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Crise política ameaça empresas que conseguiram reduzir dívidas

Empresas listadas começaram a reduzir as dívidas, segundo uma pesquisa feita para MELHORES E MAIORES. Mas novo cenário pode complicar tudo outra vez

Vale: a empresa entrou no que chama de segunda onda de competitividade (Germano Luders/Exame)

Vale: a empresa entrou no que chama de segunda onda de competitividade (Germano Luders/Exame)

RS

Raphaela Sereno

Publicado em 5 de junho de 2017 às 05h55.

Última atualização em 5 de junho de 2017 às 05h55.

São Paulo — economia brasileira recentemente deu sinais de que estaria deixando para trás a pior recessão de sua história. O indicador do nível de atividade do Banco Central — uma prévia do resultado do produto interno bruto — teve avanço de 1,1% de janeiro a março em relação ao primeiro trimestre do ano passado. No mundo real, as empresas sentiram um alívio depois de realizar uma série de ajustes para lidar com a queda da receita, como corte de custos, demissões e vendas de ativos. Em março, a dívida bruta do conjunto das companhias de capital aberto no Brasil caiu para 1,2 trilhão de reais — queda de quase 15% em relação ao recorde de setembro do ano passado. A estimativa foi feita pela consultoria Economatica em um levantamento realizado para a edição de MELHORES E MAIORES 2017.

Mas uma nuvem de incertezas voltou a surgir em razão da delação premiada dos donos da empresa de bens de consumo JBS que atingiu o presidente Michel Temer e uma extensa lista de políticos. Logo após as revelações, o Ibovespa, principal índice da bolsa de valores brasileira, caiu quase 9%, e o dólar subiu 8%. Uma alta acentuada da moeda americana, por si só, tem um impacto negativo nas finanças de muitas empresas. “Boa parte da dívida das companhias listadas em bolsa é atrelada ao dólar”, diz Einar Rivero, gerente de relacionamento institucional da Economatica. “O cenário de volatilidade e alta do câmbio exigirá uma gestão mais cuidadosa das finanças dessas empresas.”

No topo do ranking das companhias brasileiras mais endividadas, figuram a estatal Petrobras e a mineradora Vale. Na Petrobras, a dívida bruta atingiu,  em março, 365 bilhões de reais, uma queda de 85 bilhões de reais em 12 meses. Entre os ajustes feitos pela estatal para reduzir sua dívida estão a mudança na política de preços de combustíveis, que passaram a seguir os valores praticados no mercado internacional. A companhia, além disso, lançou um plano de demissão voluntária, cortou investimentos e despesas e preparou um plano de venda de ativos. Já a dívida da Vale caiu para 94 bilhões de reais em março. A mineradora também reduziu custos e vendeu ativos, além de ter se beneficiado com a alta do preço do minério de ferro. A JBS ocupa o terceiro lugar entre as companhias brasileiras de capital aberto mais endividadas e viu sua situação se complicar ao se tornar alvo das operações Carne Fraca e Lava-Jato. “A JBS tem dívida elevada, principalmente em razão da série de aquisições feitas ao longo dos últimos anos e da redução da geração de caixa no período”, diz Vitor Suzaki, analista da corretora Lerosa.

No ranking da Economatica aparecem outras companhias exportadoras dos setores de alimentos e de papel e celulose. De acordo com os analistas, embora tenham grande parcela da dívida vinculada ao dólar, essas empresas contam com um hedge (proteção ao risco de oscilação cambial) natural, uma vez que parte de suas receitas é obtida em moeda estrangeira. Para o economista Luiz Rabi, da empresa de análise de crédito Serasa Experian, se o dólar se mantiver no patamar de até 3,30 reais, não haverá grande impacto nas finanças das empresas brasileiras. “O Banco Central ainda tem muita bala na agulha para estabilizar o câmbio”, afirma Rabi. Além disso, o investimento estrangeiro direto está crescendo e as exportações têm avançado. O problema será se houver uma interrupção na retomada do crescimento da economia, com um efeito negativo no fluxo de caixa das empresas. Segundo um levantamento da Serasa, o número de empresas inadimplentes e com o nome sujo na praça atinge 4,9 milhões — o que representa mais de 50% das companhias em operação no país. 

Se a instabilidade política se prolongar, a já debilitada saúde financeira das empresas brasileiras poderá se complicar mais. De acordo com uma pesquisa realizada no final do ano passado pelo Centro de Estudos do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais, 46% das companhias não financeiras de capital aberto não conseguiam gerar caixa suficiente para cobrir as despesas financeiras. Seis meses antes, 52% das empresas se encontravam nessa situação. “Apesar da melhora, o quadro do endividamento das empresas continua preocupante”, diz Carlos Antonio Rocca, diretor do centro de estudos do Ibmec. Em outras palavras, a incipiente recuperação dos indicadores econômicos — e da situação de muitos negócios — pode estar de volta à zona de risco.

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