Revista Exame

A Copa do Mundo das marcas

Na África do Sul, Nike e Adidas batalham pela supremacia no mercado de futebol - mas sempre há o risco de dar zebra

O português Cristiano Ronaldo, patrocinado pela Nike: os americanos avançam (Paul Gilham/Getty Images)

O português Cristiano Ronaldo, patrocinado pela Nike: os americanos avançam (Paul Gilham/Getty Images)

DR

Da Redação

Publicado em 18 de fevereiro de 2011 às 11h38.

Que empresa vai ganhar a próxima Copa do Mundo? Os puristas não se conformam, e com certa razão até, mas essa é uma pergunta que ganha mais sentido a cada quatro anos: a Copa do Mundo da África do Sul não será apenas uma disputa entre as melhores seleções do planeta, mas também uma batalha entre seus patrocinadores pela supremacia no bilionário mercado de futebol. Dentro de campo, os candidatos ao título são as seleções mais tradicionais, entre elas Brasil, Argentina, Alemanha, Inglaterra e Espanha. Entre as empresas, porém, há apenas dois favoritos: a alemã Adidas e a americana Nike, as duas maiores fabricantes de material esportivo do mundo. As empresas fornecem uniformes às maiores seleções do torneio e patrocinam suas principais estrelas. Do lado da Nike, estão Brasil e Inglaterra, além de jogadores como Robinho, o inglês Wayne Rooney e o português Cristiano Ronaldo. Do lado da Adidas, as seleções de Alemanha, Argentina, França e Espanha e os craques Kaká e Lionel Messi, argentino considerado o melhor do mundo em 2009. Os americanos patrocinarão nove das 32 equipes que vão disputar a Copa; os alemães, 12.

Para uma miríade de empresas, inclusive as que nada têm a ver com futebol, a Copa representa uma oportunidade única para aparecer (veja quadro na pág. 80). Nenhum evento esportivo, afinal, atrai tanta atenção: o comitê organizador calcula que a audiência acumulada do torneio será de aproximadamente 30 bilhões de telespectadores. Só a final da Copa de 2006, na Alemanha, foi vista por 715 milhões de pessoas. Mas é para Nike e Adidas que essa atenção toda traz mais chances de render dinheiro. De acordo com a consultoria americana NPD, as vendas anuais de artigos relacionados a futebol somam 10,8 bilhões de dólares. E, naturalmente, em ano de Copa as vendas disparam: a venda de camisetas de seleções, por exemplo, costuma crescer mais de 30%. Na briga entre Nike e Adidas, os alemães dão a largada com uma vantagem e tanto - a empresa é a patrocinadora oficial do evento, e seu logotipo estará estampado em cada bola, em placas espalhadas pelos gramados e no uniforme dos árbitros. Tamanha exposição custa caro. Em 2005, a Adidas renovou seu contrato com a Fifa por 350 milhões de dólares, garantindo o posto até a Copa de 2014, no Brasil. Embriagado pelos dólares alemães, o presidente da Fifa, Joseph Blatter, anunciou na época que a Adidas e o futebol haviam se tornado "uma coisa só".


 É verdade que os alemães lideram há décadas o mercado de futebol, mas a Nike tem diminuído a distância numa velocidade impressionante. Em 1994, a empresa faturou míseros 40 milhões de dólares com a venda de artigos relacionados ao esporte. Foi quando decidiu transformar o segmento em prioridade. Hoje, estima-se que as receitas cheguem a 1,7 bilhão de dólares. Nos últimos anos, o desafio imposto pela Nike se tornou ainda mais evidente. Em 2006, os americanos tentaram roubar dos rivais a seleção alemã. A oferta acabou recusada, poupando a Adidas do vexame de ter o time nacional patrocinado pela Nike. No ano seguinte, a Nike comprou a fabricante de material esportivo britânica Umbro, garantindo, assim, o fornecimento à seleção inglesa. Finalmente, em 2008, o alvo americano foi a seleção francesa, tradicional parceira da Adidas. A Nike ofereceu aos franceses meio bilhão de dólares por oito anos, contados a partir de 2011. Os franceses aceitaram. "Nunca chegamos tão fortes a uma Copa do Mundo", disse a EXAME Charlie Denson, presidente da Nike.

Para impulsionar as vendas e aproveitar o fervor consumista que acompanha a Copa, as fabricantes de material esportivo transformam o evento numa plataforma para o lançamento de produtos tidos como revolucionários. A Nike lançou uma chuteira com travas "retráteis" que, diz a empresa, "aumenta a tração do jogador" e, de tão eficaz, pode "decidir a Copa". Em outra frente, a empresa criou uniformes feitos de garrafas PET recicladas (oito garrafas rendem uma camiseta). A chuteira de Lionel Messi, feita pela Adidas, será "a mais leve do mundo". E a empresa alemã, como vem ocorrendo nos últimos 40 anos, aposta alto no lançamento da bola oficial da Copa - batizada de Jabulani, ou "celebrar", numa das muitas línguas faladas na África do Sul. A Adidas vendeu cerca de 15 milhões de exemplares da bola oficial da Copa de 2006. Fruto de três anos de pesquisas, a nova bola é "perfeitamente redonda" e promete atingir velocidades maiores e aumentar a quantidade de gols no torneio. Apesar disso tudo, a Jabulani acabou enfiando a Adidas numa polêmica desagradável. A bola foi recebida a tapas por diversos jogadores, entre eles o goleiro brasileiro Júlio César. "É horrível, horrorosa. Parece aquelas bolas que você compra no supermercado", dis se ele. O técnico Dunga também chiou, e a bola ficou conhecida entre os brasileiros como "Jaburu". Já o astro Kaká, garoto-propaganda da Adidas, defendeu a Jabulani e chegou a beijá-la numa entrevista coletiva.


 O patrocínio de atletas e equipes esportivas é uma atividade de altíssimo risco, e não apenas porque deslizes na vida pessoal dos patrocinados podem trazer prejuízos às marcas. Ao chegar à África do Sul, empresas como Nike e Adidas são reféns de decisões tomadas anos atrás. E sempre há a chance de ter apostado no cavalo errado. Por anos, a Nike teve entre seus patrocinados os maiores jogadores brasileiros em Copas, entre eles Ronaldo e Romário. Mas as grandes apostas da empresa para 2010 foram Adriano, Ronaldinho Gaúcho e Robinho, e os dois primeiros acabaram de fora - enquanto a seleção treinava na África do Sul, Adriano tentava explicar à polícia do Rio de Janeiro suas relações com um traficante carioca. Além disso, corre-se o risco de ver um concorrente levantar a taça no dia 11 de julho e embolsar o lucro que vem junto. A Itália foi campeã da Copa de 2006. Que empresa levou o caneco? A alemã Puma, fornecedora de material esportivo do time italiano. Ou seja, Adidas e Nike perderam e o azarão se deu bem. "Essa é a beleza do esporte", diz Denson, da Nike. "Nós não sabemos o que vai acontecer. Mas, felizmente, nosso concorrente também não sabe."

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