Moradores de rua na Praça da Sé, em São Paulo (Valter Campanato/AGÊNCIA BRASIL/Agência Brasil)
Da Redação
Publicado em 31 de outubro de 2010 às 23h36.
Rio de Janeiro - Sem endereço fixo ou documentos, a maior parte dos moradores de rua ficou longe da eleição deste domingo. Em baixo de marquises ou coberturas improvisadas, eles não foram procurados por militantes em busca de voto, já que maioria sequer tem título eleitoral.
Na Avenida Rodrigues Alves, abrigados sob um telhado de um antigo armazém do cais do porto, vivem cinco sem-teto. Por volta das 16h, uma hora antes de se encerrar as eleições pelo horário de Brasília, eles se reuniam em volta de uma fogueira, onde era preparada, em uma lata grande de azeite, um prato a base de peixe e batatas.
Gilberto Gonçalves Franco, 46 anos, há sete morando nas ruas, era o único do grupo que conseguiu votar nestas eleições. Ele votou no primeiro turno, mas hoje não teve dinheiro para a passagem até o município de Japeri, onde fica sua seção eleitoral. “O que a gente precisa é de um lar. Nem que seja um prédio desativado que o governo nos dê”, pediu Gilberto, que trabalha em um ferro-velho e ganha R$ 20 por dia: “Com R$ 14, a gente faz a janta e o que eu posso fazer com os outros R$ 6?”.
A janta do dia era preparada pela companheira dele, Lucia Helena Santana da Conceição, 36 anos, que mora na rua há apenas dois meses, desde que abandonou a casa de sua família, no Morro da Providência. Ela contou que já teve trabalho de carteira assinada, mas atualmente só consegue trabalhos temporários. “Vou começar agora no barracão [da Escola de Samba] Alegria da Zona Sul. Sou aderecista. De fevereiro em diante, faço biscate, lavo uma janela, faço uma faxina”, disse Lucia Helena, que considera horrível viver na rua e sonha em ganhar uma casa própria: “Eles têm que olhar para quem está na rua. Sem endereço fica difícil achar trabalho”.
O integrante mais jovem do grupo é André de Souza Viana, 21 anos, morador de rua desde os 14, quando saiu da Região dos Lagos para fugir dos maus-tratos do padrasto. Ele veio tentar a sorte no Rio e atualmente trabalha catando papel para reciclar. Perguntado sobre o que gostaria que o próximo presidente fizesse, respondeu: “Nos tirar da rua. Levar para algum abrigo. A gente tem que sair desta vida, trabalhar de carteira assinada”.
O mais velho do grupo, carinhosamente chamado de “Vô”, é Paulo César Muniz de Aragão, 63 anos. Assim como os demais, ele não conseguiu votar, pois não estava com a documentação regularizada. “Tinha que pagar uma multa, porque não votei nas outras eleições, mas não tive dinheiro. Gostaria de ter votado. Me sinto frustrado, porque eu sempre votei”, lamentou Paulo César. Perguntado há quanto tempo ele estava morando nas ruas, sem saber precisar, pensou e respondeu: “Há quatro eleições”.
O número exato de moradores de rua no país não é conhecido, mas informações do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), com base na Pesquisa Nacional sobre População de Rua, indicam cerca de 45 mil pessoas, incluindo dados levantados em censos paralelos feitos por prefeituras.