Presidente na TV, comediante quer ser presidente da Ucrânia na vida real
Humorista está próximo de se tornar o próximo presidente do país, mas a questão é se há plano de governo por trás das piadas
Gabriela Ruic
Publicado em 1 de abril de 2019 às 12h17.
São Paulo – Volodymyr Zelensky não é um desconhecido dos ucranianos. No ar na televisão do desde 2015 como Vasiliy Petrovich Goloborodko, um professor de história que vira presidente na série “Servant of the People” (‘Servo do Povo’, em português), Zelensky está trazendo o enredo dessa comédia para a vida real. E está dando certo.
No último domingo, 31 de março, o comediante deu mais um passo nessa direção ao conseguir ir para o segundo turno das eleições presidenciais da Ucrânia contra o atua mandatário, Petro Poroshenko. Zelensky está com 30,45% dos votos, enquanto seu rival recebeu o apoio de 16,22% dos eleitores. Mais de 30 nomes constavam na cédula dessa corrida, o da ex-primeira-ministra Yulia Timoshenko, inclusive.
Sem experiência na política, Zelensky, de 41 anos, surpreendeu o país ao anunciar que se candidataria à presidência. Seu bom desempenho nas urnas neste último domingo, no entanto, veio para confirmar a tendência global de insatisfação dos eleitores com a classe política tradicional, sua predileção por nomes novos, que seguram a bandeira anticorrupção e se comunicam quase que exclusivamente por meio das redes sociais.
Seus planos de governo, contudo, são obscuros: o comediante tende a não falar sobre o que pretende fazer, se eleito, tampouco deu entrevistas ou participou de debates com seus oponentes. Sem aprofundar nas questões, diz que deseja “ampliar” a integração da Ucrânia com o Ocidente e “negociar” com a Rússia a pacificação na região leste, que vive um conflito armado com forças separatistas pró-Rússia e que já matou 13 mil pessoas.
Os críticos de Zelensky o acusam de ser um fantoche de Igor Kolomoiski, oligarca que é dono da rede de televisão 1 + 1, que deixou claro o apoio ao comediante e está veiculando episódios de sua série. Para Leonid Bershidsky, da Bloomberg, esse fator pode se mostrar chave para ilustrar como, afinal, uma presidência sob o comando do comediante será.
Se a ligação entre o comediante e o oligarca for real, escreveu Bershidsky, a Ucrânia viverá uma história repetida, na qual “reformas liberais e anticorrupção esconderão a bonança que amigos e parceiros do chefe de estado irão viver”. “O problema é que Zelensky, muito menos experiente na política de cão da Ucrânia, dificilmente se consolidará efetivamente como incumbente”, analisou.
Previsões e análises à parte, fato é que o comediante se consolidou como o favorito na corrida presidencial e chega ao segundo turno, que será realizado em 21 de abril, com força. Ao que tudo indica, Zelensky conseguiu colar em sua candidatura a imagem de outsider e ganhou um eleitorado que diz não estar votando nesse ou aquele candidato, mas contra o status quo, explicou o The Atlantic Council.
Se eleito, o ator não terá uma vida fácil e precisará resolver problemas urgentes que estão afetando a Ucrânia. Além da guerra, o país há anos tenta se aproximar da União Europeia de olho em acordos que possam trazer fôlego para a sua economia, cujos setores de energia e indústria são controlados com mãos de ferro por oligarcas. E é aí que a brincadeira termina.