Esteves, do BTG, é o único do Brasil no ranking da Bloomberg
O banqueiro é o único brasileiro da lista da revista Bloomberg com 50 pessoas mais influentes nas finanças mundiais de 2012
Da Redação
Publicado em 11 de setembro de 2012 às 11h05.
São Paulo - No início de 2008, quando as perdas do UBS AG com apostas em financiamentos imobiliários de alto risco disparavam, André Esteves, já um bilionário antes dos 40, fez uma proposta ao banco de 150 anos no qual trabalhava.
O carioca forneceria capital tão necessário ao gigante suíço apenas dois anos após o UBS ter pago a ele e seus sócios US$ 3,1 bilhões pelo Banco Pactual. Em troca, Esteves teria uma fatia controladora, de acordo com pessoas a par dos planos. O conselho do UBS rejeitou a oferta e Esteves deixou o cargo de chefe global de renda fixa.
Com o aperto de caixa do UBS se aprofundando em 2009, Esteves e alguns ex-sócios ofereceram US$ 2,5 bilhões para recomprar o Pactual. Dessa vez o UBS aceitou. Desde então, Esteves, 44 anos, transformou o que é hoje o Grupo BTG Pactual em uma potência regional que desafia concorrentes mundiais enfraquecidos e instituições locais ainda sólidas.
O banqueiro é o único brasileiro da lista da revista Bloomberg Markets com 50 pessoas mais influentes nas finanças mundiais em 2012.
Com seu banco na primeira posição no ranking de líderes em renda variável no Brasil neste ano, Esteves brinca que a sigla BTG -- oficialmente Banking and Trading Group -- significa Better Than Goldman, ou melhor do que o Goldman.
Esteves está liderando a guinada em um universo antes dominado por Wall Street à medida que ele acumula mais influência na maior economia emergente depois da China. Ele conta com a ajuda do que chama de pior momento das finanças globais: mau comportamento que vai desde a perda de bilhões de dólares com derivativos pelo JPMorgan Chase & Co. à manipulação da taxa Libor pelo Barclays Plc e outras instituições.
"Muita coragem"
O Goldman Sachs Group Inc., que já foi a instituição mais lucrativa de Wall Street, registrou retorno sobre o patrimônio de 5,4 por cento no segundo trimestre; o BTG deu retorno de 30,8 por cento.
“Ele tem muita coragem e peito e faz as coisas acontecerem”, diz Arthur Byrnes, que supervisiona quase US$ 1 bilhão como presidente da Deltec Asset Management LLC em Nova York e não detém ações do BTG. “Meu único conselho é: não vá depressa demais.”
Esteves, que mistura o português com expressões em inglês como “value proposition”, diz que continua admirando os presidentes do JPMorgan e do Goldman, Jamie Dimon e Lloyd Blankfein, respectivamente.
Alejandro Vollbrechthausen, presidente do Goldman Sachs no Brasil, diz que o sentimento é mútuo.
“Esses caras são fantásticos”, diz ele, referindo-se ao BTG. “Às vezes eles são nossos clientes, às vezes, nossos concorrentes, às vezes, nossos parceiros de negócios.”
Mastodontes
Ainda assim, Esteves compara os maiores bancos com mastodontes.
“Os grandes bancos mundiais, sem entrar em nomes específicos, eles estavam muito descontrolados, muito pouco regulados, muito sem dono”, disse Esteves na sede do BTG em São Paulo. “Ainda vamos ter anos de transformação, parte dessa transformação é um certo encolhimento. Obviamente que isso é uma oportunidade.”
Desde 2008, como presidente executivo e do conselho do BTG, Esteves tem agido para tirar proveito do transtorno dos grandes bancos. Ele triplicou o total de ativos sob gestão para mais de R$ 170 bilhões. Abriu escritórios em Hong Kong, Londres e Nova York e comprou corretoras no Chile e na Colômbia.
O BTG obteve a maior parte da receita de R$ 3,2 bilhões do primeiro semestre especulando com seu próprio capital -- apostando especialmente na queda dos juros no Brasil e na melhora do mercado de financiamentos imobiliários dos Estados Unidos. A segunda maior fatia da receita veio de corretagem.
IPO do BTG
A temporada de Esteves no UBS foi como um MBA, diz Marcelo Mesquita, que foi co-chefe de renda variável para Brasil do banco suíço.
“A internacionalização do negócio foi muito consequência dessa experiência global”, diz Mesquita, que hoje comanda a gestora de recursos Leblon Equities no Rio de Janeiro.
Esteves venceu a turbulência nos mercados globais em abril ao realizar uma abertura de capital em São Paulo e Amsterdã que pôs o valor de mercado do BTG em US$ 14,5 bilhões. Com pouca variação na ação, a participação de Esteves de 22,5 por cento é avaliada ao redor de US$ 3 bilhões.
Desdenhando como temporário o aumento na inadimplência que acompanhou a recente desaceleração da economia doméstica, Esteves compara o Brasil aos EUA de 50 anos atrás, quando a numerosa geração de “baby boomers” -- pessoas nascidas depois da Segunda Guerra Mundial até o início dos anos 1960 --entrou em um mercado de trabalho em processo de urbanização.
"Ditadura do argumento"
Além de investimentos em energia e infraestrutura, o BTG coloca recursos de fundos de private equity em empresas posicionadas para faturar com a expansão da classe média no Brasil: redes de farmácias, lojas de vestuário e empresas do setor imobiliário. Em parte porque a economia brasileira, nas palavras dele, “is starving for capital” -- tem fome de capital --, Esteves não precisa fazer as enormes apostas que humilharam banqueiros do Hemisfério Norte. O juro brasileiro, historicamente o mais elevado entre as principais economias, também encarece a alavancagem.
Esteves critica os salários e bônus excessivos de profissionais dos bancos nos EUA e Europa por separarem o risco da compensação. “O cara dava tudo errado, ele mudava de emprego e não perdia nada”, disse ele.
Ele está construindo uma abordagem diferente, que inclui convidar os profissionais de melhor desempenho entre mais de 160 sócios a comprar mais ações do BTG todo ano pelo valor contábil. Os de pior desempenho precisam vender parte das ações. Pérsio Arida, ex-presidente do Banco Central que se juntou a Esteves em 2008 e ajudou a preparar a recompra do Pactual, diz que a capacidade de persuasão de um sócio é mais importante do que o grau de experiência -- o que ele chama de “ditadura do argumento”.
Pizza de domingo
Esteves trabalha na mesa de operações da tesouraria do banco, de frente para um corredor bege sem obras de arte. O BTG não comprou o jato executivo que ele usa para viagens de negócios nem paga pelo combustível ou manutenção da aeronave. Ele tira duas semanas de férias por ano. Uma delas foi em julho, quando viajou com a esposa e os três filhos pequenos para a Turquia. Seu rosto tem um bronzeado brilhante que contrasta com o grisalho das têmporas.
Todo domingo, Esteves convida executivos para comer pizza em sua casa e discutir negócios. Para Arida, que hoje preside o braço de gestão de ativos de terceiros do BTG, pode ser difícil sustentar essa cultura à medida que o banco cresce.
Mentores
Esteves disse que dois mentores trouxeram a meritocracia ao setor financeiro brasileiro: Jorge Paulo Lemann -- o magnata de 73 anos que orquestrou a fusão que resultou na Anheuser-Busch InBev NV em 2008 e que era o segundo homem mais rico do Brasil em meados de agosto -- e Luiz Cezar Fernandes, 67 anos, que fundou o Pactual em 1983.
Em entrevista à revista Época em 2009, Lemann disse que ele e Esteves haviam falado sobre injetar capital no UBS, mas não levaram as conversas adiante. Esteves diz hoje que eles não tentaram comprar o controle do banco suíço.
Fernandes contratou Esteves, então cursando a Universidade Federal do Rio de Janeiro, como técnico de informática em 1989. Criado pela mãe, uma professora de psicologia da educação, Esteves precisava do emprego para pagar o empréstimo para compra de um carro, que foi roubado em seu primeiro dia de trabalho. Esteves foi promovido a operador de renda fixa em 1990 e logo em seguida foi chefiar a divisão de gestão de ativos de terceiros, que estava sendo criada.
Participação em bônus
À medida que a fatia dele nos bônus aumentava, também aumentava sua participação no banco. Para capturar uma fatia maior, ele aproveitou do infortúnio de seu mentor. Fernandes estava endividado após ter diversificado para têxteis, embalagens e suco de laranja. Em 1998, Esteves e seus parceiros exigiram que Fernandes abrisse mão de participação em troca de empréstimos. Fernandes aceitou e saiu.
Em entrevista à revista Piauí em 2006, Fernandes disse que Esteves venderia a própria mãe para chegar ao poder. Hoje ele elogia a ambição do antigo protegido.
Esteves já teve problemas com as autoridades reguladoras. Em três casos isolados desde 1999 o Banco Central e a Comissão de Valores Mobiliários acusaram o Pactual de transferir lucros ilegalmente para fundos estrangeiros para sonegar impostos.
Esteves e os sócios receberam advertências nos dois primeiros incidentes. No terceiro, ele e outro sócio foram obrigados a pagar juntos R$ 100 mil e o Banco Pactual pagou outros R$ 4 milhões. O caso foi encerrado em 2007 sem qualquer admissão de culpa.
Concorrendo em igualdade
Este ano, antes da abertura de capital do BTG, a autoridade reguladora do mercado acionário italiano confiscou 4,2 milhões de euros (R$ 10,9 milhões) em ativos e multou Esteves em 350.000 euros por suspeita de uso de informação privilegiada. A agência alegou que ele comprou ações do frigorífico Cremonini SpA em novembro de 2007 já sabendo da joint venture iminente com a JBS SA. Ele recorreu, dizendo que as alegações não tinham fundamento, e a multa foi cancelada. O caso ainda está pendente.
À medida que sua influência se expande, Esteves contrata talentos da velha guarda. “Aquilo que a gente faz aqui no Brasil e que fazemos hoje em grande parte da América Latina acho que nós fazemos com a mesma qualidade ou melhor do que os melhores globais”, disse ele.
Esteves prevê um novo cenário para o setor financeiro dentro de uma década. “A gente vai ter alguns poucos bancos verdadeiramente globais competindo com campeões regionais, e competindo de igual para igual”, disse ele.
Enquanto os mastodontes perdem a confiança do público e vêm seus lucros exagerados caírem, Esteves, o audaz insurgente dos mercados emergentes, pode se dar conta de que BTG significa algo raro nos dias de hoje: Bank That Grows, ou banco que cresce.