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Da Redação
Publicado em 28 de agosto de 2021 às 08h00.
No final de agosto, Elizabeth Holmes deverá ir a julgamento para se defender contra várias acusações de conspiração e fraude. Se condenada, a fundadora e ex-diretora executiva da Theranos, infeliz startup de exames laboratoriais, pode pegar até 20 anos de prisão.
As acusações incluem mentir aos pacientes sobre a eficácia de seus exames de sangue e enganar investidores ao lhes dizer que a empresa geraria 1 bilhão de dólares em receita em 2015. Na realidade, os exames apresentaram graves problemas e Holmes supostamente sabia que a empresa geraria apenas alguma coisa além de cem mil dólares naquele ano.
A Theranos — que já foi avaliada em 9 bilhões de dólares — tornou-se uma das mais espetaculares derrocadas da história da tecnologia moderna. Agora, depois de vários atrasos por causa da pandemia e da gravidez de Holmes (ela teve um bebê em julho), o tão esperado drama jurídico, que deverá durar três meses, está programado para começar no tribunal federal em San Jose, na Califórnia.
A promotoria tem um caso forte, de acordo com conversas com inúmeros especialistas jurídicos. Mas a equipe de defesa de alto nível de Holmes ainda tem várias opções — como alegar boas intenções, chegar a um acordo de última hora ou alegar "doença mental" ao afirmar que o trauma prejudicou o raciocínio de Holmes. Seus advogados se recusaram a comentar.
Um de seus argumentos mais fortes pode ser que a única coisa da qual ela tenha sido culpada foi seu otimismo. Alguns especialistas esperam que Holmes afirme que ela acreditava verdadeiramente na Theranos e, portanto, não enganou ninguém intencionalmente.
“Como ninguém pode ler a mente de outra pessoa, a defesa provavelmente tentará levantar dúvidas razoáveis sobre o que havia na mente dela”, diz Barbara McQuade, ex procuradora do Distrito Leste de Michigan, nos EUA, que leciona na Faculdade de Direito da universidade do mesmo estado. Holmes pode argumentar que “ela simplesmente se envolveu na cultura do Vale do Silício de fingir até obter sucesso”, diz ela.
Tampouco está claro se a própria Elizabeth Holmes irá para o banco de testemunhas. Se o fizer, os promotores poderão interrogá-la, o que acarreta grandes riscos. “A maioria dos advogados de defesa reluta que seu cliente testemunhe”, diz James Melendres, ex promotor que se tornou advogado de defesa criminal. “Promotores passam toda a vida profissional aprimorando sua capacidade de conduzir contra interrogatórios”.
Mesmo assim, como figura pública com dom de persuasão, Holmes pode estar predisposta a tentar conquistar os jurados. Em 2015, ela fez uma apaixonada defesa de sua empresa depois que reportagens investigativas no Wall Street Journal levantaram sérias questões sobre a precisão de sua tecnologia de exame de sangue e revelaram que a Theranos executou a maioria de seus testes em máquinas tradicionais de outras empresas.
“Isso é o que acontece quando se trabalha para mudar as coisas”, disse Holmes na CNBC logo após a primeira exposição do Journal. "Primeiro eles acham que você é louco, depois brigam com você e, então, de repente, você muda o mundo."
Holmes também pode destacar as notórias e bem conceituadas pessoas que fizeram parte do conselho da Theranos, incluindo os ex-secretários de Estado George Shultz e Henry Kissinger. Seus advogados poderiam apontar que eles apoiaram Holmes enquanto ela trabalhava para levar a tecnologia ao mercado e não se opuseram à sua liderança.
Os membros do conselho podem realmente prejudicar o caso dela. Os promotores nomearam todos eles como testemunhas em potencial (Shultz morreu em fevereiro), e Joe Grundfest, professor e especialista em governança corporativa da Faculdade de Direito da Universidade de Stanford, espera que pelo menos alguns testemunhem. “O conselho pode simplesmente dizer, com toda razão: “Ela mentiu para nós’”, diz ele.
Holmes tinha a obrigação legal de ser honesta com seus diretores, uma responsabilidade que incluía revelar quaisquer problemas de que tivesse conhecimento com seus equipamentos de exames de sangue. De acordo com um acordo feito pela Theranos com o estado do Arizona, pelo menos 10% dos 1.5 milhão de exames que vendeu naquele estado entre 2013 e 2016 tiveram que ser anulados ou corrigidos.
Uma estratégia menos dramática para Holmes seria chegar a um acordo de confissão de culpa de última hora e cooperar com os promotores em seu caso contra seu ex namorado e ex-presidente da Theranos, Ramesh “Sunny” Balwani, que enfrenta as mesmas acusações em julgamento separado marcado para o início do próximo ano.
Qualquer acordo, entretanto, provavelmente incluirá um tempo significativo de prisão, e pode ser mais atraente para Holmes tentar convencer pelo menos um jurado de seus argumentos.
Também é possível que Holmes não apresente nenhuma defesa, mesmo que o julgamento prossiga. A estratégia, uma espécie de jiu-jitsu legal em que a defesa não apresenta depoimentos ou provas, depende de os jurados decidirem por si mesmos que os promotores não conseguiram provar sua tese além de qualquer dúvida razoável. Não é incomum em julgamentos criminais, e um júri empatado seria uma vitória para Holmes.
Talvez o maior curinga na defesa de Holmes seja se seus advogados chamarem Mindy Mechanic, psicóloga clínica da Universidade da Califórnia em Fullerton. A equipe legal de Holmes a identificou como uma possível testemunha.
Mechanic é especialista nas consequências psicossociais do trauma, com foco na violência contra a mulher. Ela poderia testemunhar sobre o que os processos judiciais descrevem como uma “doença ou defeito mental” que Holmes sofreu.
Isso não seria uma defesa de insanidade, por si só, mas sim um argumento para os jurados de que Holmes foi incapaz de elaborar a intenção de cometer fraude porque estava traumatizada por um relacionamento. Os detalhes de tal argumento permanecem em segredo, porque os principais processos judiciais sobre o assunto estão inacessíveis.
Qualquer que seja a abordagem final, especialistas jurídicos dizem que será difícil para Holmes superar as numerosas evidências que se acumulam contra ela. “Os processos por fraude têm como objetivo mostrar o que o réu disse e como isso se compara à verdade”, disse McQuade, a ex procuradora. “Nesse caso parece que suas mentiras podem ser objetivamente comprovadas por meio de testemunhas e documentos”.
— Tradução de Anna Maria Dalle Luche
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