquilo em que investimos hoje mas de tudo o que temos no portfólio. Carros autônomos vão aumentar a receita das rodovias pedagiadas? E qual será o impacto dos drones no transporte de cargas? Tudo isso vai mudar a infraestrutura no futuro.

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