Mario Luiz Lorencatto, presidente da Usina Coruripe: menos acidentes, menos gastos (Germano Lüders/Exame)
Da Redação
Publicado em 7 de novembro de 2019 às 05h34.
Última atualização em 7 de novembro de 2019 às 10h01.
Quando a Usina Coruripe migrou do modelo de administração familiar para a gestão profissionalizada, de 2012 para 2013, os acionistas e executivos definiram a segurança ocupacional como um tema prioritário. Na época, a empresa chegou a registrar 409 acidentes com afastamento em um único ano. De lá para cá, foi possível reduzir 95% do total de incidências — foram 19 em 2018 — e sua gravidade, em um projeto que envolveu a capacitação e o engajamento da equipe, ferramentas para identificar e prevenir riscos e a sistematização das ações preventivas e corretivas. O feito se deve ao programa Zero Acidente Sempre, voltado para ampliar os períodos sem acidentes em cada local onde a empresa está presente — ela tem unidades em Alagoas e no Triângulo Mineiro. “Queremos produzir mais com menos e sempre focados na segurança e no bem-estar das pessoas”, afirma Mario Luiz Lorencatto, presidente da Usina Coruripe.
A companhia investiu 4 milhões de reais nas ações ao longo de cinco anos. Além do benefício direto para a segurança das pessoas, houve ganhos financeiros: foram evitados cerca de 30 milhões de reais em custos com afastamentos e danos materiais. O trabalho começou com a análise detalhada dos acidentes e um estudo interno de comportamento mostrando que 85% das ocorrências estavam ligadas a atitudes inseguras. Ao todo, foram treinadas 21 turmas de multiplicadores, que levaram a todas as unidades operacionais os conceitos de observação do comportamento. Além de capacitações específicas para reforçar o papel de diretores, gerentes, coordenadores e supervisores na consolidação de uma cultura de segurança, todos os empregados foram estimulados a identificar os riscos na própria conduta e na de colegas para promover mudanças. Cada unidade operacional ganhou um comitê responsável por analisar os indicadores de segurança e estabelecer os planos de ação. “De cada ocorrência, passamos a tirar um aprendizado para corrigir as situações de risco”, afirma Fabio Moniz, diretor de administração e recursos humanos.
A Usina Coruripe é a maior produtora de açúcar e etanol nas regiões Norte e Nordeste. No cenário brasileiro, está entre as dez maiores, com capacidade de moagem anual de 14,4 milhões de toneladas de cana (pouco mais de 2% da safra do país). Na área ambiental, os principais focos de atuação são o uso eficiente de recursos na produção, com a redução do consumo de água e energia por tonelada de cana processada, além da manutenção de 17.000 hectares de reservas ambientais localizadas em áreas próprias.
Na comercializadora de grãos Amaggi, uma plataforma de dados geoespaciais auxilia a gestão de critérios socioambientais na cadeia de fornecedores | Judith Mota
Áreas embargadas pelo Ibama em diferentes regiões do país, áreas no bioma Amazônia compreendidas pela moratória da soja, terras indígenas, unidades de conservação, produtores e empresas que figuram na lista suja de trabalho escravo… A lista de restrições socioambientais que a Amaggi precisa levar em conta na hora de definir de quem e onde comprar grãos é longa — dificultando a tarefa de assegurar seu cumprimento em toda a cadeia de fornecedores, que chega a envolver 4 000 produtores anual-mente. Com a ajuda da tecnologia, porém, a empresa tem conseguido simplificar e automatizar alguns processos.
Todos os mapas oficiais que indicam as restrições estão reunidos em uma plataforma de dados geoespaciais. A ferramenta, chamada Originar (Originação Amaggi- Responsável), foi criada pela própria companhia em 2016 e vem sendo aperfeiçoada ano a ano com novas informações para identificar os produtores de risco. Do total da cadeia de fornecedores, 93% já estão na plataforma, e a Amaggi pretende chegar aos 100% até dezembro. Neste ano, a Originar passou a incluir dados do Cadastro Ambiental Rural (CAR, um registro eletrônico dos imóveis rurais no país) e um sistema de alerta de detecção de desmatamento, com dados de satélite, atualizados periodicamente.
Com a evolução da ferramenta, o que começou como um projeto de rastreabilidade e segurança socioambiental para a aquisição de grãos ganha novas possibilidades de uso. A ideia é fazer da Originar uma “plataforma de inteligência de mercado e sustentabilidade”, na definição de Juliana Lopes, diretora de sustentabilidade, comunicação e compliance da Amaggi. “Podemos identificar excedentes de reserva legal, que são ativos importantes para os produtores, e temos parceiros técnicos que podem ajudar em projetos de integração lavoura-pecuária que recuperam pastos degradados”, diz ela.
A nova plataforma integra diversos processos automatizados de gestão de conformidade socioambiental de fornecedores. Os casos de risco são bloqueados automaticamente pelo sistema e só podem ser liberados após análise caso a caso que comprove a regularização do problema. Em 2018, foram bloqueados 1 315 cadastros de fornecedores com base nesses critérios. Em 47 casos, a comercialização não foi realizada por causa dos riscos identificados. A Amaggi adquire de parceiros 92% do total de soja, milho e algodão que processa. Por isso, contar com informação de qualidade para gerir uma relação cada vez mais próxima com os fornecedores é fundamental para a sustentabilidade de seu negócio.
A bicentenária Bunge cria novas iniciativas em busca da meta de zerar nos próximos anos as vendas de grãos procedentes de áreas desmatadas | Ana Carolina Nunes
Em setembro de 2015, a Bunge assumiu o compromisso global de zerar até 2025 a venda de grãos oriundos de áreas desmatadas. Não é um objetivo fácil de ser alcançado. Só no Brasil, a companhia — fundada em 1818 na Holanda e hoje com sede nos Estados Unidos — monitora por satélite 7 000 fazendas em diferentes regiões. Uma das maiores exportadoras do agronegócio, a Bunge afirma que vem aperfeiçoando os sistemas de rastreabilidade, monitoramento e incentivos para fornecer produtos com desflorestamento zero aos clientes. Com as medidas adotadas, consegue rastrear 92% da produção dos fornecedores em áreas com risco de desmatamento no Brasil. “Nosso objetivo é reduzir progressivamente quaisquer incidentes de desmatamento em nossas cadeias de suprimento de grãos e oleaginosas”, diz Niveo Maluf, diretor de relações institucionais e sustentabilidade da Bunge.
A iniciativa passa pela capacitação e pelo engajamento dos produtores em relação às boas práticas, incluindo a regularização das propriedades por meio do Cadastro Ambiental Rural, uma base de dados que ajuda no monitoramento da vegetação nativa do Brasil. O trabalho de conscientização conta com uma plataforma online com informações sobre produção sustentável, bem como uma ferramenta que auxilia os agricultores no planejamento sobre onde expandir a produção. Em 2017 e 2018, 98 fazendas monitoradas foram marcadas com sinal de atenção pela Bunge devido a atividades de desmatamento. No ano passado, a companhia suspendeu nove fazendas que não seguiram suas diretrizes.
Ainda assim, é um trabalho que não consegue evitar controvérsias. Em maio de 2018, a Bunge e outras quatro empresas foram multadas pelo Ibama por comercializar soja de áreas embargadas no Matopiba, a nova fronteira agrícola que abrange partes dos estados de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. A Bunge recorreu da multa, alegando que não houve irregularidade na compra dos grãos que são alvo da penalidade. Enquanto não sai a decisão sobre o caso, a Bunge põe em prática novos programas de agricultura sustentável. A mais recente iniciativa foi lançada no ano passado em parceria com a ONG The Nature Conservancy e o banco Santander. Trata-se de um fundo de 50 milhões de dólares para empréstimos de longo prazo a produtores de soja. Com pagamento em até dez anos, diferencia-se da maioria dos empréstimos disponíveis no mercado, com prazo de 12 meses. Para se qualificar ao empréstimo, o produtor deve se comprometer a adotar boas práticas e seguir as diretrizes ambientais.
A americana Cargill integra um grupo de trabalho com outras empresas, ONGs e governo para evitar a expansão descontrolada da fronteira agrícola na região | Judith Mota
O cerrado ocupa um quarto do território brasileiro e abriga 30% da biodiversidade do país. Ano a ano, a região vem perdendo vegetação nativa por causa da conversão de áreas florestais em pastagens e zonas de cultivo. Segundo dados da WWF Brasil, ONG de conservação ambiental, 26% da expansão da área agrícola no país entre 2007 e 2014 se deu por meio de desmatamentos no Cerrado. Por isso, a região virou tema obrigatório na gestão de sustentabilidade de qualquer empresa do agronegócio. Na americana Cargill, o assunto tem mobilizado discussões com outros agentes do setor, num esforço para promover mudanças no mercado. No primeiro semestre deste ano, 37% da soja processada pela empresa no Brasil era originária do Cerrado.
A Cargill participa do Grupo de Trabalho do Cerrado (GTC), que reúne representantes da indústria, do governo e de ONGs. A principal aposta do grupo é a criação de um fundo para compensação financeira dos produtores pelo desmatamento evitado. A ideia é pagar aos fazendeiros que optarem por manter a floresta em pé em vez de utilizar todo o limite legal da propriedade para ampliar a área cultivável. A origem dos recursos e os processos de avaliação dos projetos ainda estão em discussão, e a expectativa na Cargill é que estejam definidos até o fim deste ano. “Nenhuma empresa tem o poder de combater sozinha o desmatamento”, diz Yuri Feres, diretor de sustentabilidade da Cargill na América Latina.
A proposta defendida pela Cargill não é livre de controvérsia. A ONG Green-peace, que chegou a fazer parte da criação do GTC, deixou o grupo por julgar insatisfatória a solução do fundo. A ONG defende a adoção de uma moratória da soja no Cerrado, a exemplo da iniciativa que existe desde 2008 para a Amazônia. A Cargill é contrária à moratória por considerar o instrumento inadequado às condições sociais, econômicas e ambientais da produção na região.
Além de participar do esforço setorial, a Cargill busca desenvolver políticas que proíbam a aquisição de produtos em -áreas de desmatamento ilegal. A empresa anunciou neste ano a criação de um fundo de 30 milhões de dólares para financiar projetos inovadores que ajudem a proteger o Cerrado — o primeiro edital de seleção está previsto para os próximos meses. Além disso, a empresa conta com um sistema próprio de certificação voluntária que orienta os fornecedores sobre o cumprimento legal nos âmbitos ambiental, trabalhista e de saúde e segurança. Atualmente, há cerca de 170 propriedades certificadas, totalizando 394 000 hectares em cinco estados brasileiros.
Ao incentivar a apicultura em sua lavoura de cana-de-açúcar, a Usina São Manoel promove uma atividade que gera impacto positivo no campo e na comunidade | Ana Carolina Nunes
A atividade agrícola em grande escala tem sido responsabilizada pela morte de comunidades de abelhas em diferentes regiões do mundo, vítimas do uso indiscriminado de agrotóxicos. É um tiro no pé para os agricultores, uma vez que as abelhas são os mais eficientes polinizadores naturais e seu trabalho afeta a produção de alimentos em todo o planeta. Esse é um problema que passa longe da Usina São Manoel. No entorno da usina, localizada na cidade de São Manuel, no interior paulista, as abelhas dividem os céus com os drones que monitoram os canaviais. Os equipamentos voadores de alta tecnologia percorrem as plantações para coletar dados que ajudam na gestão da lavoura, incluindo o uso correto de defensivos agrícolas. Desde 2016, os apicultores locais não registram morte de abelhas causada por agrotóxicos. “Isso demonstra que nossa produção é feita seguindo os rígidos padrões exigidos pela legislação na aplicação de defensivos”, diz Adir Natal Maximiano, supervisor de qualidade e responsabilidade social da Usina São Manoel.
As abelhas fazem parte do projeto Ciclo do Mel, iniciado há cinco anos, quando a Usina São Manoel decidiu ceder uma área já ocupada por apicultores. Na época, eram 18 famílias que atuavam informalmente no local. Hoje são 50 famílias, que ocupam 240 hectares e aumentaram sua produtividade em até 60% desde que ingressaram no projeto. A usina ajuda na qualificação do grupo, oferecendo educação ambiental e apoio jurídico para a formalização da atividade. Os apicultores, por sua vez, ajudam a monitorar a área no caso de focos de incêndios nos canaviais ou nas florestas do entorno. Em 2020, a usina oferecerá mais 271 hectares para a expansão do projeto. A meta é aumentar em 40% a produção atual de mel, de 45,5 toneladas por ano. Parte do mel é destinada a um abrigo de crianças e adolescentes da região.
Com 2 100 funcionários, a Usina São Manoel, fundada em 1949, é a maior empresa da cidade de 40.000 habitantes. Na última safra, moeu 3,6 milhões de toneladas de cana, e isso resultou na produção de 255.000 toneladas de açúcar, 144 milhões de litros de etanol e 3.000 toneladas de levedura. Neste ano, a Usina São Manoel foi a primeira empresa no Brasil selecionada para receber uma nova linha de crédito do banco holandês Rabobank, no valor de 50 milhões de reais, para estimular a produção sustentável de alimentos. A iniciativa é parte do programa Kickstart Food, lançado em 2017 pelo Rabobank e pela ONU Meio Ambiente, agência das Nações Unidas que promove a conservação da natureza.