Mundo

Rio+20 deverá ter foco em economia verde inclusiva

Para ter impacto comparável à ECO-92, conferência precisará integrar as dimensões ambiental, econômica e social, segundo secretário-executivo da comissão brasileira

A RIO+20 poderá alcançar um impacto planetário de magnitude semelhante ao da ECO-92 (Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr)

A RIO+20 poderá alcançar um impacto planetário de magnitude semelhante ao da ECO-92 (Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr)

DR

Da Redação

Publicado em 13 de março de 2012 às 13h52.

São Paulo – A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), que será realizada no Brasil em junho, não terá o caráter legislativo da ECO-92, cujo legado transformou para sempre a perspectiva mundial sobre o tema do meio ambiente.

No entanto, a Rio+20 poderá alcançar um impacto planetário de magnitude semelhante ao da ECO-92, contanto que consiga superar o desafio de integrar de forma equânime os três pilares do desenvolvimento sustentável: as dimensões ambiental, econômica e social.

A defesa dessa integração é o cerne da posição brasileira na conferência, de acordo com o embaixador Luiz Alberto Figueiredo Machado, subsecretário-geral de Meio Ambiente, Energia e Ciência e Tecnologia do Ministério das Relações Exteriores (MRE), que participou nesta terça-feira (06/03) do BIOTA-BIOEN-Climate Change Joint Workshop: Science & policy for a greener economy in the context of Rio+20. Machado é o secretário-executivo para a comissão brasileira da Rio+20.

Planejado para que a comunidade científica possa discutir os temas da Rio+20, o evento, que terá continuidade nesta quarta-feira (07/03), foi realizado conjuntamente pelo Programa BIOTA-FAPESP, pelo Programa FAPESP de Pesquisa em Bioenergia (BIOEN) e pelo Programa FAPESP de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG).

“A Rio+20 é uma conferência sobre desenvolvimento sustentável e não apenas um debate sobre meio ambiente. A intenção da presidência da conferência é que as dimensões ambiental, social e econômica tenham o mesmo peso no debate. O governo brasileiro, por sua vez, entende que, se os desafios do século 21 não forem vistos de maneira integrada, jamais conseguiremos atingir níveis de sustentabilidade”, disse Machado.

De acordo com o embaixador, o mundo atravessa uma época de crise internacional e os atuais modelos de desenvolvimento demonstram uma erosão em sua capacidade de dar respostas aos novos desafios.


“Os modelos atuais produzem crises em todos os pilares do desenvolvimento sustentável: a crise climática, a perda acelerada da biodiversidade, a degradação social e a crise energética demonstram isso. Estamos fazendo algo errado”, disse.

Na época da ECO-92, segundo Machado, os países desenvolvidos acreditavam que haviam resolvido suas questões econômicas e sociais e dirigiam o foco das discussões para os temas exclusivamente ambientais. Enquanto isso, os países em desenvolvimento tinham o foco no desenvolvimento econômico apoiado no contexto da sustentabilidade.

“Vinte anos depois, o mundo virou de cabeça para baixo: os países desenvolvidos estão lidando com uma profunda crise econômica e social, enquanto os países como o Brasil são líderes na área em tecnologias verdes, em investimentos em energia limpa e avançaram na inclusão social”, disse.

Nesse novo contexto, segundo Machado, a Rio+20 não tem mais uma agenda que olha o econômico, o ambiental e o social separadamente. Por isso, a comissão brasileira da conferência tem utilizado o termo “economia verde inclusiva”, a fim de remeter ao trinômio “crescimento”, “inclusão social” e “proteção da natureza”.

“A decisão política do século 21 é a de integrar essas três dimensões. Esse é um desafio para todos os países e para a Rio+20. Se conseguirmos essa integração, finalmente poderemos, depois de duas décadas, realizar as promessas da ECO-92”, afirmou Machado.

Na abertura do evento, o presidente da FAPESP, Celso Lafer, destacou o protagonismo do Brasil e a importância central da ciência no contexto da Rio+20. Segundo ele, o Brasil é uma grande potência no tema do meio ambiente e nenhum dos grandes problemas dessa agenda pode ser encaminhado sem ativa participação brasileira.


“A liderança brasileira tem legitimidade internacional. É preciso ressaltar também a relevância do conhecimento no processo da Rio+20. A conferência envolve problemas de natureza complexa para os quais uma adensada pesquisa fornece indicações imprescindíveis”, disse Lafer.

“Esse workshop proposto pela FAPESP, com participação dos pesquisadores que vêm alargando o horizonte do conhecimento sobre mudanças climáticas, bioenergia e biodiversidade, contribuirá para a preparação das negociações, integrando nosso discurso”, disse.

Questão energética

Durante o evento, a palestra “A produção de bioenergia no contexto da Rio+20” foi apresentada pelo físico José Goldemberg, professor do Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo (USP) que era secretário do Meio Ambiente do Brasil durante a ECO-92.

De acordo com Goldemberg, o documento preparado pelo secretariado da ONU com contribuições dos países participantes da Rio+20, incluindo o Brasil, contém 128 parágrafos, sendo que dois deles são dedicados ao problema da energia. Um dos principais objetivos estabelecidos pelo documento é o acesso básico universal a um mínimo de energia moderna, até 2030, com o dobro da eficiência energética atual.

“O significado dessas considerações é muito profundo, se observarmos os dados de que dispomos. Atualmente, mais de 80% da energia consumida no mundo provém de fontes fósseis: petróleo (34,6%), gás (22,1%) e carvão (28,4%). As energias renováveis correspondem a 12,9% do total”, afirmou Goldemberg.


A extrema dependência do petróleo impõe uma limitação física insustentável: o esgotamento das reservas. Por maiores que sejam as reservas descobertas no pré-sal brasileiro, segundo Goldemberg, elas são uma contribuição modesta para as fontes de energia de petróleo do mundo.

“Além da limitação física, o petróleo tem um grave problema de acesso, já que as fontes estão distribuídas de forma errática no mundo. Em seguida, temos o problema mais grave que é o impacto ambiental das emissões de gases de efeito estufa, que contribuem para o aquecimento global. Os combustíveis fósseis são responsáveis por boa parte da prosperidade e conforto que a humanidade conseguiu, mas lamentavelmente essa situação não pode durar”, disse.

Parte significativa do consumo de combustíveis fósseis, segundo Goldemberg, é proveniente do transporte individual. E a tendência é que o número de carros aumente expressivamente nos próximos anos, alavancando o consumo de gasolina. Entre 1980 e 2010, a demanda mundial por gasolina subiu de 0,8 trilhão de litros por ano para quase 1,3 trilhão de litros.

São 30 milhões de barris diários, correspondendo a um terço do consumo mundial de petróleo. Essa situação não vai melhorar. Nos Estados Unidos há quase 800 automóveis por mil pessoas. Outros países industrializados têm 500 automóveis por mil habitantes – que é aproximadamente a escala na cidade de São Paulo. Os países menos desenvolvidos estão seguindo essa trajetória. A previsão é que em 2050, em vez dos atuais 750 milhões de automóveis, tenhamos 2,25 bilhões”, disse.

Para reduzir a magnitude do problema, segundo Goldemberg, é preciso que o mundo busque um modelo semelhante ao brasileiro: expandir a matriz hidrelétrica onde for possível e investir em outros componentes renováveis. Um dos caminhos do desenvolvimento sustentável na área de energia, de acordo com ele, é a substituição da gasolina por um combustível produzido a partir de biomassa.


“O único combustível que vem fazendo isso de maneira eficiente e em escala comercial até agora é o etanol de cana-de-açúcar. Se conseguirmos desenvolver o etanol de segunda geração, poderemos aumentar a produção sem aumentar a área plantada. Para isso é preciso investir em pesquisa. No contexto da Rio+20, acredito que a contribuição do etanol de cana-de-açúcar originário de países tropicais deverá ser uma das cartas importantes na discussão”, disse.

Clima, bioenergia e biodiversidade

Durante o evento, o diretor científico da FAPESP, Carlos Henrique de Brito Cruz, fez uma apresentação sobre os programas BIOTA-FAPESP, BIOEN e PFPMCG. De acordo com ele, o BIOTA tem como objetivo não apenas caracterizar a biodiversidade do Estado de São Paulo, como definir mecanismos para sua conservação e uso sustentável.

“O BIOTA-FAPESP já teve 915 projetos de pesquisa e bolsas aprovados. Foram cerca de R$ 100 milhões investidos em 12 anos. Em 2011, o programa cresceu muito, com renovado interesse da comunidade científica paulista, e o valor concedido apenas naquele ano foi de R$ 22 milhões. Um dos impactos importantes do programa, além de fazer ciência de boa qualidade, foi que ele gerou vários decretos, leis e resoluções sobre conservação da biodiversidade”, afirmou.

Na área de bioenergia, segundo ele, a FAPESP teve uma primeira iniciativa em 1999, com a criação do projeto Sucest, que avaliou o transcriptoma da cana-de-açúcar. O BIOEN foi criado em 2008.

“O programa BIOEN envolve 314 cientistas, sendo 229 de São Paulo, 33 de outros estados e 52 de outros países. Os recursos investidos já se aproximam de R$ 100 milhões, em 55 projetos. O programa tem inúmeras colaborações com empresas, que cofinanciam pesquisas”, disse Brito Cruz.

O PFPMCG também agrega colaborações internacionais com instituições como o Natural Environment Research Council (Nerc), do Reino Unido, um dos organismos que compõem os Research Councils UK – que mantêm acordo com a FAPESP desde setembro de 2009 –, Agence Nationale de La Recherche (ANR), da França, e Interamerican Institute for Global Change Research (IAI), organização intergovernamental apoiada por nove países nas Américas.

Acompanhe tudo sobre:cidades-brasileirasMeio ambienteMetrópoles globaisONURio de JaneiroRio+20

Mais de Mundo

Donald Trump anuncia Elon Musk para departamento de eficiência

Trump nomeia apresentador da Fox News como secretário de defesa

Milei conversa com Trump pela 1ª vez após eleição nos EUA

Juiz de Nova York adia em 1 semana decisão sobre anulação da condenação de Trump