Sonegação fiscal: empresas com dívidas recorrentes acumulam prejuízos bilionários aos cofres públicos (Simon Carter Peter Crowther/Getty Images)
EXAME Solutions
Publicado em 2 de dezembro de 2025 às 16h00.
A dívida acumulada por devedores contumazes só com impostos federais já chega aos R$ 86 bilhões, segundo dados públicos compilados pelo Instituto Combustível Legal (ICL). O valor equivale a quase quatro vezes o orçamento federal de segurança pública aplicado em 2024, de R$ 21 bilhões. Para especialistas do setor, o cenário demonstra como a sonegação recorrente compromete a arrecadação e limita investimentos essenciais.
O devedor contumaz, explica o presidente do Instituto Combustível Legal (ICL), Emerson Kapaz, é a empresa que deixa de recolher tributos de forma sistemática e adota a sonegação como modelo permanente de operação.
“Não é o empresário que enfrenta dificuldades temporárias. É quem, por exemplo, nunca paga e cria CNPJs para manter o esquema”, diz. O instituto afirma que, em alguns segmentos, essa prática gera vantagens competitivas de até 30%.
Estados com grande concentração econômica mostram a dimensão do problema. Em São Paulo, dívidas associadas a comportamentos contumazes somam R$ 39 bilhões. No Rio de Janeiro, o montante chega a R$ 27,8 bilhões. Em ambos os casos, os valores superam os gastos anuais em segurança pública, em 2024 — R$ 16,6 bilhões em São Paulo e R$ 16 bilhões no Rio. No setor de combustíveis, a dívida ativa acumulada já se aproxima de R$ 200 bilhões, segundo o ICL.
Kapaz afirma que o ambiente favorece a entrada do crime organizado em setores com alta carga tributária. “Grupos criminosos perceberam que é mais vantajoso faturar nesses segmentos do que atuar no tráfico de drogas”, afirma.
Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), essas organizações movimentam R$ 160 bilhões por ano em combustíveis, bebidas, fumo e ouro, com R$ 62 bilhões apenas no mercado de combustíveis.
Para enfrentar esse cenário, o PLP 125/2022, em análise na Câmara dos Deputados, propõe critérios objetivos para identificar empresas que operam como devedoras contumazes.
A partir dessa classificação, a Receita Federal poderá aplicar um regime especial de fiscalização que condiciona a emissão de notas fiscais ao pagamento dos tributos correspondentes. “O projeto interrompe a formação de novas dívidas e abre caminho para negociar o passivo existente”, afirma Kapaz.
Segundo o ICL, a medida pode recuperar R$ 14 bilhões por ano apenas no setor de combustíveis. O instituto afirma que a proposta beneficia o mercado ao permitir competição em condições mais equilibradas, com impacto direto sobre arrecadação e investimentos públicos, sem a necessidade de criação de qualquer novo imposto. A mudança atinge um grupo reduzido: cerca de mil empresas entre mais de 20 milhões de CNPJs no país.
O ICL atua em cooperação com órgãos federais e estaduais no combate à sonegação, fornecendo informações que apoiaram operações de fiscalização, como a Carbono Oculto. A entidade mantém convênios com a Receita Federal e secretarias de Fazenda para monitorar irregularidades no setor de combustíveis.
Em entrevista à EXAME, Kapaz detalha como a sonegação recorrente afeta a concorrência, explica o funcionamento do PLP 125/2022 e comenta a expectativa do instituto para a votação em regime de urgência. Segundo ele, o projeto oferece uma alternativa para ampliar a arrecadação sem a criação de novos tributos. Assista: