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O papel da Orsa

Um projeto impulsiona os sonhos de filhos de catadores de lixo

EXAME.com (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 14 de outubro de 2010 às 13h16.

Durante uma oficina de confecção de bijuterias, a sorridente Lígia, de 12 anos, diz aos colegas o que pensa sobre si mesma: "Eu sou o máximo!" Ela chegou de Alagoas há sete meses com a família de migrantes. Seu pai é motoboy, e seu tio, catador de papel. "Eu queria ser atriz e gosto das aulas de teatro", diz Lígia. "Fazer capoeira também é bom, porque hoje as novelas têm muitas brigas." Junto com outros 50 adolescentes e crianças, Lígia participa das oficinas do Projeto Formação num dos locais mais degradados da região central de São Paulo, a Baixada do Glicério. Mantido pela Fundação Orsa, o programa é voltado para familiares de catadores de lixo com idade de 7 a 17 anos. O objetivo do Formação, com atividades como artesanato, teatro, dança e música, é complementar a educação formal dos jovens e desenvolver uma visão de mundo que vá além da dura realidade de quem depende do lixo para sobreviver.

Antes de participar do Formação, muitas crianças passavam o dia acompanhando os pais e até dormiam em depósitos de papel. "A situação social deles gera falta de sonhos e de perspectivas", diz o educador Alexandre Randi, coordenador nacional do Formação. "Isso acaba tendo efeitos tão ruins quanto os da exposição à violência ou ao uso de drogas." A tônica do projeto é mostrar a jovens carentes que eles podem agir para melhorar sua condição e sonhar com um futuro melhor -- coisa que Lígia, por exemplo, já faz muito bem. Mas isso não significa desvalorizar o trabalho do catador de lixo. No Glicério, os educadores demonstram que essa atividade é fundamental para a limpeza do centro e ajuda, por meio da reciclagem, a preservar o meio ambiente. A importância de reaproveitar o lixo é aprendida na prática, com oficinas -- como as que transformam embalagens vazias em brinquedos, instrumentos musicais e objetos como porta-retratos.

O Formação existe em 12 cidades, nas regiões Norte, Centro-Oeste e Sudeste. A unidade mais antiga, a de Campinas, tem oito anos. Os recursos para seu funcionamento vêm do Grupo Orsa, fabricante de papel e embalagens, que dedica 1% do faturamento às atividades sociais da Fundação Orsa (veja entrevista ao lado). A unidade do Glicério, a única da Grande São Paulo, existe desde 2001. A sede atual foi inaugurada em setembro passado, com instalações mais adequadas para receber os jovens.

De segunda a sexta, crianças e adolescentes freqüentam o local de manhã ou à tarde, deixando o outro período para a escola -- praticamente todos estudam. Eles recebem gratuitamente alimentação e atendimento médico. Nos fins de semana, há atividades de promoção social com os pais e os familiares. Há também debates sobre temas como a convivência familiar e exposições dos objetos produzidos pelas crianças. O foco não é ensinar habilidades para garantir renda extra para os jovens, mas sim para mudar a mentalidade deles. A idéia é ir além da conhecida opção entre "dar o peixe" e "ensinar a pescar". "Às vezes há água que não tem peixe", diz Randi, referindo-se a dificuldades como a falta de emprego. "Por isso, só aprender uma habilidade específica não resolve os problemas sociais."

O Formação não exclui a possibilidade de as atividades artísticas virarem uma profissão e uma fonte de renda. Isso aconteceu em Campinas, onde surgiu o grupo musical Bate Lata, que gravou um disco em 1999 com a participação de músicos como Caetano Veloso e Netinho. Em outras unidades do projeto, parte da produção artesanal das crianças é vendida. A assistente social Jaqueline Eugênio, que trabalha no Glicério, encara com serenidade o futuro das crianças que acompanha diariamente. "Pode ser que a maioria dos que vêm aqui também se tornem catadores, como seus pais e tios", afirma Jaqueline. "Mas serão mais conscientes de sua condição e de seus direitos."

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