Lenovo: rivais como HP e Dell estão ficando para trás (Cancan Chu/Getty Images)
Da Redação
Publicado em 31 de maio de 2013 às 13h36.
São Paulo - A maioria dos ocidentais não tinha ideia de quem era e o que fazia a empresa chinesa Lenovo até 2004. No fim daquele ano, porém, a fabricante de computadores asiática, criada em 1984, ganhou destaque global ao arrematar a divisão de computação pessoal da americana IBM por 1,7 bilhão de dólares.
A aquisição a colocou na terceira posição no mercado mundial de PCs, mas ainda bem atrás das americanas HP e Dell. De lá para cá, o cenário para os computadores mudou radicalmente. Há oito anos, o setor estava em franco crescimento, com o início do boom de vendas nos países emergentes.
O futuro parecia brilhante para as fabricantes de computador, grandes estrelas do mundo da tecnologia. Há dois anos, porém, surgiram os tablets e o mercado de PCs nunca mais foi o mesmo. A venda de computadores cai trimestre após trimestre e as novas estrelas do setor de tecnologia passaram a ser Apple e Samsung.
Nesse ambiente carregado em que se transformou o mercado de PCs, a única imune é a Lenovo. A empresa continuou crescendo, encerrou 2012 com faturamento de 30 bilhões de dólares — dez vezes maior do que sua receita de 2004 — e, pela projeção das consultorias, deve se tornar em 2013 a maior vendedora de PCs do mundo.
O primeiro passo da estratégia que levou a Lenovo aos patamares atuais foi dado por meio de uma política agressiva de aquisições. A mais importante delas, a compra da IBM, foi também a mais complicada. A Lenovo precisou se posicionar como uma empresa global, aposentou seu fundador, o chinês Liu Chuanzhi, na época com 61 anos, e adotou o inglês como idioma oficial.
Dois ocidentais passaram pela presidência, até que a empresa conseguiu reverter a desconfiança de clientes corporativos da IBM, que estavam receosos de ser atendidos por uma companhia chinesa pouco conhecida.
Deu certo. Em 2010, as vendas da empresa aumentaram 37% em relação ao ano anterior, seis vezes mais do que a líder HP. Para atingir essa meta, a Lenovo contou com a ajuda da expansão da economia na China, seu principal mercado. Foi dessa forma que conseguiu fazer caixa e crescer com aquisições em outros países.
Em 2011, a Lenovo comprou a fabricante de PCs Medion por 738 milhões de dólares e dobrou sua participação na Alemanha. No mesmo ano, criou uma joint venture com a NEC no Japão.
A aquisição importante mais recente ocorreu no Brasil, em setembro de 2012, quando a Lenovo anunciou a compra da CCE por 150 milhões de dólares e tornou-se a terceira maior do país, atrás de Positivo e HP. Com a estratégia de aquisições, a companhia assumiu a liderança em vendas em cinco dos sete maiores mercados de PCs do mundo.
À moda chinesa
Somente “comprar fatias de mercado”, no entanto, não garantiria seu sucesso. Era preciso fabricar os computadores que os consumidores ainda estavam dispostos a comprar — e nesse ponto os chineses também acertaram.
A Lenovo entendeu antes de HP e Dell que os PCs estavam entrando num processo de “commoditização”, em que o custo-benefício conta mais do que a sofisticação. A empresa concentrou seu esforço numa linha de PCs com design simples e com custo de produção mais baixo, bem à moda chinesa.
Enquanto os concorrentes estavam preocupados em revolucionar o design de seus produtos para tentar conter o avanço dos tablets, a Lenovo estava fazendo seu velho feijão com arroz. “Essa estratégia foi essencial quando os PCs começaram a ser tratados como commodities”, diz John Quelch, professor de negócios da Universidade Harvard.
Se nos últimos oito anos a Lenovo viveu tempos de glória, seu maior desafio ainda está por vir. Por enquanto, a companhia lucra com a venda de computadores simples em mercados emergentes e, ao mesmo tempo, investe em inovação com o objetivo de se preparar para a briga do mundo pós-PC.
A própria empresa reconhece que terá de mudar a ênfase. A estratégia de focar somente computadores menos sofisticados deve dar lugar a outra, centrada em produtos mais inovadores.
Foi com esse objetivo que a companhia criou linhas de notebooks chamados de conversíveis, em que o usuário pode retirar a tela e usá-los como tablet. Também embarcou em TVs e smartphones.
“Os novos produtos seguem uma trajetória comum: lançamos antes na China para entender a receptividade do consumidor e, depois, os levamos a outros mercados”, afirma o americano Gerry Smith, vice-presidente da companhia.
Nesse momento, os smartphones são a aposta da Lenovo na China, onde ela só perde para a coreana Samsung. Com o sucesso desse segmento na Ásia, já foi tomada a decisão de lançar produtos similares no Brasil nos próximos meses. Além de smartphones, as lojas brasileiras devem ser invadidas por TVs da Lenovo e da CCE.
Para isso, os chineses investiram 50 milhões de dólares, contrataram 900 funcionários e reformaram duas fábricas e um centro de pesquisa. “A Lenovo demorou a apostar mais fichas no Brasil porque o mercado exigia esforços superiores aos de outros países, como investimentos em fábricas e na cadeia de distribuição”, diz Smith. “Agora estamos prontos.”
No Brasil, um dos maiores desafios da Lenovo é reverter o conceito negativo da marca CCE. A empresa ainda é associada às piadas que a eternizaram nos anos 80 como “Conserta Conserta Estraga” e “Cruz Credo Eletrônica” — a sigla original refere-se a Comércio de Componentes Eletrônicos.
De certa forma, o Brasil é um ensaio do que os chineses devem fazer em escala global. Os anos de foco em produtos simples e baratos serviram para ganhar mercado de seus principais rivais no segmento de computadores, mas deixaram uma imagem de pouca sofisticação.
Para se tornar líder mundial no mundo pós-PC, como a Samsung na última década, a Lenovo precisará ter fãs, não clientes em busca do preço mais baixo.