Manifestantes celebram legalização da união homoafetiva nas ruas de Atenas, na Grécia (Menelaos Myrillas/Getty Images)
Agência de notícias
Publicado em 15 de fevereiro de 2024 às 19h04.
Após dois dias de discussão e apesar da forte oposição da Igreja Ortodoxa, a Grécia aprovou, nesta quinta-feira, com 176 votos a favor e 76 contra, a legalização do casamento homoafetivo, uma reforma social significativa realizada pelo governo conservador.
Com a decisão, o país do Mediterrâneo se torna o 37º do mundo, 17º da União Europeia (UE) e o primeiro de religião cristã ortodoxa a permitir o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Apesar da divisão dentro do seu partido Nova Democracia (ND), com uma ala contrária ao projeto, o primeiro-ministro Kyriakos Mitsotakis conquistou o apoio de diversos partidos de oposição de esquerda para a aprovação da medida.
No discurso de abertura da votação, que teve início na terça-feira, Mitsotakis, que pessoalmente liderou o projeto de lei, instou os parlamentares a "abolir, corajosamente, uma grave desigualdade" na democracia grega que havia tornado as famílias do mesmo sexo "invisíveis". A reforma "irá melhorar significativamente a vida de muitos dos nossos concidadãos, sem tirar nada das vidas de muitos", acrescentou o premier.
Além de reconhecer os casamentos entre pessoas do mesmo sexo, a legislação abre caminho para a adoção e confere os mesmos direitos a ambos os pais do mesmo sexo como tutores legais da criança — até então, tais direitos eram aplicados apenas ao progenitor biológico. Contudo, o projeto de lei não oferece aos casais do mesmo sexo acesso à reprodução assistida ou à opção de gravidez de aluguel. Também não confere às pessoas trans direitos como pais.
A votação foi aclamada como histórica pelas associações LGBTQIAP+, que afirmam que as famílias do mesmo sexo enfrentam um labirinto de desafios administrativos que resultam em discriminação sob a atual legislação familiar.
Maria Gavouneli, presidente da Comissão Nacional Grega para os Direitos Humanos, um organismo público independente, classificou a medida como "muito atrasada". E Stella Belia, fundadora da Rainbow Families, uma organização que apoia famílias do mesmo sexo, classificou a legislação como "uma grande vitória pela qual lutamos há anos".
Uma das primeiras a beneficiar da nova lei seria Lio Emmanouilidou, uma professora de 43 anos, que planeja se casar com a sua parceira de longa data em Salônica, no dia 8 de março, Dia Internacional da Mulher. Ela disse ao New York Times que está entusiasmada com o casamento e saudou o projeto como "um passo na direção certa e uma grande vitória para a comunidade".
Emmanouilidou também disse que se sentia nervosa com a oposição às medidas, mas que, na sua experiência, a maioria dos gregos aceita casais do mesmo sexo.
— A sociedade está muito mais preparada para isso do que pensamos — disse ela.
No entanto, num país que continua a ser um dos mais conservadores da Europa, onde o modelo familiar tradicional ainda é predominante e a influente Igreja Ortodoxa vê a homossexualidade como uma aberração, as medidas encontraram alguma resistência acentuada.
O Santo Sínodo, a autoridade máxima da Igreja Ortodoxa grega, argumentou numa carta aos parlamentares este mês que o projeto de lei "põe um fim à paternidade e à maternidade, neutraliza os sexos" e cria um "ambiente de confusão" para as crianças. Os clérigos expressaram esse sentimento em sermões por todo o país nas últimas semanas, e alguns bispos disseram que se recusariam a batizar os filhos de casais do mesmo sexo.
Grupos religiosos também uniram forças com partidos de extrema direita para realizar manifestações em Atenas e outras cidades para se oporem às mudanças. No domingo passado, centenas de pessoas organizaram uma manifestação em frente ao Parlamento, algumas delas segurando faixas que diziam: "Só existe uma família, a tradicional".
As sondagens de opinião realizadas nas últimas semanas retrataram uma sociedade grega dividida sobre estas questões: na maioria dos inquéritos, metade dos entrevistados manifestou apoio ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, mas a maioria também disse que se opunha a permitir que casais do mesmo sexo adotassem crianças.