Carnes: Carrefour lançou plataforma de sustentabilidade em que consumidor pode saber o local da produção do produto (Frederic Jean/Exame)
Da Redação
Publicado em 4 de julho de 2018 às 17h14.
Última atualização em 6 de julho de 2018 às 19h36.
Faz tempo que carne deixou de ser commodity para as grandes redes de supermercado. Uma mistura de preocupação com sustentabilidade e com a qualidade dos produtos levou as companhias a investir no desenvolvimento de cortes cada vez melhores – e mais caros.
O varejista francês Carrefour deve dar um novo passo nesse caminho no próximo dia 10, quando anuncia no Mato Grosso um investimento de cerca de 18 milhões de reais, em parceria com a holandesa Iniciativa para o Comércio Sustentável (IDH, na sigla em holandês), em três anos para fomentar a criação de bezerros com pequenos produtores. É um projeto ambicioso, cujo lançamento contará com a presença do governador do estado, Pedro Taques, Laurent Vallée, secretário-geral do Grupo Carrefour na França e Noël Prioux, presidente do Grupo Carrefour no Brasil.
O acordo com o governo mato-grossense foi fechado em reunião com Taques e com representantes da Associação dos Criadores de Mato Grosso. Em outra iniciativa no estado, em 2016, o Carrefour lançou uma plataforma de sustentabilidade em que o consumidor pode saber o local da produção da carne.
Segundo o site Mato Grosso Agro, Paulo Painez, diretor de sustentabilidade do Carrefour, afirma que a ideia é dar subsídios para uma produção de carne sustentável e de qualidade. A iniciativa vai começar em duas regiões específicas (Vale do Juruena e Gaúcha Norte) e depois pode ser replicada em outros locais. Procurado por EXAME, o Carrefour confirmou o investimento, mas não concedeu entrevista.
O Walmart começou a vender em 2016 em lojas do Sudeste e Centro-Oeste a linha de carne sustentável Rebanho Xingu, produzida no interior do Pará em parceira com a ONG “The Nature Conservancy”. O plano da rede é expandir o monitoramento aos poucos para outras regiões. Segundo a varejista, desde 2015 todos os dados de fornecedores com frigoríficos na Amazônia estão incluídos numa base de dados que inclui 75.000 fazendas que fornecem para 30 plantas de empresas como JBS e Marfrig. O projeto usa satélites para monitorar a produção e evitar desmatamento ou uso de terras indígenas ou áreas de conservação.
O próprio Carrefour já havia anunciado, em 2016, um acordo com a ONG ambientalista Greenpeace para monitorar sua rede de fornecedores para bloquear a compra de fazendeiros instalados em áreas de desmatamento ilegal. O Grupo Pão de Açúcar também tem iniciativas de monitoramento da origem da carne e parcerias com produtores para melhorias na qualidade do produto.
A sustentabilidade ajuda a fisgar consumidores mais exigentes, claro, mas a qualidade da carne, no fim das contas, é o que conta. O crescente investimento das redes de supermercado é uma proteção em um mercado mais e mais segmentado. Brasil afora grandes e pequenos açougues focados em carnes premium passaram a tirar os clientes mais exigentes dos super e dos hipermercados. Com decoração descolada e cortes exclusivos, esses endereços cobram até 100 reais no quilo da picanha ou do bife ancho. Alguns, como os paulistanos Feed e Debetti, passaram até a vender pela internet.
“Durante muitos anos a gente foi induzido a achar que a carne vem do supermercado, mas a carne vem da fazenda. Agora os consumidores querem saber de onde vem, a origem da carne e a qualidade”, diz Rogério Betti, dono do açougue paulistano Debetti e um dos principais embaixadores da mudança do padrão de consumo da carne no Brasil. “Ficamos muito tempo comendo carne de pouca qualidade porque os supermercados compravam toneladas a preços baixos, o que levava a margens apertadas e insatisfação para todos na cadeia”. Debetti começou em agosto do ano passado uma parceria para operar açougues em duas unidades do Carrefour, em São Paulo.
Para István Wessel, fundador do frigorífico Wessel, há 60 anos especializado em carnes nobres, a iniciativa do Carrefour e de outros varejistas visa a fazer também com que as redes sejam menos dependentes dos grandes frigoríficos, oferecendo cortes de produtos locais. “Esses novos consumidores querem saber tudo do boi”, diz.
O desafio, segundo ele, é convencer as pessoas a comprar também cortes menos nobres. Bois de grandes ou pequenos frigoríficos, de boa ou má qualidade, afinal de contas, têm apenas uma picanha. E a revolução no churrasco, para ser bem sucedida, deve chegar aos grandes varejistas, mas também a todos os tipos de carne.