Benjamin Steinbruch: "Estamos com um crescimento orgânico nos nossos projetos e estamos olhando para novas oportunidades, mas a ideia para o futuro é a separação dos negócios por produto" (Leandro Fonseca/Exame)
Victor Sena
Publicado em 9 de novembro de 2021 às 10h20.
Última atualização em 10 de novembro de 2021 às 09h49.
Mesmo que o valor do minério de ferro esteja em queda, a disparada no preço da commodity entre 2020 e 2021 ajudou a siderúrgica e mineradora CSN a lidar com um velho problema: a dívida e a alavancagem.
A empresa divulgou os resultados do terceiro trimestre na última semana, que até mostram uma queda na receita de 33%, para 10,2 bilhões na comparação trimestral devido à queda do preço do minério e de baixa nas vendas do aço. Ainda assim, neste ano a empresa já tem uma receita líquida de 37,5 bilhões de reais, valor 85% maior que o mesmo período do ano passado.
Outro dado também mostra como a empresa tem vivido um bom momento. Em setembro, a dívida líquida (dívida bruta menos o caixa disponível) estava em 14,7 bilhões.
O valor teve um leve aumento em comparação ao trimestre anterior, mas um índice importante mostrou queda. A alavancagem da empresa continua caindo e está em 0,6 x.
Esse índice mostra em quantos anos a empresa quitaria suas dívidas levando em conta o EBITDA atual (Lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização). Com bons resultados financeiros de vendas, a empresa está com esse índice abaixo de 1. No segundo semestre de 2020, ele estava em mais de 5x.
Em entrevista à EXAME por e-mail antes da divulgação dos resultados de semana passada, o presidente da empresa, Benjamin Steinbruch afirma que essa redução só foi possível depois de "muito trabalho duro".
"Sempre íamos ao mercado e todos nos diziam que adoravam a CSN, adoravam a história da CSN, mas que a percepção de risco tinha mudado e que, hoje, uma empresa para ser considerada de baixo risco tinha de ter uma alavancagem de quase zero. Observamos isso, nos preparamos e chegamos a isso agora em 2021", diz o executivo.
A CSN conseguiu diminuir sua alavancagem de forma muito boa, além disso teve um IPO da CSN Mineração de sucesso e aproveitou a alta do minério nos anos mais recentes para fazer caixa. Tudo isso são sinais positivos, mas que ações a empresa toma para se proteger das oscilações cíclicas do preço da commodities?
Realmente a CSN fez um trabalho muito forte em termos de desalavancagem e, com isso, conseguimos sair de uma situação bastante alavancada para uma situação muito conservadora (saindo de 8,5x para abaixo de 1x). Isso, para nós, é uma bandeira e uma premissa fundamental em termos de continuidade. Há muito tempo, trabalhamos duro para conseguir chegar a esse resultado e nós nos comprometemos a manter a alavancagem abaixo de 1x.
Sempre íamos ao mercado e todos nos diziam que adoravam a CSN, adoravam a história da CSN, mas que a percepção de risco tinha mudado e que, hoje, uma empresa para ser considerada de baixo risco tinha de ter uma alavancagem de quase zero. Observamos isso, nos preparamos e chegamos a isso agora em 2021.
Estamos com um crescimento orgânico nos nossos projetos e estamos olhando para novas oportunidades, mas a ideia para o futuro é a separação dos negócios por produto, criando uma moeda única para cada segmento (ou seja, a mineração vai ter a sua ação, siderurgia a sua ação, etc.).
Com isso, conseguimos aproveitar essas oportunidades sem necessariamente captar novos recursos e consequentemente alavancar a companhia. Nós estamos alicerçados para o presente e para o futuro em termos de crescimento, tendo como premissas o ESG, a baixa alavancagem e o uso de novas tecnologias.
Nós sempre trabalhamos muito forte na parte de custos. Em março do 2020, quando a situação mundial piorou devido à pandemia, nós reduzimos drasticamente os custos, preparando a companhia para uma guerra. Mas com a melhora do mercado a partir de maio, a companhia conseguiu viver um bom período, trazendo um resultado positivo e a desalavancagem. Conseguimos, a partir disso, aproveitar novas oportunidades.
Há ociosidade na economia brasileira, com menos demanda interna de aço do que poderia haver caso o país estivesse crescendo em níveis do seu PIB potencial, por exemplo. A economia estagnada há quase 10 anos não atrapalha a CSN? Qual a avaliação do senhor dos caminhos macroeconômicos que o país tem tomado e como isso reflete no setor siderúrgico e, em última instância, no caixa da CSN?
Nós realmente não encontramos o crescimento e estabilidade desejado por todos para a economia brasileira. É uma pena que isso ocorra, já que o Brasil é um país cheio de oportunidades. Nós temos uma econômica pujante, um setor financeiro estruturado, nós temos muito bons empresários e temos companhias que sobreviveram às oscilações bárbaras da economia em termos de juros altos, inflação alta e recessão. Temos uma classe empresarial bastante potente e uma classe trabalhadora preparada, disponível e disposta ao trabalho.
Nós poderíamos estar aproveitando muito mais esses momentos favoráveis ao Brasil em termos da demanda por commodities, matéria-prima e proteína. Também poderíamos aproveitar o aquecimento da demanda global e fazer com que o mercado interno pegasse carona no bom momento de juros baixos e a demanda externa alta para criação de empregos. O segredo que é pouco explorado no Brasil, e que temos que ter dedicação e prioridade máxima, é na criação de empregos. Nós somos hoje mais de 200 milhões de pessoas, temos um potencial no mercado de consumo absurdo, com condições favoráveis para a produção interna. Temos um país rico no agronegócio e em matérias-primas, condições climáticas muito favoráveis. Temos tudo para entrar em um ciclo positivo.
A questão da infraestrutura no país tem de ser priorizada, já que no Brasil nós precisamos fazer tudo: rodovias, ferrovias, portos, aeroportos e moradia. O Brasil, se tomar o caminho certo, fica auto impulsionado pela demanda que nós temos e com plena condição de atendimento. A fórmula é a mesma, é antiga. Precisamos ter um Estado menor e uma economia maior. Precisamos deixar para o Estado aquilo que é realmente necessário: educação, saúde, segurança, e criação e execução de leis. E para o resto, temos pessoas muito boas para tomar responsabilidade e executar, que não faz sentido um Estado que tenha uma participação exagerada na economia. Mas isso é um desejo antigo, quem sabe um dia a gente consiga realmente aprender com aquilo que nós mesmos criamos, em termos de consumo interno e exportação e explorar tudo que nós temos de bom e favorável.
Como o senhor vê a pauta de descarbonização das economias globais que devem afetar o futuro da siderurgia? Não há substituto para o aço, mas exigem-se processos mais limpos em sua operação. Desde a mineração até os processos finais. Alguns analistas citam a atual queda do valor do minério como reflexo de um posicionamento da China de readequar suas operações siderúrgicas a operações mais verdes e isso poderia influenciar na quantidade da sua demanda. Como o senhor avalia o atual cenário de preços e como a CSN pretende se manter limpa e relevante?
Sem dúvida a questão da descarbonização é uma preocupação de todos. Queremos cada vez mais praticar uma produção mais limpa em todos os nossos segmentos. Acredito que ainda há muito a se evoluir em relação a isso. Tivemos avanços tecnológicos significativos e, hoje, já existem condições de investimentos em novos processos para uma produção mais limpa. Estamos olhando e avaliando a jornada de descarbonização das nossas operações, com vários esforços concentrados neste tema. Já apresentamos metas agressivas de descarbonização para 2030, além de realizar investimentos em projetos focados no ESG e descarbonização.
Em relação à China, eu acredito que tem a ver um pouco com essa questão da produção verde e novas tecnologias. Isso porque as fábricas do interior da China são muito antigas e emitem bastante poluição. Com isso, está havendo a diminuição da produção dessas unidades. Eles também têm um problema na questão de energia que por ter uma carência grande de energia, a China está sendo obrigada a diminuir a produção.
A CSN está caminhando para certamente ser um marco e uma referência com relação ao futuro em termos de produção verde. Estamos observando novas técnicas e fazendo parte como prioridade da economia descarbonizada.
Falando especificamente da CSN Mineração, quais são os diferenciais desta divisão na comparação com outra mineradoras e comentasse sobre a estratégia da empresa para fazer frente aos outros grande player mineradores?
Na CSN Mineração, nós estamos aproveitando aquilo que já tínhamos, ou seja, uma reserva mineral fantástica no Sudeste. A reserva Casa de Pedra é a melhor reserva de minério de ferro do Brasil na região Sudeste. Nós temos uma província mineral com bilhões de toneladas de minério a ser explorado, de qualidade e de baixo custo. O segredo para esse negócio é o potencial de crescimento. Nós estamos nos propondo a triplicar a quantidade produzida em 10 anos. Passar das 33 milhões de toneladas que fazemos hoje para 100 milhões de toneladas.
Com a infraestrutura já integrada de ferrovias e portos, com um terreno único e com uma qualidade de minério excepcional, temos hoje um produto que atende à principal demanda do mercado mundial, que é uma concentração de ferro alto e com baixo teor de poluição. Na medida que é concentrado vamos produzir no futuro um pellet feed com 67% de teor de ferro.
Com isso, nós nos encaixamos dentro daquilo que o mercado mundial deseja com uma qualidade e quantidade excepcionais. Nós também sempre trabalhamos de acordo com o melhor em termos tecnológicos. Com relação às barragens, nós fomos pioneiros no trabalho a seco e já estamos no processo de descomissionamento de todas as nossas barragens. O diferencial é produzir, com baixo custo, um minério de ótima qualidade, que se enquadra dentro de um produto que é de alta demanda no mercado mundial hoje.