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Carros: os campeões do encalhe

As montadoras instaladas no Brasil, como se sabem, vivem uma crise histórica. Até abril, as vendas caíram 26% ante o mesmo período de 2015, que já havia sido péssimo para o setor. Como costuma acontecer em toda crise, há as exceções. Os dez automóveis mais comercializados no país entre janeiro e abril responderam por 46% […]

MONTADORAS: Os cerca de 5 mil funcionários do setor produtivo da General Motors terão férias coletivas de 27 de fevereiro a 27 de março, em São Caetano do Sul / Germano Lüders (Germano Lüders/Exame)

MONTADORAS: Os cerca de 5 mil funcionários do setor produtivo da General Motors terão férias coletivas de 27 de fevereiro a 27 de março, em São Caetano do Sul / Germano Lüders (Germano Lüders/Exame)

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Da Redação

Publicado em 31 de maio de 2016 às 11h26.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 17h51.

As montadoras instaladas no Brasil, como se sabem, vivem uma crise histórica. Até abril, as vendas caíram 26% ante o mesmo período de 2015, que já havia sido péssimo para o setor. Como costuma acontecer em toda crise, há as exceções. Os dez automóveis mais comercializados no país entre janeiro e abril responderam por 46% das vendas totais de veículos. Foram 243.800 unidades divididas em uma dezena de modelos, ante todos os 533.600 carros vendidos no período.

No topo da lista aparece o Chevrolet Onix, que desbancou um reinado de 27 anos do Volkswagen Gol, e apenas nos quatro primeiros meses do ano teve 54.500 unidades emplacadas. Fazem companhia a ele, no pódio, o Hyundai HB20 e o Ford Ka, com 44.800 e 26.800 unidades, respectivamente.

Isso quer dizer que os demais modelos, cerca de 450, dividem todo o restante das vendas. Ou seja: é show de horror mesmo. Segundo a Federação Nacional de Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave), 104 modelos venderam menos de 100 unidades no acumulado desse ano. Não estamos falando apenas de modelos de luxo, que tradicionalmente têm vendas menores devido ao valor, mas de veículos como Ford Edge e Jac Motors J5 com 53 unidades, Honda Accord com 73 e Volkwagen Passat, com 94 unidades.

Afinal, o que deu errado para os carros que literalmente não emplacaram? Segundo David Wong, diretor da consultoria AT Kearney, a concorrência pode ser um dos fatores, já que o Brasil tem um dos maiores portfólios do mundo. “O consumidor tem uma infinidade de modelos. Então, qualquer ponto negativo em um veículo já é motivo para ir em busca de outro”, avalia. Também por isso, as quatro grandes (Volkswagen, Fiat, General Motors e Ford) que tinham 70% do mercado nacional nos anos 90, hoje respondem por 45% do volume.

Com tantas opções no mercado, e tão pouca gente querendo comprar carros, há dezenas de modelos que não alcançaram as expectativas das montadoras. Um dos casos é a picape Peugeot Hoogar. Lançada em 2010 para concorrer no segmento da Fiat Strada e Volkswagen Saveiro, acabou encalhando nas concessionárias. A expectativa da marca era vender 1.200 unidades por mês, mas o carro nunca alcançou a meta – seu melhor mês foi agosto de 2011, quando vendeu 600 unidades.

O que faz um carro encalhar?

É uma pergunta que feita por montadoras de todos os tamanhos, e para carros em todas as faixas de preço. Um exemplo é o compacto Toyota Etios, lançado no fim de 2012 e que demorou a emplacar. No início, o impacto foi tão negativo que depois de alguns meses de vendas decepcionantes a montadora reduziu o preço do modelo e repaginou o veículo antes da hora. “O Etios foi lançado ao mesmo tempo do Hyundai HB20, que tem um design mais agradável, e acabou sendo prejudicado”, diz Wong. Depois da mudança, os resultados apareceram e hoje o veículo é o 16º mais vendido do país.

Mas não é apenas a questão estética que conta na hora de vender carros. Cada vez mais globais, as montadoras tendem a comercializar os mesmos veículos em várias partes do mundo – o que pode comprometer o desempenho das vendas em alguns casos. “Em busca de contratos maiores com fornecedores e preços mais competitivos, algumas marcas esquecem da exclusividade de cada mercado e acabam transformando carros em commodities”, diz Milad Neto, gerente de desenvolvimento de negócios da consultoria Jato Dynimics.

O modelo Up!, da Volkswagen, pode ser um desses casos. Foi adaptado da versão europeia e ganhou apenas 10 centímetros a mais na parte traseira. Mesmo assim, apesar de ser vendido para transportar cinco ocupantes, faz o trabalho com muita dificuldade. Por um preço maior do que os similares, o veículo acabou desapontando a montadora alemã. “Um dos erros mais comuns é a precificação. O preço é de um carro para família, mas só leva dois ocupantes confortavelmente”, diz Wong.

Mas afinal, por que as montadoras mantêm a produção de modelos que não apresentam um bom desempenho? A resposta pode passar pelo custo de desenvolvimento, que dependendo do projeto pode chegar a 1 bilhão de dólares. Além disso, é importante para a marca estar presente em diversos segmentos do mercado.

Uma outra explicação passa pelo aproveitamento de plataformas. Na maioria das vezes uma mesma área da fábrica faz mais de um modelo – e o custo do segundo carro acaba sendo irrisório. Caso do renomado SUV Renault Duster que ganhou a companhia da picape grande Oroch, que chegou para concorrer com a Fiat Toro e foi rapidamente desbancada. “Não há uma receita mágica para o sucesso. Todas as empresas querem vender, mas em alguns segmentos é especialmente difícil de concorrer”, diz Milad.

Segmentos de até 70.000 reais, que concentram 75% das vendas, são os mais disputados. “Lançar um carro de entrada é bater de frente com modelos consagrados, como Fiat Palio e Chevrolet Ônix, por exemplo”, diz Milad. Por isso, segundo ele, há de se levar em conta que o volume depende do nicho. Picapes venderão menos que carros de entrada, por exemplo. “Nem sempre podemos considerar vendas baixas um fracasso, depende do segmento do veículo”, avalia.

Além disso, o modelo nem sempre é o patinho feio da história. O consumidor também avalia o conteúdo tecnológico, a rede de concessionárias e o serviço de pós-venda de cada marca. A equação vai muito além do design e preço atrativo – e, claro, do tamanho da crise.

(Michele Loureiro)

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