Quem é o ginecologista e a ex-escrava sexual que ganharam o Nobel da Paz
Vencedores do Nobel da Paz de 2018 são reconhecidos pelo trabalho contra o abuso e a violência sexual
AFP
Publicado em 5 de outubro de 2018 às 12h38.
São Paulo - Denis Mukwege e Nadia Murad são os vencedores do Prêmio Nobel da Paz de 2018. Ambos são reconhecidos pelo trabalho contra o uso da violência sexual como arma de guerras e conflitos armados. Mukwege é médico ginecologista e atua na defesa de vítimas de abuso sexual. Já Murad é reconhecida por ter sobrevivido aos terrores do grupo Estado Islâmico (EI) a seu povo, os yazidis do Iraque. Veja os dois perfis abaixo.
Quem é Nadia Murad
Com apenas 25 anos, Nadia Murad se tornou um ícone entre os yazidis do Iraque, uma comunidade ameaçada.
A jovem iraquiana poderia ter desfrutado de uma vida tranquila em sua cidade natal, Kosho, perto do reduto yazidi de Sinjar, uma zona montanhosa entre Iraque e Síria.
Mas o rápido avanço do EI em 2014 mudou seu destino.
Em agosto de 2014 ela foi sequestrada e levada à força para Mossul, um bastião do EI reconquistado há mais de um ano. Este foi o início de um calvário de muitos meses: torturada, disse ter sido vítima de múltiplos estupros coletivos antes de ser vendida diversas vezes como escrava sexual.
Nadia Murad - assim como sua amiga Lamiya Aji Bashar, com a qual venceu o Prêmio Sakharov do Parlamento Europeu em 2016 - repete sem cessar que mais de 3.000 yazidis continuam desaparecidas e que provavelmente permanecem em cativeiro.
Torturas e estupros
Os extremistas queriam "roubar nossa honra, mas perderam a honra deles", disse aos eurodeputados Nadia Murad, que foi nomeada embaixadora da Boa Vontade da ONU e luta pela proteção das vítimas do tráfico de pessoas.
Além de sofrer torturas e estupros, Murad teve de renunciar a sua fé yazidi, uma religião ancestral desprezada pelo EI, praticada por meio milhão de pessoas no Curdistão iraquiano.
"A primeira coisa que fizeram foi nos forçar a uma conversão ao Islã. Depois fizeram o que queriam", afirmou Nadia à AFP em 2016.
Assim como milhares de outras yazidis, ela foi obrigada a "casar" com um extremista que a agredia, como relatou em um comovente discurso no Conselho de Segurança da ONU em Nova York.
"Incapaz de suportar tantos estupros", ela decidiu fugir. Graças à ajuda de uma família muçulmana de Mossul, Nadia obteve documentos de identidade que permitiram sua viagem até o Curdistão iraquiano.
Após a fuga, a jovem - que disse ter perdido seis irmãos e a mãe no conflito - viveu em um campo de refugiados no Curdistão, onde entrou em contato com uma organização de ajuda aos yazidis. Esta ajudou em seu reencontro com a irmã na Alemanha.
Neste país, onde mora, ela se tornou uma respeitada porta-voz de seu povo, que antes de 2014 tinha 550.000 membros no Iraque. Hoje, quase 100.000 abandonaram o país, e outros estão no Curdistão.
Murad, que lidera o combate de seu povo, de acordo com suas palavras, conseguiu que as perseguições cometidas em 2014 fossem reconhecidas como genocídio. O Conselho de Segurança da ONU se comprometeu a ajudar o Iraque a coletar provas sobre os crimes do EI.
Seu "combate" também reservou algumas boas surpresas. No dia 20 de agosto, a jovem anunciou no Twitter que se casará com outro ativista da causa yazidi, Abid Shamdeen.
"O combate a favor de nosso povo nos uniu e seguiremos neste caminho juntos", escreveu.
Quem é Denis Mukwege
O médico congolês Denis Mukwege recebeu a notícia de sua vitória do Nobel quando estava na sala de operações de seu hospital, durante uma cirurgia. Reconhecido por seu trabalho com vítimas de abusos sexuais, Mukwege já tratou 50.000 vítimas de estupros.
Em um vídeo publicado na página doFacebookdo hospital que ele criou em 1999 na região leste da República Democrática do Congo, várias pessoas cumprimentam Mukwege quando ele sai do local.
“Estava na sala de operações (…) de repente entraram algumas pessoas e me deram a notícia”, disse Mukwege ao jornal norueguês VG.
“O doutor Mukwege estava no meio de uma operação quando ficou sabendo. Mas já saiu e está muito feliz. As pessoas comemoram e expressam sua alegria”, afirmou a pneumologista sueca Ellinor Ädelroth, que estava no hospital de Panzi, à agência sueca TT.
Denis Mukwege, ginecologista de 63 anos, e Nadia Murad, de 25, ex-escrava sexual do grupo Estado Islâmico (EI), venceram o Nobel da Paz “por seus esforços para acabar com o uso da violência sexual como arma de guerra”.
“Denis Mukwege dedicou toda sua vida à defensa das vítimas de violência sexual cometida em tempos de guerra”, anunciou o Comitê Nobel.
Em 1999 o doutor Mukwege criou o hospital de Panzi. Ele o concebeu para permitir o parto das mulheres em excelentes condições. Em pouco tempo, o local se tornou uma clínica de tratamento dos estupros sofridos durante a segunda guerra do Congo (1998-2003), quando foram registrados muitos casos de violência contra as mulheres.