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A dona do gás

Ildo Sauer, diretor da área de gás da Petrobras, explica os planos da estatal para desenvolver esse mercado e alerta os concorrentes de que a empresa não abrirá seus gasodutos às outras empresas

EXAME.com (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 03h40.

O diretor da área de gás da Petrobras, Ildo Sauer, afirma que a estatal alcançará a liderança no setor de gás. Dois fatores a favorecem nesta corrida. O primeiro é a ampla participação que possui nas distribuidoras estaduais. O segundo é a rede de gasodutos que construirá nos próximos três anos, da qual também deterá a maior parcela. Os concorrentes também não terão vida fácil na disputa com a companhia. Sauer avisa que a Petrobras não liberará o acesso de seus gasodutos a outras empresas. "Não vamos fazer investimentos para depois abrir espaço para nossos concorrentes rapinarem nosso mercado", diz.

EXAME - O que mudou na área de gás na nova gestão da Petrobras?
Ildo Sauer - Em 2003, buscamos sanar os prejuízos da empresa nessa área. Contamos com a ajuda de auditorias e consultorias econômicas e jurídicas. Em abril do ano passado, apresentamos um diagnóstico para o Conselho de Administração da empresa. Em janeiro desse ano, decidimos renegociar os contratos com nossos sócios nas termelétricas Eletrobolt e Macaé Merchant, no Rio de Janeiro, e na Termoceará, no Ceará. Esses contratos geravam prejuízos anuais de 300 milhões de dólares para a Petrobrás. O primeiro foi o da Eletrobolt, que pertencia à Enron e que nos dava 800 milhões de dólares de prejuízo. Compramos a empresa a partir de negociações com os credores da Enron. Agora, estamos em conversas com a El Paso e esperamos chegar a uma situação satisfatória. A dificuldade de obter um acordo rentável com a Bolívia também contribui para os prejuízos.

EXAME - Há possibilidade de comprar essas empresas?
Sauer - Nenhum modelo está descartado. O objetivo principal é reduzir a exposição financeira da Petrobras. A diretoria jurídica afirmou que esses contratos devia ser renegociados porque eram lesivos à companhia. Se isso não fosse feito, a Petrobras poderia ser acusada de estar prevaricando. Não havia escolha.

EXAME - Por que a Petrobras decidiu aumentar sua participação na Termoaçu, no Rio Grande do Norte?
Sauer - A Termoaçu foi uma oportunidade de negócio interessante. A Petrobras detinha 30% da usina, cujos principais acionistas eram a espanhola Iberdrola e a Previ. A usina estava parada e era um projeto que nos interessava por gerar vapor para produção de petróleo. A negociação levou um ano. A rentabilidade do projeto foi preservada. A Guaraniana ia abandonar o projeto. Depois de um ano de negociação, chegamos a um acordo. Vamos ficar com 70% da empresa. O projeto é adequado para a Petrobras. Vamos retomar as obras e as turbinas já estavam compradas.

EXAME - Por que a estratégia de entrar na área de energia?
Sauer - Na verdade, o que nós estamos fazendo agora é racionalizar os projetos já em andamento na gestão anterior, que estavam gerando prejuízos para a empresa. Nós não temos a intenção de entrar em nenhum outro projeto de termelétrica. O único projeto que poderá ser tocado, mais para a frente, é o de uma térmica em Manaus.

EXAME - E quais as perspectivas para o mercado de gás?
Sauer - Nós montamos uma nova estratégia para a área, levando em conta as novas reservas de gás que foram descobertas. Entendemos que o desenvolvimento da área de gás será muito importante para a economia brasileira. Temos um bom potencial de exploração nas bacias de Campos, Santos, Bolívia, Urucu e Nordeste. Assim que o mercado conseguir absorver essa produção, teremos condições de vender 100 milhões de metros cúbicos por dia até 2010. Hoje, estamos colocando 36 milhões. A Petrobras não atua sozinha. É a líder, mas depende de parcerias com distribuidoras e consumidores. É preciso também desenvolver uma logística para que o gás possa ser distribuído e chegar ao consumo final.

EXAME - A Petrobras não vai acabar competindo com ela mesma, já que produzirá um combustível para concorrer com o petróleo que ela própria produz?
Sauer - De forma alguma. Com essa produção de 100 milhões de metros cúbicos, economizaremos 500 000 barris de petróleo por dia, que poderão ser exportados. Estamos fazendo uma mudança de posição. O gás vai substituir o petróleo. O gás também tem a vantagem de gerar investimentos em toda a sua cadeia, que vai desde a produção, transporte, distribuição e também nas termelétricas, para co-gerar eletricidade. Além disso, o gás tem um custo mais barato, o que vai beneficiar toda a sociedade.

EXAME - Como está o desenvolvimento de gás veicular?
Sauer - Estamos desenvolvendo projetos não apenas para automóveis leves, mas também para transporte público, o que vai melhorar a qualidade do ar das cidades. Mantemos contato com prefeituras e com as montadoras. Não é um processo rápido, mas queremos estimular este mercado.

EXAME - Qual será a estratégia da Petrobras no mercado de gás daqui para frente?
Sauer - Nós temos o gás e queremos aumentar nossas vendas para as distribuidoras. Por isso, temos que desenvolver uma rede de gasodutos para que o gás chegue a todos os pontos de consumo. Mas não adianta levar o gás, se não houver a participação das distribuidoras. Por isso estivemos na Comgás, em São Paulo, para realizar um trabalho cooperativo. Nós queremos a cooperação de todos esses atores e a Petrobras fará o papel de líder para desenvolver o setor.

EXAME - Como serão essas parcerias?
Sauer - A Petrobras não pode desenvolver sozinha todas as atividades. Temos participações importantes na maioria das distribuidoras e isto é uma forma de coordenar o processo. A produção e o transporte será feito pela Petrobras. Na outra ponta, estarão as distribuidoras. Como participamos da maioria das distribuidoras, a empresa será o maior ator da cadeia do gás. Só não participamos da Comgás, CEG e Cigás. Durante a privatização, houve uma decisão ideológica de impedir a Petrobras de participar da companhia paulista. Era fundamental a estatal entrar no mercado de São Paulo, porque ele ainda não está maduro.

EXAME - Por que é importante a participação nessas distribuidoras?
Sauer -Para poder participar da gestão e da estratégia dessas empresas. É uma indústria nova, que precisa de qualificação técnica e de gestão. Nenhum mercado regulado tem um retorno grande, mas tem um retorno normal e regulado. Sem a participação da Petrobras nas distribuidoras, esse mercado não iria se desenvolver, porque é através das distribuidoras que o gás chega ao consumidor. E elas precisam da Petrobras para aumentar seus investimentos e viabilizar este mercado. Não é uma ação ideológica da Petrobras.

EXAME - No caso da CEG e da Comgás, isso é necessário já que elas vêm investindo e crescendo no mercado?
Sauer - Elas vêm desenvolvendo bem seu mercado. Estão investindo no setor. Mas não há porque a Petrobras não participar também dessas empresas.

EXAME - E o caso da Gasmig?
Sauer - Por falta de investimentos, havia uma demora no desenvolvimento do mercado de gás em Minas Gerais. Minas estava fora desse nicho. Agora, todo o capital que a Petrobras colocar na Gasmig será em novos investimentos em distribuição. O mercado de mineiro é muito promissor e a Petrobras vai levar gás até lá.

EXAME - Qual será o posicionamento da Petrobras em relação aos concorrentes, como El Paso e BG, na questão do acesso dessas empresas aos gasodutos da estatal?
Sauer - Nós estamos investindo 3 bilhões de dólares em gasodutos para a rede básica de transporte de gás natural. É um projeto que vai demorar cerca de três anos para ser concluído. Vamos levar gás para todo o país. Vamos levar gás para onde não havia gás. Vamos levar gás do Sudeste para o Nordeste. E vamos fazer também um gasoduto na Amazônia. Agora, ninguém é maluco de construir gasodutos e investir na infra-estrutura para depois o concorrente entrar rapinando o seu gás. É a mesma coisa que você construir um hotel prevendo uma determinada ocupação. No meio do caminho, sua ocupação não está completa e entra seu concorrente querendo ocupar os apartamentos vazios. Isso é um logro. A Petrobras está assumindo todo o risco de construir seus gasodutos e, portanto, não terá sentido ela ceder espaço para os concorrentes destruírem a rentabilidade de seus negócios.

EXAME - Então os concorrentes não terão acesso aos gasodutos?
Sauer - Depois que o mercado estiver maduro, podemos discutir isso. Nós estamos correndo o risco do investimento porque apostamos no crescimento do mercado.

EXAME - Qual a saída para os concorrentes?
Sauer - Eles podem vender o gás para a Petrobras. Ou então exportar. A Petrobras está tirando dinheiro da exploração e produção para arriscar-se no mercado de gás. Não seria justo, depois de tudo isso, ter que alugar seu espaço para seus concorrentes.

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