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Eliane Lustosa, do BNDES: mais transparência na JBS

Para a diretora de mercado de capitais do BNDES, o papel do banco é cuidar dos interesses das empresas investidas e questionar sempre que necessário

Eliane Lustosa, do BNDES: "Se a empresa já tivesse um processo de sucessão definido, a substituição teria sido mais suave e transparente" (BNDES/Andre Telles/Divulgação)

Eliane Lustosa, do BNDES: "Se a empresa já tivesse um processo de sucessão definido, a substituição teria sido mais suave e transparente" (BNDES/Andre Telles/Divulgação)

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Letícia Toledo

Publicado em 19 de setembro de 2017 às 20h34.

Última atualização em 2 de outubro de 2017 às 15h16.

Sobram problemas e polêmicas envolvendo o frigorífico JBS. Um dos pontos acompanhados com especial atenção por analistas e investidores é a disputa com o BNDES, o segundo maior acionista da companhia, com 21% do capital, atrás apenas da família Batista, dona de 41% das ações. Paulo Rabello de Castro, presidente do BNDES, é um ferrenho defensor da saída da família do dia-a-dia da empresa, e ameaçou até contestar judicialmente a escolha do fundador, José Batista Sobrinho, como novo presidente, feita no fim de semana. Depois, voltou atrás. Nesta segunda-feira, o banco indicou dois novos conselheiros para a JBS, Cledorvino Belini, ex-presidente da Fiat Chrysler para a América Latina, e o empresário Roberto Penteado de Camargo Ticoulat, vice-presidente da Associação Comercial de São Paulo. A advogada Claudia Santos, outra conselheira indicada pelo BNDES, que concordou com a escolha de Batista Sobrinho, continua no cargo até dia 9 de outubro. O BNDES foi um dos maiores financiadores da JBS, um campeão nacional ungido pelos governos do PT. Hoje, o papel do banco na companhia e na economia nacional é tema de intensos debates. Sobre esses temas, EXAME ouviu Eliane Lustosa, diretora de mercado de capitais do BNDES.

Como a senhora avalia a escolha de José Batista Sobrinho como presidente da JBS, no lugar de Wesley Batista?

Se a empresa já tivesse um processo de sucessão definido, de preferência com uma consultoria especializada responsável por conduzi-lo, a substituição teria sido mais suave e transparente. Mas é importante ressaltar que essa é uma decisão que cabe ao conselho de administração, e foi o que aconteceu no caso da JBS. Cada conselheiro é responsável, na pessoa física, pelas decisões que toma e não vota de acordo com quem o indicou, mas levando em conta os melhores interesses da companhia. Nossa posição é buscar mais governança e transparência nos processos decisórios das empresas em que investimos e uma maior profissionalização. Temos a expectativa que a JBS vai caminhar nesse sentido.

Por quê?

A empresa criou um novo cargo, de chefe de operações globais, ocupado por Gilberto Tomazoni. Ele e outros executivos também fazem parte de um novo grupo de liderança na JBS. Esse pode ser o caminho na buscar de uma maior profissionalização. Nós temos como influenciar a companhia com a presença dos nossos conselheiros e as discussões geradas por eles.

Segundo a senhora, as discussões para a escolha de um sucessor de Wesley Batista estavam acontecendo há meses. Qual era a motivação do BNDES?

Estou no banco há um ano e pouco, então participei ativamente da discussão quando nós vetamos a mudança do domicílio da JBS para a Irlanda. Naquele momento não havia delação, não havia nada. Fizemos uma análise como estamos fazendo agora para avaliar o melhor interesse da empresa. Naquele momento foi uma análise complexa, difícil. A nova diretoria estava entrando na empresa, já havia uma aprovação no âmbito do conselho de administração e nós fizemos uma avaliação longa dos prós e contras e entendemos que os aspectos negativos eram mais relevantes e vetamos a operação. Eu fiz toda essa volta pra dizer que é absolutamente consistente o trabalho que o banco tem feito na JBS e fora dela. Desde o início, o banco tem uma política de conselheiros. O trabalho é indicar conselheiros independentes observando a boa governança. É um processo que tem sido muito importante, porque entendemos que, além de cuidar do nosso ativo, ao atuar na melhoria da governança das empresas, consequentemente o banco atua como um banco público. No caso da BNDESPar os terceiros são a sociedade brasileira, que é dona dos recursos. Se nós não fizéssemos o que estamos fazendo, nós não estaríamos cumprindo com a nossa responsabilidade fiduciária de um gestor público que tem esse dever.

O que mudou depois das delações de Joesley e Wesley Batista, reveladas em maio?

A discussão de governança foi avançando independentemente da delação. Mas, quando aconteceu a delação, surgiu uma nova questão importante: a nossa demanda por uma assembleia de acionistas. Nós entendemos que, a partir do momento em que os administradores da companhia confessam e nós tomamos conhecimento dos fatos que vieram à tona no âmbito da delação, é muito importante que haja uma investigação, absolutamente independente, para avaliar se de fato houve desvios de recursos da empresa e buscar as responsabilidades.

Dos oito conselheiros que a JBS tem hoje, cinco foram indicados pela família Batista. O BNDES tem apenas duas cadeiras. Como o BNDES conseguirá ter um papel relevante nas próximas decisões da companhia?

Os conselheiros respondem na pessoa física. A lei das S.As atribui responsabilidade aos conselheiros, que devem zelar pelo melhor interesse da empresa e não pela parte que o indicou. Se algum conselheiro está favorecendo uma parte em detrimento da empresa, isso é previsto e já houve punições na CVM.

O fato de a família Batista continuar como controladora é um risco?

A família Batista tem o controle da companhia e vota de acordo com o seu percentual econômico, isso é fato. Não é do interesse de nenhum acionista que a companhia tenha um desfecho ruim. Então entendo que o que nós precisamos ter de fato é a transparência e visão em relação ao que acontece no conselho. É fundamental que não só os conselheiros indicados pelo BNDES mas também os conselheiros independentes que hoje estão na companhia sejam de fato independentes, votando no melhor interesse da empresa. De fato, enquanto eles forem controladores, não há como negar o direito de exercer o seu voto de acordo com o seu interesse econômico. Cabe a nós garantir que o conselho de administração funcione adequadamente pra que a decisão seja a melhor possível pela companhia. A JBS não pode sofrer consequências alheias aos negócios da empresa.

O acordo de colaboração premiada de Joesley Batista foi rescindido. Qual é a sua expectativa quanto à resolução sobre o acordo de leniência da JBS?

Espero que essa resolução saia rapidamente para que a empresa fique blindada dessas questões.

O BNDES tem se posicionado mais sobre seus investimentos nos últimos meses, como aconteceu na JBS e na Oi. Trata-se de uma nova postura?

Com certeza. Nós temos tido uma grande interação nas assembleias e nos conselhos. Entendemos que é nosso dever buscar os nossos direitos e preservar o interesse da companhia. Pretendemos que a consequência dessa política seja interferir no mercado de capitais como um todo. Quando há alguma coisa que não nos parece razoável, não vamos hesitar em questionar a empresa. Um dos casos importantes, por exemplo, que não foi divulgado, foi o processo de migração da empresa de papel e celulose Suzano para o novo mercado. A ida da empresa de energia Eletropaulo para o novo mercado também foi resultado de discussões conosco. Isso faz parte do nosso dever de diligência em cuidar da empresa. E JBS é mais um caso desses.

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