Escritório da Quero Educação: startup recebeu quatro estudantes do MIT para avaliarem a jornada do bolsista em seu site (Quero Educação/Divulgação)
Mariana Fonseca
Publicado em 8 de junho de 2018 às 06h00.
Última atualização em 8 de junho de 2018 às 11h22.
São Paulo - Não é nada fácil passar em uma seleção como a da Y Combinator. Na aceleradora do Vale do Silício (Estados Unidos), de 1 a 2% das startups que concorrem são de fato selecionadas – na prestigiada Universidade de Harvard, a taxa de aprovação é de 5%. Mais difícil do que entrar é ser aprovado mais de uma vez. Uma startup brasileira acabou de conseguir o feito: a Quero Educação.
O negócio, mais conhecido pelo marketplace de descontos para o ensino superior Quero Bolsa, já havia passado pela aceleração comum da Y Combinator em junho de 2016. Agora, foi aprovado em um novo programa da instituição, chamado YC’s Growth Program.
É como uma pós-graduação, focada em startups que estão mais sólidas - dezenas de funcionários e um investimento Série A no bolso. É uma fatia selecionada, já que apenas 100 companhias das mais de 1.200 ativas e aceleradas pela Y Combinator possuem mais de 50 empregados.
“Somos a única startup brasileira aprovada que tem o foco em um mercado internacional para eles, que é o Brasil. É como estar em um parque de diversões, encontrando nossos ídolos”, afirma Bernardo de Pádua, presidente da Quero Educação. Após o programa, a empresa possui metas ainda mais agressivas do que antes - ser um “Airbnb das escolas”, citando a gigante de mais de 30 bilhões de dólares em valuation (cerca de 117 bilhões de reais, na cotação atual).
Diferentemente de um programa de aceleração, o YC’s Growth Program não é um programa estruturado de mentorias e metas. O objetivo é estruturar companhias para crescerem, com base nas melhores práticas do Vale do Silício.
Os empreendedores passam 11 semanas na região e jantam com executivos tanto de dentro quanto de fora da rede Y Combinator. Cada encontro foca em um problema que as startups devem superar para escalarem suas soluções - e é uma oportunidade valiosa de networking.
A Quero Educação acabou de terminar o programa. “Nosso grande desafio é desenvolver a startup para uma escala mundial. Queríamos ver como as empresas daqui crescem do nosso patamar para milhares de funcionários. Discutimos problemas como crescimento, desenvolvimento de produto, gestão de equipes, investimentos e IPOs, marketing e vendas B2B [entre empresas]”, afirma Pádua.
A startup falou com executivos de gigantes como Airbnb, Amazon, Google, Instacart e Netflix.
Criada em São José dos Campos, no interior de São Paulo, a Quero Educação é um caso raro de startup que se tornou lucrativa desde cedo. O negócio tem contas no azul desde 2013, ajudado por cortes nos financiamentos governamentais Fies, Pronatec e Prouni. Logo atraiu investimentos-anjo no valor total de 2,5 milhões de reais, por parte de personalidades como Julio Vasconcellos, fundador do site de compras coletivas Peixe Urbano.
A startup teve receita de 50 milhões de reais no ano passado, matriculando mais de 150 mil estudantes no ensino superior. Hoje, possui mais de 300 funcionários.
Hoje, há cerca de 8 milhões de alunos matriculados no ensino superior, estimulados pela expansão no número de faculdades e universidades e em suas vagas. Mesmo assim, ainda há muito a melhorar. Cerca de 51% da população de 25 anos ou mais possuem apenas o ensino fundamental completo e 15,3% concluíram o ensino superior, de acordo com dados do IBGE relativos a 2016.
“Estamos distante das métricas dos países desenvolvidos. Essa situação se agrava com os trabalhos mecânicos cada vez mais robotizados: as pessoas precisarão de mais formação se quiserem ter um trabalho”, analisa Pádua. Completam a equipe de sócios Lucas Gomes e Thiago Brandão, todos engenheiros de computação do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA).
“A educação está passando por um processo de disrupção tecnológica. Além disso, a crescente classe média, principalmente no terceiro mundo, sabe que o conhecimento será a diferença entre o sucesso e a falha no futuro”, afirmou Geoff Ralston, sócio da Y Combinator, em entrevista anterior a EXAME.
“Achamos que o que a Quero Educação está fazendo pode ser aplicado em uma escala global. Financiamento estudantil é um grande problema mesmo em países como os Estados Unidos.”
O produto mais conhecido da Quero Educação é o portal Quero Bolsa - segundo o próprio presidente, uma espécie de “Airbnb de escolas”. O site recebe 40 milhões de visitas anualmente, com usuários buscando o melhor curso de graduação e pós-graduação entre as 1.300 instituições de ensino superior cadastradas.
As bolsas variam de 5 a 70%, com uma média de 40% de desconto - o que não vale para cursos mais restritos em número de vagas e infraestrutura, como Medicina.
Após de consultar com um dos 100 funcionários de atendimento da Quero Bolsa, por canais como ligações e WhatsApp, o estudante faz sua pré-matrícula pelo marketplace e garante seu desconto. A startup se monetiza por meio de um acordo com as faculdades: a primeira mensalidade paga pelo estudante irá para a plataforma.
Após o YC’s Growth Program, a Quero Educação vai colocar o pé no acelerador. O foco ainda está no Brasil, mas o negócio está de olho em mercados similares, como Índia, Indonésia e México. A startup planeja crescer 10 vezes nos próximos cinco anos.
Como se costuma falar no mundo dos vestibulares, passar em uma seleção disputadíssima é só o primeiro passo. O mercado é ainda mais desafiador.