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Chegou a hora de dar milhas

Os programas de milhagem já foram vistos como vilões da aviação. Agora ressurgem como fonte de receitas para as empresas aéreas

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Da Redação

Publicado em 11 de setembro de 2013 às 08h47.

Quando as companhias aéreas de baixo custo surgiram, há cerca de uma década, muitos dos serviços oferecidos pelas empresas tradicionais foram lançados numa espécie de limbo. Refeições a bordo, classe executiva ou mesmo reserva antecipada de assentos se tornaram frivolidades que só serviam para encarecer o preço da passagem.

Bom mesmo - não para os passageiros, mas para as finanças das aéreas - era colocar o maior número de pessoas no menor espaço possível e cobrar pelo resto. Não era uma estratégia que combinava com os programas de milhagem, lançados no Brasil em meados da década de 90 e no mundo nos anos 80. Prometendo tarifas baixas, a Gol foi lançada sem um programa de milhagem.

Ao comprar a Varig, há dois anos, herdou o maior programa desse tipo no país. O Smiles conta hoje com mais de 6,2 milhões de participantes.

O que era um problema passou a ser visto como solução. De fontes de custo, os programas de milhagem ressurgem agora como potenciais geradores de receitas. Em junho, o Smiles rendeu à Gol um acordo de 252 milhões de reais firmado com o Banco do Brasil e o Bradesco para a emissão de cartões de crédito que acumulam milhas nas duas companhias da família Constantino.

Os 252 milhões de reais se converterão em milhas, vendidas com descontos estimados de 70% aos bancos e repassadas aos clientes dos cartões. "O Smiles está se tornando uma ferramenta estratégica", afirma Murilo Barbosa, diretor de marketing e cartões da Gol.

Peças de um setor famoso pela enorme competitividade e capacidade de gerar prejuízos, as companhias aéreas tentam descobrir fontes de receita que vão além da venda de bilhetes. A mais nova empresa aérea brasileira, a Azul, criou seu programa de fidelidade apenas seis meses depois de seu primeiro voo.

Batizado como Tudo Azul, o sistema gera créditos em reais equivalentes a 5% do valor das passagens adquiridas pelo participante. A cada 50 reais acumulados, o passageiro pode usar os créditos para descontos em novas compras de passagens. "Nosso objetivo foi criar um programa em que os benefícios sejam facilmente percebidos pelos clientes", afirma Pedro Janot, presidente da empresa.

O objetivo da Azul é cadastrar 1 milhão de clientes neste ano. A primeira meta do programa é atrair e manter clientes. No futuro, porém, o Tudo Azul pode ser oferecido a parceiros.


A TAM, líder do setor, foi a primeira a lançar um programa de milhagem no país, em 1994. Desde então, nunca o abandonou. Mas, diante do movimento das concorrentes e da própria evolução do mercado, a empresa reformulou seu sistema. Há um mês, criou o Multiplus, pelo qual os pontos são acumulados tanto nos voos como em compras de bens e serviços numa rede de parceiros.

Os créditos, por sua vez, podem ser trocados por passagens ou produtos nas empresas participantes. A TAM pretende transformar o Multiplus em uma nova companhia - o que permitiria a participação de um sócio ou a abertura de capital. "Já temos tudo pronto para criar a nova empresa", diz Líbano Barroso, vice-presidente de finanças da TAM.

A súbita valorização dos programas de fidelidade das companhias aéreas brasileiras segue uma tendência internacional. O Multiplus da TAM, por exemplo, foi inspirado no canadense Aeroplan. Nascido em 1984 como o programa de milhagem da companhia aérea Air Canada, ele se tornou uma empresa independente em 2002.

Por meio de aquisições, diversificou-se e hoje administra programas de fidelidade no Canada, na Inglaterra e no Golfo Pérsico, em áreas que vão de bens de consumo a serviços financeiros.

Enquanto a Air Canada fechou 2008 com prejuízo de quase 900 milhões de dólares, a Aeroplan lucrou 260 milhões. "É um negócio rentável e que eventualmente pode proteger as empresas aéreas em momentos de crise ou instabilidade", diz o consultor André Castellini, da Bain & Company, especializado em aviação.

Além da perspectiva de reforçar a receita com a exploração de áreas distantes do negócio original, os programas de milhagem seguem como parte da estratégia para aumentar a rentabilidade das empresas aéreas.

Pesquisas realizadas nos Estados Unidos apontam que algumas companhias obtêm mais de metade de seu lucro com apenas 15% dos clientes - justamente os que participam dos programas de fidelidade. São passageiros exigentes, que em sua maioria viajam a negócios, dispostos a pagar mais por serviços e comodidades.

No mercado brasileiro, que no mês de maio registrou uma retração de 5,4% no volume de passageiros, os benefícios aos clientes podem ser decisivos. 

Os dados mais recentes da Anac, a agência reguladora do setor, apontam um acirramento da concorrência entre as duas líderes do mercado nacional, com a Gol se aproximando rapidamente da TAM na disputa por passageiros - a Gol teve 42% de participação no transporte doméstico, enquanto a TAM teve 45%.

Da mesma forma, a novata Azul desponta como um concorrente capaz de tirar passageiros das duas empresas. Até hoje, as guerras de preços para atrair passageiros se mostraram efêmeras. É esperar para ver o que acontecerá com a nova estratégia.

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