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Ele fatura R$ 34 mi com cafeterias. O segredo? Funcionários responsáveis

Marco Kerkmeester adota uma filosofia vista em gigantes como Netflix: os empregados são incentivados a tomarem atitudes

Marco Kerkmeester: “O Santo Grão continua sendo, todos os dias, fundado. Formar as pessoas que vão continuar replicando o negócio é nosso maior desafio” (Fabiano Accorsi/VOCÊ S/A)

Marco Kerkmeester: “O Santo Grão continua sendo, todos os dias, fundado. Formar as pessoas que vão continuar replicando o negócio é nosso maior desafio” (Fabiano Accorsi/VOCÊ S/A)

Mariana Fonseca

Mariana Fonseca

Publicado em 25 de setembro de 2018 às 06h00.

Última atualização em 1 de outubro de 2018 às 21h19.

São Paulo Nas oito cafeterias do neozelandês Marco Kerkmeester, espalhadas por Curitiba, São Paulo e Rio de Janeiro, você talvez ouça conversas incomuns. Um barista pode perguntar como você melhoraria o café que lhe foi servido, ou o que você pensa da cor da parede. Nada do que estamos acostumados a ouvir de empregados em um negócio tradicional. Na rede Santo Grão, Kerkmester adotou uma filosofia especial de gestão de pessoas: elas trabalham não só pela empresa, mas por elas mesmas.

“É a oportunidade de elas crescerem, ganharem dinheiro, divertirem-se e, acima de tudo, ser quem elas são”, afirmou o empreendedor aos participantes do EXAME Mentoria PME, que coloca pequenos e médios empreendedores do país em contato com altos executivos de grandes empresas para analisar e reorientar seus negócios. O próprio empreendedor neozelandês fez parte de uma edição anterior do programa.

A decisão por dar autonomia aos funcionários já funciona em gigantes como Netflix e parece ter funcionado para pequenas como o Santo Grão. Hoje, a rede possui oito cafeterias e operações de revenda de seus produtos em mercados e em um e-commerce próprio. Três mil clientes são atendidos por dia. Apenas em 2017, o Santo Grão faturou 34,4 milhões de reais. Neste ano de economia morna e política efervescente, Kerkmeester espera aumentar seu faturamento em 35%.

Um mercado difícil e uma solução inesperada

Kerkmeester foi diretor de marketing na filial neozelandesa da gigante IBM durante dez anos e vivia uma vida de luxos. Ele chegou a liderar um time de 120 pessoas, com um orçamento anual de 4 bilhões de dólares e meta de vendas de 2,4 bilhões de dólares. Mesmo assim, sentia-se infeliz com seus rumos profissionais. Um dia, decidiu abandonar a empresa para abrir a própria cafeteria em São Paulo, terra natal de sua noiva.

A primeira unidade do Santo Grão nasceu em agosto de 2003, após um investimento de 1,3 milhão de reais. De lá para cá, o mercado permanece difícil. As redes especializadas em café faturaram 450 milhões de reais em 2017, pouco mais de 3% do mercado de alimentação no país, segundo análise da consultoria ECD Food Service com base em dados da Associação Brasileira de Franquias. As cafeterias crescem menos que a média do setor de alimentação: 7%, ante 8% da média geral.

Investir numa rede de cafeterias exige, portanto, desbravar um mercado ainda inexplorado. O neozelandês afirmou no encontro com empreendedores que de 5 a 6% do café consumido no Brasil já é gourmet, contra 54% nos Estados Unidos.

“Temos a oportunidade de crescer diante da adoção cada vez maior da cafeteria como um third place [um lugar que você frequenta além de sua casa e de seu trabalho]. Foi um conceito que começou a ganhar força por aqui com a entrada da rede Starbucks. Hoje, vemos as cafeterias cheias de pessoas fazendo negócios às seis e sete horas da noite. Isso não acontecia quinze anos atrás.”

A rede emprega 250 funcionários diretos e eles são o diferencial da empresa. O primeiro passo é contratar apenas pessoas que tenham seus valores profundamente alinhados aos da empresa - por exemplo, exibir “amor”, “integridade” e “foco no cliente”.

A criação de uma cultura não imposta, mas vivida por todos os funcionários, é a chave para que o negócio evolua no lugar de apenas sobreviver. “O Santo Grão continua sendo, todos os dias, fundado. Formar as pessoas que vão continuar replicando o negócio é nosso maior desafio.”

Marco Kerkmeester, do Santo Grão, em palestra no EXAME Mentoria PME

(Fabio Santana/Biofoto/Divulgação)

Para os já contratados, o Santo Grão investe 120 mil reais todos os anos em cursos de coaching, neurolinguística e liderança situacional. Também há oficinas de criação de novos pratos e de atendimento a cliente.

“Somos um café, mas nosso maior investimento é em educação para que as pessoas identifiquem quem são e que tenham coragem de expressar seus propósitos não apenas por palavras, mas pelos produtos que oferecemos”, detalhou Kerkmeester em entrevista anterior a EXAME. “Se o cliente recebe o café e não o aprova, eu espero que o barista pergunte, prove e busque uma bebida que deixe ambos satisfeitos. Também espero que os garçons contem seus pratos preferidos e, ao mesmo tempo, falem das especialidades da casa. É assim que trabalhamos e expressamos nossos produtos.”

Incentivar pequenas (mas significativas) responsabilidades a cada barista ou garçom gera futuras lideranças. Das oito unidades do Santo Grão, apenas uma é própria. Todas as outras foram fundadas por ex-funcionários da rede (e agora sócios). A arquitetura e design de cada cafeteria expressam as preferências de cada gestor. "Meu estilo de sucessão é simplesmente dar corda", resumiu Kerkmeester aos empreendedores no EXAME Mentoria PME.

A atitude dos funcionários de Kerkmeester remete à de funcionários de empresas como a Netflix. A gigante do streaming possui um manifesto, chamado “Cultura Netflix: Liberdade e responsabilidade”, que permite aos funcionários decidirem qual seu horário de trabalho e quando vão tirar férias, por exemplo. Para a Netflix, regras costumam afastar os funcionários de alta performance. Diante de um valor de mercado de mais de 160 bilhões de dólares, fica difícil argumentar contra. E, como mostra Kerkmeester, não é uma atitude apenas praticável pelas maiores empresas do mundo.

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