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De olho na Avon, Natura tenta ser a Ambev dos cosméticos

A Natura assumiu uma estratégia "tipo Ambev" de crescer por incorporação de outras marcas com foco no mercado externo. Mas esse não é um caminho fácil.

(Leandro Fonseca/Exame)

Mariana Desidério

Publicado em 18 de setembro de 2018 às 15h34.

Última atualização em 18 de setembro de 2018 às 16h14.

São Paulo – O rumor de que a fabricante de cosméticos Natura estaria interessada em comprar a Avon , uma de suas principais concorrentes no Brasil, levantou as ações da Avon em Nova York, que subiram 20% ontem após o fechamento da NYSE e hoje operam em alta de quase 10%. A intenção foi negada pela companhia, mas vai ao encontro das recentes movimentações da Natura, que tem buscado crescer por meio de aquisições.

“A Natura tem assumido um posicionamento tipo Ambev , de crescer por incorporação de outras marcas”, afirma Marcos Gouvêa, da consultoria Gouvêa de Souza. O movimento começou em 2012, com a aquisição da Aesop, fabricante australiana de cosméticos presente em onze países. Em 2017 veio a compra da The Body Shop , gigante dos cosméticos com mais de 3 mil lojas e presença em mais de 60 países, com destaque para a  Europa. Pouco depois, a Natura criou uma holding, a Natura & Co., assumindo-se como uma empresa global.

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O que ainda não se sabe é se a Natura conseguirá emular o desempenho da gigante brasileira de bebidas Ambev e obter sucesso com as marcas adquiridas. “Tanto a Aesop quanto a The Body Shop são empresas que tinham um potencial de crescimento, mas não estavam acompanhando as transformações do mercado. A Natura entrou e está procurando injetar um pouco mais de foco  e agilidade para tirar benefício. Mas ainda é cedo para dizer se ela conseguiu uma transformação no desempenho dessas empresas”, afirma Gouvêa.

Assim como Aesop e The Body Shop quando foram adquiridas, a Avon não passa por seu melhor momento. No segundo trimestre deste ano, a receita da empresa diminuiu 3% na comparação anual, para 1,35 bilhão de dólares, e houve prejuízo de 37 milhões de dólares. Criada em 1886 ao recrutar mulheres para venderem perfumes de porta em porta, a Avon tem um valor de mercado de 900 milhões de dólares – mas já chegou a valer 20 bilhões de dólares. Os rumores sobre uma possível compra da companhia pela Natura são antigos. EXAME apurou que um tempo atrás a empresa estudou comprar a Avon. Tinha plano de negócios pronto, mas a oferta não chegou a ser feita por falta de acordo entre os sócios.

Na opinião de Sérgio Rebêlo, diretor-geral da empresa de consultoria e inteligência de mercado Factor-Kline, que acompanha o setor de cosméticos, se considerarmos apenas o mercado interno a aquisição faria mais sentido alguns anos atrás, quando a Avon tinha uma estrutura de logística superior à da Natura no Brasil. No entanto, ele lembra que a Natura está com os olhos voltados para fora do país, e nesse sentido a compra da Avon fica mais atrativa: a marca de origem norte-americana tem forte presença na Ásia, um mercado gigantesco para os cosméticos no qual a Natura praticamente não chegou.

“Qualquer player que queira participar no mercado de cosméticos precisa estar na Ásia. Apesar de a compra da The Body Shop ser um passo importante para a internacionalização da Natura, não é necessariamente o passo para entrar no mercado asiático. Como entrar ali? A Avon tem uma posição relevante”, analisa.

Para fora

Assim como na Avon, o modelo de negócio da Natura se baseia na venda direta, estrutura que tem sido pressionada com o avanço das compras online. Entre 2014 e 2016, a companhia perdeu ritmo e precisou se reinventar. Com isso, passou a olhar para diferentes modelos de venda – abriu lojas físicas e investiu no online – e se voltou para o exterior. A compra da The Body Shop foi a grande expressão desse movimento.

A opção de buscar outros mercados faz sentido do ponto de vista da expansão do negócio, mas isso não significa que é uma escolha simples. “A Natura está começando a entrar no terreno das grandes empresas do setor. Os Estados Unidos são o maior mercado, a Ásia também é gigantesca, e tem concorrentes fortíssimos. A Natura está saindo de um patamar de uma boa empresa nacional para brigar no mercado dos outros”, avalia Natan Rodeguero, diretor para América Latina da consultoria de inteligência de mercado M-Brain.

A lição de casa número um é arrumar a casa nas marcas adquiridas. “A Natura tem o desafio de lidar com o monstro que é a The Body Shop, uma aquisição que a posiciona numa outra dimensão de negócio, mas que atua numa dinâmica com a qual a Natura está pouco acostumada que é a das lojas físicas”, afirma Rebêlo, da Factor-Kline.

No caso da The Body Shop, as decisões até agora mostram que a intenção da Natura não é reinventar a roda, mas sim resgatar as qualidades da marca que se perderam nos últimos anos. Se for bem sucedida nessa fase, a Natura estará mais perto de provar que tem sim vocação para ser Ambev e se tornar uma multinacional de origem brasileira de sucesso.

O próximo passo será levar a marca Natura para outros mercados. Em entrevista recente, o presidente da empresa, João Paulo Ferreira, disse que a Natura pretende estar em 70 países num prazo de cinco a dez anos. Para isso é preciso resolver questões complexas de produção e logística. “É difícil fabricar aqui e vender lá fora. Uma alternativa é fabricar no exterior, mas para isso é preciso dominar toda uma cadeia, que envolve volumes gigantescos, e as marcas locais não vão ficar paradas enquanto isso acontece”, pondera Rodeguero, da M-Brain.

Sem contar a necessidade de aprender – e rápido – como se comportam os consumidores nesses outros mercados.  “No Brasil, a Natura já sabe que faixa etária compra o quê, lá fora os padrões são outros”, diz Rodeguero.

A Natura tem grandes ambições internacionais. Mas os investidores não ficaram muito animados com a Avon. O rumor do negócio impulsionou a companhia americana, mas teve efeito zero sobre os papeis da Natura, que estão no zero a zero nesta terça-feira.

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