Sucessão de franqueados
Com o amadurecimento das franquias no Brasil, cada vez mais redes enfrentam o desafio de coordenar a sucessão dos franqueados. Saiba como se preparar para esse momento
Da Redação
Publicado em 14 de março de 2012 às 06h00.
São Paulo - Nas últimas duas décadas, os sócios Delfino Golfeto, de 60 anos, e Julio Bertuluci, de 35, fizeram de um pequeno restaurante de Tupã, no interior paulista, uma rede de franquias com mais de 109 unidades em 11 estados. Eles são donos da Água Doce Cachaçaria, que no ano passado faturou cerca de 120 milhões de reais.
Desde 2001, a empresa cresceu em média 15% ao ano. Nos últimos tempos, no entanto, os sócios perceberam uma ameaça à expansão. Franqueados mais antigos começaram a dar sinais de cansaço com as frequentes madrugadas de trabalho — seus restaurantes só fecham depois de o último cliente pedir a saideira e pagar a conta. "Alguns deles começaram a falar em deixar o negócio", diz Golfeto.
Desde 2005, seis unidades trocaram de dono. No sistema de franquias , é natural que surja um ou outro franqueado que queira passar o negócio adiante. O problema é esse movimento se transformar numa debandada — o que pode acontecer nas redes em que uma grande parte dos donos das unidades tenha planos de se aposentar no curto prazo, por exemplo.
"Uma troca de comando brusca nas unidades pode causar transtornos para os franqueadores, principalmente se eles não estiverem preparados para supervisionar toda a transição", diz Marcelo Cherto, sócio da consultoria especializada em franquias Franchise Store, de São Paulo.
No caso da Água Doce, Golfeto começou a perceber um padrão. "Muitos de nossos franqueados passaram a falar em sair do negócio uns 15 anos após entrarem para a rede", diz ele. "Isso significa que, como nossas primeiras unidades começaram a ser abertas há 19 anos, é alta a probabilidade de que muitos dos membros da rede estejam agora pensando em se aposentar."
Por isso, no ano passado os sócios da Água Doce reuniram-se com os franqueados mais antigos para saber o que eles planejavam para o futuro — e descobriram que, nos próximos cinco anos, 20% de suas unidades podem trocar de mãos. "Até agora, todos os franqueados que foram embora passaram as unidades para parentes que já trabalhavam no negócio, como filhos e genros, o que evitou maiores problemas", diz Bertuluci. "Daqui em diante, será preciso tratar do assunto com mais cuidado."
Os sócios da Água Doce estão elaborando um manual com orientações para todos os franqueados se prepararem para a sucessão. Além disso, começaram a convidar os familiares dos franqueados para participar de convenções e conhecer a sede da empresa.
"Queremos que essas pessoas reflitam, desde já, sobre se querem ou não assumir a liderança do negócio no futuro", diz Golfeto. "Precisamos da resposta para saber em quais unidades teremos de ajudar os franqueados a achar outros sucessores."
Para redes como a Água Doce, a preocupação com a sucessão dos franqueados é um desafio recente. Trata-se de um sinal de amadurecimento de um modelo de expansão relativamente novo no país.
"As redes de franquias só começaram a se disseminar no Brasil a partir do final dos anos 80”, diz Cherto, da Franchise Store. “Só agora os franqueadores começam a enfrentar esse tipo de situação."
É o caso da rede de lojas de perfumes e cosméticos O Boticário, que em 2011 traçou um plano de sucessão para suas unidades. Até o final do próximo ano, 200 dos 960 franqueados vão dar início à transição — que inclui um curso de dois anos de preparação para os escolhidos a assumir as lojas no futuro.
Na locadora de automóveis Localiza, metade das lojas é franqueada por cerca de 100 empreendedores. Desses, dez pretendem deixar o comando de suas unidades — seus possíveis sucessores vêm sendo treinados para assumir o novo posto. "Também começamos a identificar os franqueados que não têm sucessores definidos para ajudá-los a entregar a gestão a um profissional", diz Bruno Andrade, diretor de franquias da Localiza.
A troca no comando das franqueadas pode ser um momento bastante delicado. Na prática, cada unidade é um pequeno negócio que pertence ao franqueado — e se algo acontecer a ele sem que exista um sucessor preparado para assumir, o franqueador pode sofrer com a perda de um ponto de venda importante para a marca.
"Pode acontecer de tudo, de uma repentina decisão de aposentadoria à morte do franqueado", diz Wagner Teixeira, sócio da Hötz, consultoria especializada em empresas familiares que ajudou a planejar a estratégia do Boticário. "É preciso estar preparado para esse tipo de situação."
O primeiro passo para planejar a sucessão dos franqueados é avaliar em quais unidades é mais provável uma mudança de comando. Levantar a idade dos franqueados, há quanto tempo estão à frente das unidades e quais seus planos de aposentaria ajuda a prever em quais delas a hora da mudança está se aproximando.
Os casos de franqueados que possuem muitas unidades e concentram parte significativa das receitas da rede devem ser tratados como prioridade.
Definida a lista de franqueados prioritários, chega o momento de conversar com cada um para falar sobre a sucessão. "É um momento delicado porque o franqueador não pode impor a troca de comando", diz Priscila Mello, sócia da consultoria DeFamília. "O que se pode fazer é chamar aqueles cuja sucessão deve ocorrer em breve para sugerir o início desse processo."
É comum que muitos franqueados escolham parentes para assumir seu lugar. Cabe ao franqueador avaliar se acolher o parente como novo franqueado também é a melhor opção. "A maioria dos contratos de franquia garante ao franqueador o direito de veto", diz Teixeira. Um bom momento para avaliar se o candidato a sucessor tem o perfil desejado é submetê-lo a um treinamento — que pode ser o mesmo aplicado aos novos franqueados —, além de um período de experiência em outras lojas da rede.
Achado o sucessor certo, o franqueador deve supervisionar a troca — e auxiliar a enfrentar as dificuldades que surgem no dia a dia. Na rede paulista de lanchonetes Rei do Mate, que faturou 150 milhões de reais em 2011, a tarefa cabe a 20 profissionais que visitam periodicamente as 300 unidades da rede para ajudar seus donos na gestão.
Desde a fundação da empresa, nos anos 70, a troca de comando ocorreu em 12 unidades. “Em metade delas, foi por causa da morte do dono”, diz Antônio Carlos Nasraui, diretor comercial e de marketing da rede. "Ninguém sabe quando as coisas vão acontecer", diz o consultor Cherto. "Por isso, é preciso ter tudo sob controle para evitar traumas na transição."
São Paulo - Nas últimas duas décadas, os sócios Delfino Golfeto, de 60 anos, e Julio Bertuluci, de 35, fizeram de um pequeno restaurante de Tupã, no interior paulista, uma rede de franquias com mais de 109 unidades em 11 estados. Eles são donos da Água Doce Cachaçaria, que no ano passado faturou cerca de 120 milhões de reais.
Desde 2001, a empresa cresceu em média 15% ao ano. Nos últimos tempos, no entanto, os sócios perceberam uma ameaça à expansão. Franqueados mais antigos começaram a dar sinais de cansaço com as frequentes madrugadas de trabalho — seus restaurantes só fecham depois de o último cliente pedir a saideira e pagar a conta. "Alguns deles começaram a falar em deixar o negócio", diz Golfeto.
Desde 2005, seis unidades trocaram de dono. No sistema de franquias , é natural que surja um ou outro franqueado que queira passar o negócio adiante. O problema é esse movimento se transformar numa debandada — o que pode acontecer nas redes em que uma grande parte dos donos das unidades tenha planos de se aposentar no curto prazo, por exemplo.
"Uma troca de comando brusca nas unidades pode causar transtornos para os franqueadores, principalmente se eles não estiverem preparados para supervisionar toda a transição", diz Marcelo Cherto, sócio da consultoria especializada em franquias Franchise Store, de São Paulo.
No caso da Água Doce, Golfeto começou a perceber um padrão. "Muitos de nossos franqueados passaram a falar em sair do negócio uns 15 anos após entrarem para a rede", diz ele. "Isso significa que, como nossas primeiras unidades começaram a ser abertas há 19 anos, é alta a probabilidade de que muitos dos membros da rede estejam agora pensando em se aposentar."
Por isso, no ano passado os sócios da Água Doce reuniram-se com os franqueados mais antigos para saber o que eles planejavam para o futuro — e descobriram que, nos próximos cinco anos, 20% de suas unidades podem trocar de mãos. "Até agora, todos os franqueados que foram embora passaram as unidades para parentes que já trabalhavam no negócio, como filhos e genros, o que evitou maiores problemas", diz Bertuluci. "Daqui em diante, será preciso tratar do assunto com mais cuidado."
Os sócios da Água Doce estão elaborando um manual com orientações para todos os franqueados se prepararem para a sucessão. Além disso, começaram a convidar os familiares dos franqueados para participar de convenções e conhecer a sede da empresa.
"Queremos que essas pessoas reflitam, desde já, sobre se querem ou não assumir a liderança do negócio no futuro", diz Golfeto. "Precisamos da resposta para saber em quais unidades teremos de ajudar os franqueados a achar outros sucessores."
Para redes como a Água Doce, a preocupação com a sucessão dos franqueados é um desafio recente. Trata-se de um sinal de amadurecimento de um modelo de expansão relativamente novo no país.
"As redes de franquias só começaram a se disseminar no Brasil a partir do final dos anos 80”, diz Cherto, da Franchise Store. “Só agora os franqueadores começam a enfrentar esse tipo de situação."
É o caso da rede de lojas de perfumes e cosméticos O Boticário, que em 2011 traçou um plano de sucessão para suas unidades. Até o final do próximo ano, 200 dos 960 franqueados vão dar início à transição — que inclui um curso de dois anos de preparação para os escolhidos a assumir as lojas no futuro.
Na locadora de automóveis Localiza, metade das lojas é franqueada por cerca de 100 empreendedores. Desses, dez pretendem deixar o comando de suas unidades — seus possíveis sucessores vêm sendo treinados para assumir o novo posto. "Também começamos a identificar os franqueados que não têm sucessores definidos para ajudá-los a entregar a gestão a um profissional", diz Bruno Andrade, diretor de franquias da Localiza.
A troca no comando das franqueadas pode ser um momento bastante delicado. Na prática, cada unidade é um pequeno negócio que pertence ao franqueado — e se algo acontecer a ele sem que exista um sucessor preparado para assumir, o franqueador pode sofrer com a perda de um ponto de venda importante para a marca.
"Pode acontecer de tudo, de uma repentina decisão de aposentadoria à morte do franqueado", diz Wagner Teixeira, sócio da Hötz, consultoria especializada em empresas familiares que ajudou a planejar a estratégia do Boticário. "É preciso estar preparado para esse tipo de situação."
O primeiro passo para planejar a sucessão dos franqueados é avaliar em quais unidades é mais provável uma mudança de comando. Levantar a idade dos franqueados, há quanto tempo estão à frente das unidades e quais seus planos de aposentaria ajuda a prever em quais delas a hora da mudança está se aproximando.
Os casos de franqueados que possuem muitas unidades e concentram parte significativa das receitas da rede devem ser tratados como prioridade.
Definida a lista de franqueados prioritários, chega o momento de conversar com cada um para falar sobre a sucessão. "É um momento delicado porque o franqueador não pode impor a troca de comando", diz Priscila Mello, sócia da consultoria DeFamília. "O que se pode fazer é chamar aqueles cuja sucessão deve ocorrer em breve para sugerir o início desse processo."
É comum que muitos franqueados escolham parentes para assumir seu lugar. Cabe ao franqueador avaliar se acolher o parente como novo franqueado também é a melhor opção. "A maioria dos contratos de franquia garante ao franqueador o direito de veto", diz Teixeira. Um bom momento para avaliar se o candidato a sucessor tem o perfil desejado é submetê-lo a um treinamento — que pode ser o mesmo aplicado aos novos franqueados —, além de um período de experiência em outras lojas da rede.
Achado o sucessor certo, o franqueador deve supervisionar a troca — e auxiliar a enfrentar as dificuldades que surgem no dia a dia. Na rede paulista de lanchonetes Rei do Mate, que faturou 150 milhões de reais em 2011, a tarefa cabe a 20 profissionais que visitam periodicamente as 300 unidades da rede para ajudar seus donos na gestão.
Desde a fundação da empresa, nos anos 70, a troca de comando ocorreu em 12 unidades. “Em metade delas, foi por causa da morte do dono”, diz Antônio Carlos Nasraui, diretor comercial e de marketing da rede. "Ninguém sabe quando as coisas vão acontecer", diz o consultor Cherto. "Por isso, é preciso ter tudo sob controle para evitar traumas na transição."